
Em entrevista ao Sul21, o senador fala sobre o atual momento político nacional e sobre a sua possível candidatura à presidência nacional do PT. Lindbergh identifica um descolamento da base do partido em relação à atual direção e defende uma mudança de programa e de política de alianças para a possível candidatura de Lula em 2018. “Houve uma subestimação da luta de classes no país e o resultado disso ficou evidente no golpe. O programa de 2002 não serve para fazer um governo de transformações”, defende.
Sul21: O PT vive um momento de debate interno para a renovação de suas direções e o seu nome foi apresentado para disputar a presidência nacional do partido. Como é que está se desenrolando esse processo dentro do PT?
Lindbergh Farias: Estamos vivendo um momento extremamente grave da história do país. Eles diziam que era preciso simplesmente afastar a presidenta Dilma para resolver os problemas da crise política e da crise econômica. Alardearam isso em alto em bom som pelo país. O que estamos vendo é o agravamento da crise política e econômica. Acho que vamos entrar numa situação que não é apenas de crise social, podendo mergulhar numa convulsão social. Basta olhar os episódios recentes ocorridos no Espírito Santo e no Rio de Janeiro, para ver o grau de fragilidade no qual estamos entrando.
Neste cenário, vemos pesquisas que colocam o presidente Lula liderando em todos os cenários. A última pesquisa CNT/MDA mostra Lula liderando em todos os cenários chegando a ter 40% de intenções de voto no segundo turno. Eu diria que a grande tarefa do PT neste momento é como resistir a essa restauração do neoliberalismo no país e como construir uma candidatura do presidente Lula com outro programa e outra política de alianças. Estamos vivendo outro momento.
Sul21: Quais deveriam ser, na sua opinião, as principais mudanças em relação a programa e política de alianças?
Lindbergh Farias: Quando olhamos para trás e consideramos as políticas que os governos do PT implementaram vemos uma quantidade impressionante de avanços como a inclusão social gigantesca que ocorreu no país. Creio, inclusive, que esse crescimento do presidente Lula nas pesquisas tem a ver com isso. Uma parcela do povo começa a perceber o que está acontecendo, com perda de direitos, reforma previdenciária e reforma trabalhista. Quando comparam esse cenário com o que foi a experiência do governo do presidente Lula, percebem que o povo mais pobre teve uma ascensão muito grande.
Mas também tivemos muitas limitações. Quando falamos da necessidade de fazer um balanço sobre o que fizemos é com o espírito de corrigir para o presente e para o futuro. Achamos que é preciso elaborar outro programa para o presidente Lula. Houve uma política de conciliação de classes que mostrou as suas limitações. Há vários exemplos disso. No primeiro ano do governo Lula, com o grande cacife político que havia naquele momento, não era para termos avançado no debate sobre a democratização dos meios de comunicação? Claro que era. Mas se acreditou que era possível governar sem mexer com os interesses do andar de cima. Vimos a limitação dessa escolha, principalmente agora no golpe.
Para fazer um governo de reformas profundas, precisaremos mexer também no sistema tributário que é profundamente desigual. Quem paga imposto neste país são os trabalhadores e a classe média. Um funcionário que recebe 5 mil reais paga 27,5% de Imposto de Renda. Um grande empresário que recebe por mês 300 mil reais a título de distribuição de lucros e dividendos paga zero de imposto. Precisamos mexer com a situação do rentismo no Brasil. Temos um Banco Central completamente descolado da realidade internacional, com a maior taxa de juros do mundo, que acaba consumindo mais de 30% do nosso orçamento para pagar juros para esse sistema da dívida. Houve uma subestimação da luta de classes no país e o resultado disso ficou evidente no golpe. O programa de 2002 não serve para fazer um governo de transformações.
Sul21: Há quem defenda, dentro do PT, que o próprio Lula assuma a presidência do partido. Existe essa possibilidade, na sua opinião?
Lindbergh Farias:
O que está ocorrendo dentro do PT é um descolamento da base do partido
em relação à atual direção. A base petista quer uma postura de mais
enfrentamento, não quer um PT acomodado, burocratizado. O que aconteceu
na eleição para a presidência da Câmara e do Senado é um exemplo desse
descolamento da base em relação a uma parte majoritária da direção do
partido. Cogitar o apoio a uma candidatura como a de Rodrigo Maia ou a
uma candidatura como a de Eunício Oliveira, logo depois de um golpe,
quando a nossa militância foi para as ruas para lutar contra os
golpistas é uma loucura.
