Quem tem filhos pequenos sabe a batalha diária que é fazê-los comer comida de verdade. Sim, porque salgadinho, bolacha e batata-frita eles não rejeitam nunca. O problema é que as crianças estão comendo tão errado hoje que uma em cada três está acima do peso recomendando pela Organização Mundial da Saúde. As consequências não se resumem a quilinhos a mais. O açúcar e a gordura em abundância, presentes nas comidas processadas, vão se acumulando no sangue e nas artérias. No futuro, podem se transformar em doenças, como diabetes e hipertensão.
Se você não sabe por onde começar para mudar os hábitos alimentares da sua família, pode colocar esses quatro passos em andamento. O melhor é que dá para começar hoje mesmo. Boa sorte (e bom apetite)!
1) Diminua os petiscos ao alcance das crianças (e do seu também)
Junto com os alimentos prontos para o consumo, como massas e macarrões instantâneos, os petiscos industrializados – biscoitos, bolachas recheadas, salgadinhos, chocolates – são os principais causadores da obesidade infantil. Uma pesquisa realizada por cientistas da Universidade do Norte da Califórnia com mais de 30 mil crianças americanas apontou que 27% das calorias consumidas diariamente vêm de petiscos industrializados. O estudo concluiu que eles roubaram o lugar das refeições de verdade. Nos últimos 30 anos, aumentou mais a ingestão de calorias vindas de produtos industrializados , 168 calorias por dia, do que o total de calorias consumidas em um dia (as refeições diárias ganharam apenas 113 calorias).
Com preços cada vez mais acessíveis, os produtos industrializados entraram no carrinho de supermercado de famílias de todas as classes econômicas. Conquistaram as crianças pelo sabor e os pais pela praticidade. “As mães têm pouco tempo para preparar as refeições porque trabalham fora e perdem horas no trânsito das grandes cidades”, diz a nutricionista Cristina Pereira Gaglianone, pesquisadora da Universidade Federal de São Paulo, atualmente na Universidade Central da Flórida, nos Estados Unidos. Uma pesquisa da Universidade de Washington e da Universidade Cornell, nos Estados Unidos, mostra que há uma relação entre o número de horas trabalhadas pela mãe e o peso dos filhos. Para cada 5,3 meses em que mãe trabalhou fora de casa, o índice de massa corporal da criança aumentou 10%.
A solução não é abolir os petiscos e alimentos industrializados da dieta. As guloseimas podem se tornar um agrado às crianças apenas nos fins de semana, já que proibi-las totalmente pode incentivar o consumo longe das vistas – e do controle – dos pais. Para garantir pratos mais saudáveis à mesa, a mãe também não precisa abdicar do trabalho. Legumes e verduras comprados em supermercados já limpos e fatiados são uma boa opção para facilitar a vida dos pais que passam muito tempo fora de casa.
2) Faça seu filho gastar calorias
O estilo de vida que aumentou o consumo de petiscos e produtos industrializados também tornou as crianças mais sedentárias. Com a urbanização, brincar de empinar pipa, de esconder e de jogar bola no meio da rua virou um risco, tanto por causa do movimento dos carros quanto pela violência urbana. Os pais que trabalham fora se sentem mais seguros ao deixar os filhos brincando dentro do apartamento, entretidos com o computador, videogame e televisão. Um levantamento do IBGE mostra que 48% das crianças de 0 a 9 anos assistem a mais de 3 horas de televisão diárias. Quase 20% afirmam usar frequentemente o computador e jogar videogame. Uma pesquisa encomendada por um canal infantil a cabo revelou que 87% das crianças entrevistadas disseram preferir jogar futebol pelo videogame a enfrentar outros jogadores de carne e osso. O problema é que a combinação da alimentação altamente calórica com pouca atividade física é desastrosa para a saúde das crianças. Ela se transforma em quilos e saúde de menos.
Praticar esportes na escola, no clube ou em centros mantidos pelas prefeituras ou pelos Estados é uma boa alternativa para garantir que as crianças gastem as calorias que consomem e ainda desenvolvam habilidades sociais e motoras. Tudo isso com a vantagem de estar sob a supervisão de adultos. Cada modalidade desenvolve mais ou menos um desses aspectos. Por isso, antes de soltar as crianças nas quadras ou nas piscinas, é preciso verificar qual esporte pode trazer mais benefícios para a faixa etária do seu filho e qual é a dose recomendada de atividade física para aquela idade.
