Além da sentença de Moro, o TRF-4 também promete entrar para a história, mas pela porta dos fundos.
Durante a votação da denúncia
contra Michel Temer na Câmara, um deputado do PMDB soltou a seguinte
frase: “A investigação é necessária, mas não é urgente”.
No caso de Lula, pode-se inverter essa máxima. A investigação é urgente, mas não é necessária já que o resultado está dado.
O presidente do TRF-4, Carlos
Eduardo Thompson Flores Lenz, está poupando o trabalho dos três
desembargadores que examinam os recursos do processo em que Sérgio Moro
condenou Lula a nove anos e meio de prisão.
Segundo Thompson, em entrevista
ao Estadão, a sentença de Moro “é tecnicamente irrepreensível, fez exame
minucioso e irretocável da prova dos autos e vai entrar para a história
do Brasil”.
O repórter quer saber se ele curtiu. “Gostei. Isso eu não vou negar”, é a resposta.
“Eu digo, em tese: se eu fosse
integrante da Oitava Turma, e se estivesse, depois do exame dos autos,
convencido de que a sentença foi justa, eu teria muita tranquilidade em
confirmar.”
Isso é que é sutileza.
Thompson não conhece Sergio
Moro, o que não o impede de descrevê-lo com um certo fascínio: “É um
juiz muito preparado, estudioso, íntegro, honesto, cujo trabalho já está
tendo um reconhecimento, inclusive internacional. É um homem que está
cumprindo a sua missão.”
No mês passado, o DCM deu spoilers sobre essa minissérie.
O Jornal Nacional dedicou longos minutos a Thompson Flores no dia em que a condenação de Lula saiu.
Ele apareceu em seu gabinete,
enquadrado com carinho pela câmera, declarando que até agosto de 2018,
antes da eleição, Lula da Silva estará julgado em segunda instância.
A Lei Orgânica da Magistratura
estabelece que juiz não pode falar fora dos autos, mas Gilmar Mendes já
transformou isso numa piada.
O trabalho de apresentar estes homens à sociedade como guerreiros do povo brasileiro continua agora com o Estado de S. Paulo.
Diz o repórter Luiz Maklouf Carvalho:
“É grande a honra e pesada e
tarefa”, disse Thompson Flores ao assumir a presidência, com 54 anos,
ainda solteiro (“mas não perdi as esperanças”), no recente 23 de junho.
Cercado de livros por todos os lados – são cinco mil deles, para onde se
olhe, fora os 25 mil que guarda em casa – o desembargador carrega,
feliz, o peso da história familiar.
Teve coronel trisavô que
matou e morreu em Canudos – está em “Os Sertões” -, conviveu com o avô
quase homônimo que foi ministro do Supremo Tribunal Federal, indicado
pelo general-presidente Costa e Silva nos idos pesados de 1968. O avô já
se foi, em 2001, mas tem a presença garantida quando se conversa com o
neto (que também almeja o Supremo, por que não?) – seja em citações
frequentes, seja nas pinturas que adornam as paredes, três dezenas
delas, do avô e de muitos outros personagens históricos.
É um hobby do desembargador –
como o são a leitura (três obras por vez), os sete idiomas em que fala e
lê (incluindo o latim), o tênis assíduo, e a combinação da gravata com o
lenço no bolso do terno. São tantos livros, e tantas pinturas, que ele
sequer pôde mudar-se para as instalações próprias da presidência. O
Tribunal concordou que ficasse onde sempre esteve – poupando a todos da
maçada que seria a mudança.
Os livros, a maioria
jurídicos, merecem que se registre a excelência, com um exemplo só: a
coleção completa da Harvad Law Review, desde o primeiro volume, de
1887-1888. Ou dois exemplos, que seja: a mesa pequena em que o
desembargador trabalha exibe uma trincheira compacta de 82 volumes de
obras clássicas e ou raras, todas elas estrangeiras. Ele quase
desaparece atrás das lombadas.
No Brasil, a melhor forma de perder a fé na Justiça é saber como ela funciona através de seus donos.
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