Por Hildegard Angel no R7, reproduzida em Viomundo –
Foram oito anos de bombardeio intenso,
tiroteio de deboches, ofensas de todo jeito, ridicularia, referências
mordazes, críticas cruéis, calúnias até. E sem o conforto das
contrapartidas. Jamais foi chamada de “a Cara” por ninguém, nem teve a
imprensa internacional a lhe tecer elogios, muito menos admiradores
políticos e partidários fizeram sua defesa. À “companheira” número 1 da
República, muito osso, afagos poucos.
Dirão os de sempre, e as mordomias? As
facilidades? O vidão? E eu rebaterei: E o fim da privacidade? A imprensa
sempre de olho, botando lente de aumento pra encontrar defeito? E as
hostilidades públicas? E as desfeitas? E a maneira desrespeitosa com que
foi constantemente tratada, sem a menor cerimônia, por grande parte da
mídia? Arremedando-a, desfeiteando-a, diminuindo-a? E as frequentes
provas de desconfiança, daqui e dali? E – pior de tudo – os boatos
infundados e maldosos, com o fim exclusivo e único de desagregar o
casal, a família?
Ah, meus queridos, Marisa Letícia Lula
da Silva precisou ter coragem e estômago para suportar esses oito anos
de maledicências e ataques. E ela teve. Começaram criticando-a por estar
sempre ao lado do marido nas solenidades. Como se acompanhar o parceiro
não fosse o papel tradicional da mulher mãe de família em nossa
sociedade.
Depois, implicaram com o silêncio dela, a
“mudez”, a maneira quieta de ser. Na verdade, uma prova mais do que
evidente de sua sabedoria. Falar o quê, quando, todos sabem,
primeira-dama não é cargo, não é emprego, não é profissão?
Ah, mas tudo que “eles” queriam era ver dona Marisa Letícia se atrapalhar com as palavras para, mais uma vez, com aquela crueldade venenosa que lhes é peculiar, compará-la à antecessora, Ruth Cardoso, com seu colar pomposo de doutorados e mestrados.
Ah, mas tudo que “eles” queriam era ver dona Marisa Letícia se atrapalhar com as palavras para, mais uma vez, com aquela crueldade venenosa que lhes é peculiar, compará-la à antecessora, Ruth Cardoso, com seu colar pomposo de doutorados e mestrados.
Agora, me digam, quantas mulheres neste
grande e pujante país podem se vangloriar de ter um doutorado? Assim
como, por outro lado, não são tantas as mulheres no Brasil que conseguem
manter em harmonia uma família discreta e reservada, como tem Marisa
Letícia.
E não são também em grande número
aquelas que contam, durante e depois de tantos anos de casamento, com o
respeito implícito e explícito do marido, as boas ausências sempre
feitas por Luís Inácio Lula da Silva a ela, o carinho frequentemente
manifestado por ele. E isso não é um mérito? Não é um exemplo bom?
Passemos agora às desfeitas ao que, no entanto, eu considero o mérito
mais relevante de nossa ex-primeira-dama: a brasilidade.
Foi um apedrejamento sem trégua, quando
Marisa Letícia, ao lado do marido presidente, decidiu abrir a Granja do
Torto para as festas juninas. A mais singela de nossas festas populares,
aquela com Brasil nas veias, celebrando os santos de nossas
preferências, nossa culinária, os jogos e brincadeiras. Prestigiando o
povo brasileiro no que tem de melhor: a simplicidade sábia dos Jecas
Tatus, a convivência fraterna, o riso solto, a ingenuidade bonita da
vida rural. Fizeram chacota por Lula colar bandeirinhas com dona Marisa,
como se a cumplicidade do casal lhes causasse desconforto.
Imprensa colonizada e tola, metida a
chique. Fazem lembrar “emergentes” metidos a sebo que jamais poderiam
entender a beleza de um pau de sebo “arrodeado” de fitinhas coloridas.
