8.24.2015

Profilaxia pós-exposição ao HIV

Sábado, 21h29, o rapaz chega ainda ofegante ao plantão do pronto-socorro do Hospital Emílio Ribas, em São Paulo. Há exatos 60 minutos, ele tinha participado de um evento em que se expôs ao HIV. Tecnicamente, o jovem fez direitinho a lição de casa: a indicação para o tratamento de profilaxia pós-exposição (PEP) do HIV é de fato mais eficiente quando ministrado até duas horas após o possível contato com o vírus da Aids.


Mas o que era para ser um atendimento eventual, para contatos acidentais, está se transformando em rotina. Muita gente está indo direto da balada para o PS. O tal jovem, como muitos, se expõe intencionalmente contando com a medicação. A prática tem gerado alguns transtornos em centros de referência médica.

No Hospital Emílio Ribas, há dias em que chegam mais de 30 pacientes nestas circunstâncias. E o pronto-socorro, onde são atendidos pacientes gravemente enfermos, lota de atendimentos de PEP, entre uma parada cardiorrespiratória e uma convulsão subentrante.

Segundo Ralcyon Teixeira, supervisor do PS do Emílio Ribas, até maio, quando foram levantados os últimos dados, o pronto-socorro realizou 1.400 atendimentos do gênero. A solução imediata, segundo os profissionais de saúde, seria descentralizar efetivamente o atendimento dos pacientes de PEP.

— Essa é uma das nossas brigas. Um atendimento completo desse, leva, em média, umas três horas, entre colher o exame (o teste rápido de HIV), receber o resultado e medicar. E esse paciente é passado na frente dos outros, pois o protocolo indica como emergência. A gente tenta cumprir a cartilha, mas a urgência, no caso, é bloquear a infecção. Isso poderia ser feito em outros pronto-atendimentos.

Essa foi a promessa do Ministério da Saúde ao reformular o protocolo para a profilaxia pós-exposição (PEP) do HIV unificada no SUS (Sistema Único de Saúde). A ideia foi integrar os três tipos de PEP existentes: acidente ocupacional, violência sexual e relação sexual consentida. Além disso, o documento também propôs a redução do tempo de acompanhamento do tratamento de seis para três meses.


O protocolo recomenda ainda que os medicamentos utilizados para o tratamento sejam ministrados até 72 horas após a exposição ao vírus. O ideal é que seu uso seja feito nas primeiras duas horas após a exposição ao risco. Ao todo, são 28 dias consecutivos de uso dos quatro medicamentos antirretrovirais previstos no novo protocolo (tenofovir + lamivudina + atazanavir + ritonavir).


“A grande vantagem desse protocolo é a simplificação e unificação da PEP em um esquema único de medicamentos. Com isso, não será preciso um especialista em Aids para dispensar a PEP. Isso não só irá ampliar o acesso à população de forma geral, mas também facilitar o procedimentos para os profissionais de saúde como um todo”, explicou o diretor do Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais, do Ministério da Saúde, Fábio Mesquita.
O gargalo no Emílio Ribas - Na prática, no entanto, não é o que está acontecendo. A rede nacional de assistência conta, atualmente, com 517 Centros de Testagem e Aconselhamento (CTA), 712 Serviços de Assistência Especializada (SAE) e 777 Unidades de Distribuição de Medicamentos (UDM). A PEP sexual continua disponível apenas nos Serviços de Atenção Especializada em HIV/Aids (SAE).
Em São Paulo, os CTAs só funcionam de segunda a sexta-feira, em horário comercial. No fim de semana, quando a demanda tem crescido exponencialmente, sobra tudo para o Emílio Ribas. O infectologista Fábio Araújo constata, a cada plantão, a mudança de comportamento de quem procura a PEP.

— A gente tem visto que muitos pacientes estão fazendo o sexo desprotegido deliberadamente e depois vão tomar o remédio. Não é mais uma coisa fortuita. As pessoas estão conscientes do que estão fazendo. Eu recomendo que usem camisinha, mas nós sabemos que esses pacientes não vão usar. Muitos são ‘reincidentes’. O melhor seria oferecer para eles a PREP - profilaxia pré-exposição, que ainda não tem protocolo no Brasil.

Segundo o Mesquita, os usuários que querem transar sem camisinha seriam fortes candidatos a usar a PREP e assim tirá-los do pronto-socorro. Atualmente, o medicamento utilizado para a profilaxia pré-exposição tem o nome comercial de Truvada. Mas, como não há antivirais à venda no Brasil fora do sistema único de saúde, existe um mercado negro do medicamento, que chega a custar R$ 2.100, com comprimidos para um mês.

— Chegou a hora de o Ministério da Saúde assumir as suas responsabilidades e instituir a PrEP - Profilaxia Pré-Exposição - para a qual o rapaz em questão é forte candidato e muitos que já estão fazendo por aí "no mercado negro".

