Há
pessoas que não sabem sair. Entram com pompa, empertigam-se com as
circunstâncias da função, exibem-se empavonados e querem ficar para
sempre. Gostam do cargo que creem talhado para eles. Acham-se
insubstituíveis. Quando chega a hora de passar o bastão, fazem beicinho e
não querem largar.
Saem meio que a fórceps. E
ficam com raivinha do sucessor ou da sucessora, que não é tão bom ou
tão boa quanto se acham. Alguns até se recusam a transmitir o cargo,
ainda que esse passe a outras mãos dentro da normalidade institucional.
Acham um desaforo a escolha do sucessor sem sua aquiescência. O sucessor
só pode ser quem eles escolhem.
Por recém entrevista que
deu, o ex-PGR parece se encaixar nesse figurino, com vocação para alma
penada, espírito que não toma consciência de que desencarnou. Torna-se
um encosto para os que ficam, a quem enxerga como ingratos, por não lhe
terem garantido mais vida, como entende de seu direito. Um espírito
obsessivo.
Além da continha
“oficial” no Twitter, que inaugurou para sua posteridade, querendo
sempre ser lembrado, assaca, agora, no jornal O Globo, muito
acima do tom, contra acertadíssima decisão do Ministro Ricardo
Lewandowski, de devolver acordo de delação ao MPF, porque celebrado em
evidente usurpação de função jurisdicional. Excessivamente leniente com o
investigado, o tal grupo de trabalho da “Lava Jato”, subordinado ao
ex-PGR, se arrogou o direito de despir de sentido a pena de reclusão em
regime fechado, convertendo-a, sem previsão legal, em serviço à
comunidade. Não só tungou a fixação da pena do juiz, como se fez de
legislador. Ou foi ignorância em direito penal, ou foi a presunção
vaidosa que cegou a turma em volta do ex-PGR.
Mas o ex-PGR foi mais
longe. Sugeriu que a decisão de devolver o acordo de delação ao MPF
poderia ser consequência de desconforto do STF com os “rumos
indesejáveis” das investigações. Moralista tem dessas coisas. Sempre se
acha superior aos outros. Está sempre certo e quem não o reconhece deve
estar de má fé.
Talvez o ex-PGR devesse
se lembrar que foi o Ministro Ricardo Lewandowski que garantiu sua
escolha para o cargo cuja perda tanto pranteia. Insinuar publicamente má
fé de quem procurou tão ansiosamente quando precisou não é propriamente
sinal de bom caráter. Mais comedimento lhe seria recomendável, até
porque, ainda na ativa, como membro do MPF, não é esse o modo apropriado
de se dirigir ao juiz que negou pedido que formulou – não em caráter
pessoal, mas quando ainda no exercício do cargo de PGR. Quem pode, a
esta altura, contestar, nos autos, o teor do despacho é a sucessora
Doutora Raquel Dodge. Atropelar sua iniciativa com entrevista a
periódico não é nem ético e nem disciplinarmente aceitável.
Cada macaco no seu seu
galho. Ao ex-PGR, já que não quis aposentar, talvez por medo do
ostracismo, cumpre agora apenas oficiar perante o STJ, que é a parte que
lhe cabe desse latifúndio. Que deixe o STF para quem sabe e pode. A
Doutora Raquel Dodge, em dois meses, mostrou virtudes que não
constatamos em quatro anos do antecessor: profissionalismo e discrição,
sem entrevistas indignadas, sem envelopamento de edifícios e sem conta
no Twitter.
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