30 de março de 2016
Que tipo de país tem uma médica que se recusa a atender uma criança de um ano e um mês porque a mãe é membro de um partido “inimigo”?
A escalada fascista conseguiu colocar o Brasil de cabeça para baixo em diversos sentidos. Num espectro amplo, se você admite que um meliante como Eduardo Cunha comande o impeachment, você está disposto a aceitar qualquer coisa em nome de sabe-se lá o quê.
Velhinhas de praça com cartazes perguntando “por que não mataram todos em 64”, suas netas mandando Dilma tomar no cu, jovens sendo linchados por estarem numa bicicleta vermelha, endereços de familiares de juízes divulgados na internet — qual o limite?
O limite será ultrapassado dia a dia até surgir o primeiro cadáver, e isso não é garantia de que o ciclo será interrompido.
Ariane Leitão, ex-secretária de Porto Alegre na gestão Tarso Genro, teve o bom sendo se tornar pública uma história repulsiva. A pediatra de seu bebê cancelou uma consulta porque ela é petista.
Enviou-lhe uma mensagem de WhatsApp:
“Bom dia Ariane. Estou neste instante declinando em caráter irrevogável, da condição de Pediatra de Francisco. Tu e teu esposo fazem parte do Partido dos Trabalhadores (ele do Psol) e depois de todos os acontecimentos da semana e culminando com o de ontem, onde houve escárnio e deboche do Lula ao vivo e a cores, para todos verem (representante maior do teu partido), eu estou sem a mínima condição de ser Pediatra do teu filho. Poderia inventar desculpas, te atender de mau humor, mas prefiro a HONESTIDADE (sic) que sempre pautou minha vida particular e pessoal.”
A atitude de Ariane foi oposta à da doutora. Não bateu boca. Não declinou seu nome. Consultou advogados e fez uma denúncia.
“O que mais me deixou chateada e me deixou emocionada quando recebi a mensagem foi que, após cuidar meu filho por um ano, ela declinou do atendimento com tanta facilidade”, disse. “Não é por mim, mas pelo meu filho. Ela não tinha nenhum carinho por ele? Ele gostava tanto dela.”
Ariane terá uma briga longa pela frente com o corporativismo. O presidente do Sindicato Médico do Rio Grande do Sul, Paulo de Argollo Mendes, saiu em defesa da profissional.
“Ela tem a nossa admiração”, falou. “O código de ética médico tem um artigo que estabelece como deve se dar a relação entre médico e paciente. Não tem por que se arrepender. Ela tem que se orgulhar disso.”
O código de ética, de fato, estabelece que pode haver renúncia ao ao atendimento “no caso de relacionamento prejudicado com familiares” do cliente.
No Juramento de Hipócrates, porém, lê-se: “Não permitirei que considerações de religião, nacionalidade, raça, partido político, ou posição social se interponham entre o meu dever e o meu Doente.”
E daí?
Mengele também obedecia as regras na Alemanha. Facínoras de todo o mundo operaram sob o manto da lei e da ordem. Massacres foram feitos obedecendo a estatutos.
Norma nenhuma é capaz de dar conta da estupidez, da ignomínia, da intolerância e do fascismo que decidimos cultivar. Em que momento uma profissional da saúde passou a considerar aceitável abrir mão de cuidar de um bebê por causa da opinião política dos pais?
Que categoria de canalha confunde isso com “honestidade”? Que tipo de gente é essa?
Por que seria razoável punir um meninote de 1 ano? E é para sentir “orgulho”? Que tipo de monstro acoberta uma atitude insana dessas, penalizando duplamente a família? Esse é o país que eles querem?
Que tipo de gente é essa? Essa gente tem cura?
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