7.18.2009

Fitoterápicos no SUS

06 de julho de 2009
O Ministério da Saúde (MS) divulgou, em fevereiro deste ano, a Relação Nacional de Plantas Medicinais de Interesse ao SUS, uma lista de 71 espécies vegetais que poderão ser usadas na produção de novos medicamentos fitoterápicos disponibilizados pelo Sistema Único de Saúde para a rede pública. De acordo com informações do Departamento de Assistência Farmacêutica do Ministério, plantas indicadas no tratamento das doenças mais comuns entre os brasileiros, como úlceras, hipertensão e problemas respiratórios, foram priorizadas na elaboração da lista.
Atualmente, o SUS oferece apenas remédios derivados da espinheira-santa, contra gastrite e úlcera gástrica, e do guaco, usado no combate à gripe. Com a medida, pesquisadores farão estudos para criação de novos produtos à base de espécies como Cynara scolymus (alcachofra) e Uncaria tomentosa (unha-de-gato), bastante conhecidas da população. Comprovada sua eficácia, os fitoterápicos passarão pela análise da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e, após a aprovação, poderão ser distribuídos nos hospitais de todo o país. Além da ampliação da oferta de fitoterápicos na assistência farmacêutica básica, o Ministério pretende aumentar o número de estados brasileiros a disponibilizarem esses medicamentos. Até o momento, apenas 12 aderiram à fitoterapia.
Apesar de remoto, o uso de plantas com finalidades medicinais em diferentes formas farmacêuticas esteve associado, durante muito tempo, a crendices cultivadas por pessoas de baixa renda ou oriundas de localidades distantes das grandes cidades. Somente em 1978 a Organização Mundial de Saúde (OMS) admitiu a eficácia de fitoterápicos na profilaxia, tratamento e cura de várias doenças, recomendando sua utilização em nível mundial. Quase trinta anos depois, a mesma instituição publicou o documento “Política Nacional de Medicina Tradicional e Regulamentação de Medicamentos Fitoterápicos” (2005), que discutia políticas de medicina tradicional e medicamentos fitoterápicos em âmbito global e reforçava o compromisso com o estímulo a sua inserção no sistema oficial de saúde de seus 191 estados membros.
No Brasil, país que, de acordo com dados do MS, registra a maior diversidade genética vegetal do mundo, com cerca de 55 mil espécies já catalogadas (de um montante que pode chegar a 550 mil espécies), a fitoterapia construiu uma longa trajetória ligada à sabedoria popular. Chás e outros produtos elaborados exclusivamente à base de plantas já fazem parte da nossa tradição, especialmente no interior do país, aonde medicamentos sintéticos sempre chegaram com maior dificuldade. Considerando a riqueza da nossa flora e visando a cadeia produtiva de plantas medicinais e fitoterápicos, que se relaciona a diversas áreas do conhecimento, nos últimos anos o MS vem trabalhando para a ampliação da presença desses medicamentos no Sistema Único de Saúde.
Em 2006, publicou a Portaria nº 971, sancionando a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC) no SUS, e o Decreto nº 5.813, que autorizou a Política Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos. Em 9 dezembro de 2008, o Ministério aprovou, por meio da Portaria Interministerial nº 2.960, o Programa Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos. A mesma portaria criou o Comitê Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos, composto por membros da Casa Civil e dos vários ministérios e entidades vinculadas que integram o Programa, além de representantes da sociedade civil indicados pelos ministérios de acordo com sua área de atuação.
A Fundação Oswaldo Cruz também possui representação junto ao Comitê, que tem, como primeira competência, a definição de critérios, parâmetros, indicadores e metodologia para avaliação da Política Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos.
Fiocruz aposta em arranjos produtivos sustentáveis
De acordo com o coordenador do Núcleo de Gestão em Biodiversidade e Saúde (NGBS) do Instituto de Tecnologia em Fármacos (Farmanguinhos) da Fiocruz, Glauco Villas Boas, a inserção no SUS da fitoterapia concorre para melhorar o acesso da população que reside em áreas mais afastadas dos grandes centros a medicamentos de qualidade e poderá representar, para o país, uma economia de 20% em relação ao montante gasto na aquisição de medicamentos sintéticos para o atendimento básico à saúde.
Recentemente, o NGBS foi nomeado membro do Grupo Executivo do Programa Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos, responsável pela elaboração da Relação Nacional de Plantas Medicinais de Interesse ao SUS e por formular as ações que o MS pretende implementar, junto à Anvisa, no estabelecimento de normas específicas para produção desses medicamentos.
“Para essas ações”, explica o coordenador do Núcleo, “serão considerados níveis diferentes de complexidade da fitoterapia, estabelecendo normas específicas para oficinas de plantas, farmácias e indústrias. Para cada grau de complexidade, um tipo de norma. E a Anvisa já começou a trabalhar nesse sentido”.
O Programa também prevê ações de estímulo ao desenvolvimento tecnológico de novos fitoterápicos. Para Villas Boas, o papel da Fiocruz no que diz respeito à difusão de tecnologias, validação de metodologias no campo da pesquisa e do desenvolvimento, ensino e capacitação já começou por meio do trabalho do NGBS.
O Núcleo participou da concepção da Política e do Programa Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos e é responsável pela estruturação do Sistema Nacional de Redes de Conhecimentos por Bioma, que deverá reunir os principais atores de cada um desses contextos produtivos: indústrias, agricultores, instituições de ciência e tecnologia, universidades, secretarias de saúde e outros.
A ideia é promover verdadeiros arranjos produtivos sustentáveis por meio de uma metodologia que possibilite a preservação de ecossistemas e mesmo a recuperação de solos através de modelos agrícolas multiuso: o mesmo solo produzindo plantas medicinais, energia, alimentos e espécies vegetais destinadas a outros usos, como corantes e inseticidas. “A construção da Rede de Conhecimentos por Bioma vai representar, nessa área, uma rede de inovação que acredito que seja a maior do mundo, certamente a maior da América Latina”, ressalta Villas Boas. “Este modelo é muito interessante, especialmente em época de crise econômica e ambiental. Trata-se de uma contribuição dentro de uma nova visão de desenvolvimento”, conclui.
Segundo ele, a criação de um centro de inovação e biodiversidade em saúde, a ser instalado no Campus Mata Atlântica de Farmanguinhos, está na lista de prioridades do governo brasileiro. O encontro entre os presidentes da Fiocruz, Paulo Gadelha, e do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Luciano Coutinho, ocorrido em abril, é um sinal de que as negociações caminham nesse sentido. Gadelha e Coutinho se comprometeram a assinar, ainda no primeiro semestre de 2009, um termo de compromisso para consolidar a parceria entre as duas instituições. O documento contemplaria áreas estratégicas para a Fundação, entre elas a produção de fármacos, vacinas e de medicamentos fitoterápicos elaborados com base na biodiversidade brasileira, inclusive da Mata Atlântica, priorizando o desenvolvimento sustentável.
Fonte : Farmanguinhos /Fiocruz

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