3) Coloque os pequenos mais cedo na cama
Um estudo feito pela Universidade de Chicago, nos Estados Unidos, reuniu evidências de que as crianças que dormem menos de sete horas por dia têm quatro vezes mais chances de ficarem obesas. “Cada hora a menos de sono aumenta entre 15% e 20% o risco de obesidade”, afirma o neurologista Walter Moraes, pesquisador da Unifesp que estuda a relação entre obesidade e sono. Isso acontece porque a privação do sono aumenta a ação de hormônios que estimulam a fome, como a grelina, e diminui a produção de leptina, uma substância ligada à sensação de saciedade. O objetivo dessas alterações bioquímicas é avisar para o corpo que precisamos consumir energia já que estamos acordados. Mas quando essa lógica é alterada, o organismo continua pedindo e armazenando energia que ele não precisa. O resultado é o acúmulo de gordura.
A Sociedade Brasileira de Pediatria recomenda que as crianças entre 3 anos e 5 anos durmam de 11 horas a 12 horas diárias e entre os 6 anos e os 10 anos 10 horas. Uma boa tática para aumentar as horas na cama é diminuir o número de compromissos das crianças durante o dia. Isso faz com que elas tenham mais tempo para se divertir e não percam horas de sono à noite para aproveitar a televisão e o computador.
4) Comece a prevenção desde cedo
Esse é o mais novo mantra dos especialistas. Depois de analisar dados epidemiológicos de milhares de crianças, eles chegaram à conclusão de que quilos a mais nos primeiros anos de vida predizem as chances de obesidade na vida adulta. O pediatra John Harrington, pesquisador da Escola de Medicina da Virginia Oriental, nos Estados Unidos, analisou o desenvolvimento de crianças com 12 anos. Mais de 25% delas já eram obesas com apenas cinco meses. Ao chegar aos 2 anos, eram 50%. Aos 10 anos, 90%.
“Os bebês que se acostumam a comer demais levam esse hábito para o resto da vida”, diz Harrington. “Eles perdem a habilidade de regular a própria ingestão de alimentos porque não aprenderam a respeitar a sensação de saciedade.” Esse aprendizado começa logo após o nascimento. Quando os bebês mamam no peito, são eles que dizem quanto é o suficiente. Pular essa etapa e ir direto para a mamadeira seria uma péssima porque o controle sobre a ingestão do leite passa do bebê para a mãe – que, invariavelmente, quer ver o fundo da mamadeira vazio. A Organização Mundial da Saúde recomenda que até os seis meses a única fonte de alimentação dos bebês seja o leite materno. Após os seis meses, as mães podem começar a introduzir alimentos sólidos e manter o a amamentação como complemento.
A amamentação ainda tem uma influência importante na formação do paladar das crianças. Os sabores dos alimentos ingeridos pela mãe passam para os recém-nascidos por meio do leite. Quanto mais diversificada for a alimentação materna, maior é o número de sabores com as quais o bebê vai se acostumar. Como todos nascemos com o reflexo de rejeitar gostos que não conhecemos – um mecanismo chamado neofobia (medo do novo) – o contato com sabores diferentes por meio do leite da mãe faz com que a criança aceite melhor a introdução de frutas, verduras e legumes depois dos seis meses, quando deve começar a alimentação sólida.
“O gosto desses alimentos, geralmente azedos e com um leve amargor não estão entre os favoritos das crianças”, diz a bióloga Julie Monella, pesquisadora do Monell Chemical Center, nos Estados Unidos. “Ao longo da evolução, aprendemos que esses sabores estão presentes em alimentos que podem fazer mal. Foi uma estratégia inteligente da natureza para diminuir os riscos de envenenamento”. O trabalho de Julie ganhou notoriedade por mostrar que até o líquido amniótico pode ajudar a programar a preferência dos bebês a certos sabores.
As mães que não gostam de frutas e verduras e deixaram esses alimentos de lado durante a gravidez e a amamentação podem esperar um comportamento semelhante dos filhos. “Como o grau de rejeição a novos sabores tem um componente genético, é provável que o filho apresente a mesma aversão por certos gostos que a mãe”, diz a psicóloga Lucy Cooke, pesquisadora da Universidade College London, na Inglaterra. Mas elas não precisam se sentir culpadas. É possível fazer com que as crianças aprendem a gostar de todos os sabores ao oferecer repetidamente os alimentos, mesmo aqueles recusados. “A influência das experiências pode reverter essa programação genética”, afirma Lucy. Estudos sugerem que as crianças podem ser expostas até oito vezes ao alimento para que se acostumem ao gosto. Por isso, nada de desistir frente a caras feitas e até a cuspidas. “Persistência é vital”,
Nenhum comentário:
Postar um comentário