Apesar da indústria farmacêutica ter duplicado os investimentos no ramo da investigação e desenvolvimento durante a última década, o número de novos produtos que realmente chegaram ao mercado não passou de metade. Consequentemente, o modelo de negócios que consistia na criação de alguns medicamentos com êxito de mercado e na sua comercialização junto dos fornecedores deixou de ser sustentável. É, por isso, urgente inovar e tentar criar novas respostas.
São necessárias alterações porque a repetição do modelo existente tende a não funcionar. Os fármacos mais bem sucedidos do mercado estão prestes a perder a protecção da patente e há poucos produtos actualmente em desenvolvimento devido à falta de inovação fundamental, ao aumento das vendas e despesas de marketing ou à subida dos custos de regulamentação. Para além disso, a controvérsia que envolve alguns medicamentos tem provocado um certo descrédito e falta de confiança na indústria.
As consequências traduzem-se ao nível financeiro. De acordo com um artigo publicado na “Genetic Engineering & biotechnology News” (GEN), o retorno sobre os stocks farmacêuticos tem-se atrasado em relação a outras indústrias – durante os últimos seis anos, o índex mundial do Dow Jones (bolsa de valores de Nova Iorque) subiu 34,9 por cento, enquanto o índex farmacêutico global FTSE cresceu apenas 1,3 por cento. A indústria está financeiramente mais débil e não consegue responder aos desafios que enfrenta através da simples injecção de capital, pode ler-se na mesma publicação.
Ainda assim, o futuro da indústria é mais promissor do que aquilo que aparenta, já que as estimativas indicam que o mercado farmacêutico global deverá duplicar o seu valor até 2020, atingindo vendas anuais no valor de 949 mil milhões de euros. A procura deverá ser estimulada, maioritariamente, pelo crescimento da camada de população idosa e cada vez mais sedentária, especialmente dos novos mercados nos países em vias de desenvolvimento.
A estes factores acresce a incidência de algumas doenças existentes, em parte devido às alterações climáticas, que alargam o espectro geográfico de doenças infecciosas tropicais e semi-tropicais. As doenças crónicas do foro respiratório estão também a alastrar, à medida que as novas fábricas e os automóveis fazem disparar os níveis de poluição nos países em vias de desenvolvimento. Para além disso, há que ter em conta as novas doenças, muitas delas resistentes às terapias existentes.
Enquanto a indústria farmacêutica procura fazer frente aos obstáculos e agarrar oportunidades estratégicas, há 10 desafios transformacionais que, segundo a GEN, se colocam ao sector até 2020:
- A confiança da indústria nos chamados medicamentos de sucesso deverá diminuir. Em vez disso, o sector vai centrar atenções no desenvolvimento de fármacos com um alcance mais alargado. Prevê-se também uma alteração nas vendas e no marketing, sendo que as grandes equipas de venda actuais deverão ser substituídas por grupos mais pequenos que negoceiam preços com base nos benefícios comprovados.
- A indústria farmacêutica vai diversificar-se cada vez mais, com algumas empresas a tornarem-se especializadas em certos nichos de mercado; outras vão optar pelos genéricos, centrando-se no volume de vendas e nas receitas. Há hipótese de serem bem sucedidas em ambos os ramos mas terão que optar por um dos caminhos.
- Os resultados reais vão ser cruciais para o sucesso do produto. Os produtos terão que gerar lucro e as empresas vão lucrar com a inovação e não com as réplicas de terapias já existentes.
- Vai haver um novo foco na adesão dos pacientes ao tratamento. Há doentes que muitas vezes não tomam os medicamentos prescritos ou interrompem a terapia. As empresas farmacêuticas vão desenvolver novas tecnologias personalizadas de monitorização e técnicas que assegurem que os pacientes tomam a medicação, melhorando os resultados e a segurança, ao mesmo tempo que são gerados mais 22 mil milhões de euros anuais em novas vendas.
- A prevenção será tão importante quanto o tratamento. A indústria farmacêutica está há muito centrada no tratamento de doenças mas será financeiramente mais eficaz prevenir uma doença do que curá-la. Haverá também um apoio do sector aos programas de bem-estar, vacinação e monitorização de fidelidade aos tratamentos.
- A tecnologia vai imprimir transformações na investigação e desenvolvimento. Novas tecnologias moleculares deverão ajudar a cumprir a promessa da pesquisa gonómica, e o crescimento da sofisticação dos aparelhos médicos, frequentemente associado aos medicamentos, irá melhorar a eficácia das terapias, ao mesmo tempo que são reduzidos os riscos.
- O processo de ensaios clínicos deverá tornar-se mais flexível, impulsionado pela partilha de dados e uma maior colaboração entre as empresas farmacêuticas e as entidades reguladoras.
- O processo de regulamentação tornar-se-á global. À medida que os mercados internacionais ganham relevância, as empresas farmacêuticas vão estimular uma maior cooperação entre os reguladores nacionais para dar origem a produtos que salvam vidas, acelerar a comercialização e reduzir os custos das obrigações de regulamentação.
- As cadeias de fornecimento vão tornar-se uma fonte de receitas. A aplicação de sistemas de produção e entrega momentâneos, utilizados noutras indústrias, vai permitir às empresas farmacêuticas desenvolver produtos à medida dos pedidos dos clientes, criando novos canais de comercialização de produtos.
- Os retalhistas vão ser substituídos pela distribuição directa ao consumidor. À medida que o mercado de medicamentos de venda livre cresce e as novas tecnologias permitem a distribuição directa ao consumidor, a confiança nos retalhistas vai diminuir, com mais prescrições a serem aviadas automaticamente.
O sucesso futuro da indústria reside, por isso, na capacidade de adaptação às novas realidades e o prémio de sucesso deverá ser atribuído às empresas com visão, flexibilidade e coragem para começar a mudar de imediato.
Marta Bilro
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