Pesquisa em andamento - Segundo o Ministério da Saúde, há duas pesquisas em andamento, lideradas pela Fiocruz e pela Escola Paulista de Medicina, que estão testando a eficácia da PREP. E será a partir dos resultados desses estudos é que será definido se o serviço de saúde irá oferecer a Prep no Brasil.
Professor de Medicina da Universidade de São Paulo, o infectologista Esper Georges Kallás é o representante na USP da pesquisa do Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas (INI/Fiocruz). A droga combina a emtricitapina e tenofovir, conhecida como GSK1265744, já mostrou resultados positivos em testes conduzidos para tratamento da Aids, e agora terá seu potencial testado como parte da estratégia de prevenção da infecção pelo HIV.

— Os 500 voluntários já foram selecionados e alguns já estão testando a droga há um ano. Os primeiros resultados foram apresentados no Congresso Mundial de Aids, realizado em Vancouver, em julho, e devemos ter uma posição final até dezembro. O que sabemos até agora é que a medicação está sendo muito bem tolerada. Estamos percebendo que os voluntários não tiveram infecção pelo HIV, mas o consolidado só será divulgado no fim do ano.

Estudos como o de Profilaxia Pré-exposição ao HIV (PrEP) já demonstraram que é possível obter 100% de proteção contra a infecção ao longo do tempo, mas para tal é necessária a ingestão diária de um antirretroviral para o resto da vida.


Ou até essas pessoas resolverem retomar a prevenção com o uso de camisinha que ainda é a melhor forma de se evitar o contágio com o vírus da Aids e também de evitar outras doenças sexualmente transmissíveis, como a sífilis.
 (Do portal R7)

Aids: medicamentos antirretrovirais podem ser método de prevenção para HIV

Organização Mundial de Saúde recomendou terapia para os grupos de maior risco

foto especialista
Ralcyon Teixeira Infectologista
Não é recente a busca por melhores táticas de prevenção à infecção pelo HIV, além da tradicional recomendação de uso de preservativo em todas as relações sexuais, incluindo o sexo oral. A ideia se intensificou após a criação de medicamentos cada vez mais eficazes e com menores efeitos adversos.
 A ciência trabalha com o conceito de que medicamentos podem ser usados por pessoas saudáveis para prevenir a infecção de algumas doenças. Este conceito é conhecido como quimioprofilaxia.
 A partir de 2010 foram publicados os primeiros os estudos de quimioprofilaxia mostrando sucesso no combate à transmissão ao HIV. Desde então, novos estudos estão sendo realizados e novas propostas de prevenção são discutidas. No começo de Julho 2014, a Organização Mundial de Saúde (OMS) fez uma recomendação do uso de quimioprofilaxia através de uma combinação de antirretrovirais para tentar diminuir a transmissão do HIV entre os homens que fazem sexo com homens (HSH), transgêneros femininos, usuários de drogas injetáveis, profissionais do sexo e pessoas que estejam em privação de liberdade no sistema prisional.  
 A profilaxia seria feira com a combinação dos antirretrovirais Tenofovir e Emtricitabina, unidos em uma pílula única. Os pacientes submetidos a esse tratamento deveriam tomar diariamente um comprimido da medicação ao dia, por tempo indeterminado. A isso se deu o nome de Profilaxia Pré Exposição Sexual (PrEP). Todos tem que ser avaliados periodicamente a fim de rastrear possíveis efeitos adversos da medicação. Ainda não se sabe a longo prazo todos os efeitos adversos que esse tratamento pode acarretar, visto que essa medicação foi liberada para uso no tratamento do HIV somente a partir de 2004.
É corajosa a postura da OMS de se colocar a favor da quimioprofilaxia e sugerir a implementação desse ato em todo mundo, visando diminuir os novos casos de transmissão pelo HIV. Apesar de a epidemia estar com sua incidência controlada nos últimos anos, os números não mostram o mesmo no grupo sugerido da quimioprofilaxia. Nos casos de mulheres transgêneros, existe uma chance de 50 vezes mais de se contaminar com o HIV do que a população geral. Um recente estudo realizado na cidade de São Paulo mostrou uma prevalência de até 30% de contaminação pelo HIV em um grupo HSH que frequentam o centro da cidade, sendo que a prevalência geral no Brasil segue em torno de 0,5% de acordo com o Ministério da Saúde.
Apesar de se mostrar eficaz na redução da contaminação pelo vírus HIV, outros métodos de profilaxia, como o uso de preservativo, devem ser sempre muito estimulados. Também é preocupante a postura de medicalização do problema e a inexistência de políticas de prevenção para o grupo HSH no Brasil e em todo mundo.  
Existem muitos argumentos prós e contras essa prática, no entanto, ficamos felizes que novos métodos de proteção estejam surgindo na luta contra o HIV. Ainda há muito a se fazer nesta questão, passando por educação sexual, políticas de saúde pública de prevenção eficazes e combate ao preconceito e discriminação. No Brasil já estão acontecendo novos estudos para avaliar a eficácia da quimioprofilaxia como método de prevenção ao HIV e a discussão da introdução desse método nos serviços de saúde.

Referências

http://agenciaaids.com.br/noticias/interna.php?id=21205

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