Eu estou viajando pelo país e coloquei meu nome à disposição para
assumir a presidência do PT. A atual direção, até agora, não encontrou
um nome para disputar a presidência do partido. Por isso ficam
pressionando o presidente Lula para ser candidato. O próprio Lula tem
dito que isso é contraditório. Ele tem que ser candidato a presidente da
República. Nós temos que organizar o PT, fazer alianças e viajar pelos
estados para ajudar a elegê-lo. Pelo que tenho percebido até aqui, creio
que Lula não será candidato à presidência do PT. Se Lula for candidato,
não vou disputar com ele. Temos um tempo grande até junho, mas cresce
entre diversos setores do partido a ideia de que precisamos de uma
renovação.Sul21: Como é que está o ambiente no Congresso, meses após a consumação do golpe contra a presidenta Dilma Rousseff? Houve alguma mudança na composição de forças dentro da Câmara e do Senado?
Lindbergh Farias: No Congresso, ainda não. Em relação ao tema da Reforma da Previdência, a gente já vê muita gente da base de Temer dizendo que não vai votar nesta proposta. Agora, o governo Temer está se desconstituindo. Veja esse último episódio envolvendo o advogado José Yunes, considerado o melhor amigo de Michel Temer, implicando o Eliseu Padilha que, na minha opinião, não tem condições de voltar a ocupar a chefia da Casa Civil. É um governo que está se desintegrando. Ele não tem nenhum compromisso com a sociedade brasileira. Seu único compromisso é com quem deu o golpe com ele: a aliança com a mídia e com o grande capital.
Quanto mais fraco ele fica, mais ele tenta acelerar o programa de reformas. Há alguns articulistas, inclusive do campo deles, admitindo abertamente que o governo Temer tem problemas de corrupção, mas que ele está aí para fazer as reformas. Eles estão tentando se segurar com esse argumento. É um governo completamente desmoralizado que teve o seu núcleo diretamente atingido. Eduardo Cunha está preso. Eliseu Padilha não pode voltar a ser ministro. Gedel teve que deixar o ministério de articulação política. Então, é um governo que pode cair a qualquer momento. Não sei se chega ao meio do ano. As perguntas que o Eduardo Cunha têm feito para o termo representam um roteiro para uma delação premiada.
O governo segue
tendo muita força no Congresso, mas tem uma fraqueza enorme na
sociedade. O carnaval deste ano virou o carnaval do “Fora Temer!”. Acho
que teremos um período de muita turbulência pela frente. Por isso,
precisamos falar do lançamento imediato da candidatura de Lula para que
ele possa apresentar um programa para tirar o país da crise, proteger os
empregos, fazer algo que ele já fez neste país, na crise econômica de
2008-2009. Enfrentamos aquela crise, não com ajuste fiscal, mas
aumentando os investimentos sociais, colocando os bancos públicos para
emprestar dinheiro, fazendo com que a Petrobras investisse no país.
Agora, ao invés disso, eles estão acabando com a política de conteúdo
local, o que é um absurdo.
Sul21: Qual o balanço que você faz da situação da esquerda hoje no país? Mudou alguma coisa do impeachment para cá?Lindbergh Farias: Acho que um grande desejo pela renovação interna dos quadros e por uma reconexão com os movimentos sociais e com a juventude. O espaço da luta institucional e parlamentar é importante, mas as lutas de rua são fundamentais. Houve um processo de acomodação neste período de mais de 13 anos de governo. Isso é inegável. O PT não pode virar um partido só de parlamentares, precisa ter democracia interna, voltar a ter núcleos, usar as redes para envolver seus militantes. Nós sabemos que o golpe foi dado fundamentalmente pelos acertos que tivemos, pelas políticas em favor dos trabalhadores e dos mais pobres. Mas precisamos identificar onde foi que erramos. Eu acho que houve uma subestimação da luta de classes. Houve muita ingenuidade neste processo todo.
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