Jornalistas mais criteriosos saberiam que a devoção de Marisa pelo Santo
Antônio, levado pelo presidente em estandarte nas procissões, não é
aprendida, nem inventada. É legitimidade pura. Filha de um Antônio
(Antônio João Casa), de família de agricultores italianos imigrantes,
lombardos lá de Bérgamo, Marisa até os cinco de idade viveu num sítio
com os dez irmãos, onde o avô paterno, Giovanni Casa, devotíssimo,
construiu uma capela de Santo Antônio. Até hoje ela existe, está lá pra
quem quiser conferir, no bairro que leva o nome da família de Marisa,
Bairro dos Casa, onde antes foi o sítio de suas raízes, na periferia de
São Bernardo do Campo. Os Casa, de Marisa Letícia, meus amores, foram
tão imigrantes quanto os Matarazzo e outros tantos, que ajudaram a
construir o Brasil.
Outro traço brasileiro dela, que acho
lindo, é o prestígio às cores nacionais, sempre reverenciadas em suas
roupas no Dia da Pátria. Obras de costureiros nossos, nomes brasileiros,
sem os abstracionismos fashion de quem gosta de copiar a moda
estrangeira. Eram os coletes de crochê, os bordados artesanais, as
rendas nossas de cada dia. Isso sim é ser chique, o resto é conversa
fiada.
No poder, ao lado do marido, ela
claramente se empenhou em fazer bonito nas viagens, nas visitas
oficiais, nas cerimônias protocolares. Qualquer olhar atento percebe
que, a partir do momento em que se vestir bem passou a ser uma
preocupação, Marisa Letícia evoluiu a cada dia, refinou-se, depurou o
gosto, dando um olé geral em sua última aparição como primeira-dama do
Brasil, na cerimônia de sábado passado, no Palácio do Planalto, quando,
desculpem-me as demais, era seguramente a presença feminina mais
elegante. Evoluiu no corte do cabelo, no penteado, na maquiagem e, até,
nos tão criticados reparos estéticos, que a fizeram mais jovem e bonita.
Atire a primeira pedra a mulher que, em
posição de grande visibilidade, não fez uma plástica, não deu uma
puxadinha leve, não aplicou uma injeçãozinha básica de botox, mesmo que
light, ou não recorreu aos cremes noturnos. Ora essa, façam-me o favor!
Cobraram de Marisa Letícia um “trabalho social nacional”, um projeto
amplo nos moldes do Comunidade Solidária de Ruth Cardoso. Pura malícia
de quem queria vê-la cair na armadilha e se enrascar numa das mais
difíceis, delicadas e técnicas esferas de atuação: a área social.
Inteligente, Marisa Letícia dedicou-se
ao que ela sempre melhor soube fazer: ser esteio do marido, ser seu
regaço, seu sossego. Escutá-lo e, se necessário, opinar. Transmitir-lhe
confiança e firmeza. E isso, segundo declarações dadas por ele, ela
sempre fez. Foi quem saiu às ruas em passeata, mobilizando centenas de
mulheres, quando os maridos delas, sindicalistas, estavam na prisão. Foi
quem costurou a primeira bandeira do PT. E, corajosa, arriscou a pele,
franqueando sua casa às reuniões dos metalúrgicos, quando a ditadura
proibiu os sindicatos. Foi companheira, foi amiga e leal ao marido o
tempo todo.
Foi amável e cordial com todos que dela
se aproximaram. Não há um único relato de episódio de arrogância ou
desfeita feita por ela a alguém, como primeira-dama do país. A dona de
casa que cuida do jardim, planta horta, se preocupa com a dieta do
maridão e protege a família formou e forma, com Lula, um verdadeiro
casal. Daqueles que, infelizmente, cada vez mais escasseiam. Este é o
meu reconhecimento ao papel muito bem desempenhado por Marisa Letícia
Lula da Silva nesses oito anos.
Tivesse dito tudo isso antes, eu seria chamada de bajuladora. Esperei-a deixar o poder para lhe fazer a Justiça que merece.
*Hidegard Angel é colunista social no Rio de Janeiro, filha da estilista Zuzu Angel
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