7.01.2015

Vitória da criança e o adolescente

Câmara rejeita redução da maioridade penal de 18 para 16 anos para crimes hediondos

Faltaram apenas cinco votos para aprovar a proposta; foram 303 votos favoráveis, 184 contra e três abstenções

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BRASÍLIA - Após um dia tenso, com tumulto, cones arremessados contra a polícia e até mesmo gás de pimenta para conter manifestantes, o plenário da Câmara dos Deputados rejeitou na madrugada desta quarta-feira a proposta de emenda constitucional (PEC) que reduz a maioridade penal de 18 para 16 anos. O resultado foi apertado. Faltaram apenas cinco votos para aprovar a proposta. Foram 303 votos favoráveis, 184 contra e três abstenções. Como é uma proposta que muda a Constituição, ela precisava do apoio de três quintos dos deputados, ou seja, 308 dos 513. Embora negue, o resultado foi uma derrota para o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que deu apoio para que a proposta, apresentada em 1993, pudesse finalmente ser aprovada.
Na votação que rejeitou a proposta de emenda constitucional que reduziria a maioridade penal PMDB, DEM, PP, PR, PTB votaram em peso à favor da PEC. Já o PT, PCdoB foram majoritamente contrários à proposta. No PMDB, partido do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (RJ), foram 43 votos a favor e 17 contra, além de uma abstenção. No PSDB, principal partido de oposição, 46 deputados votaram a favor da PEC e cinco a rejeitaram. Faltaram justamente cinco votos para que a proposta pudesse ser aprovada. Os tucanos contrários à PEC foram Betinho Gomes (PE), Eduardo Barbosa (MG), João Paulo Papa (SP), Mara Gabrilli (SP) e Max Filho (ES).O PT, como era previsto, votou em peso contra a redução. Dos 61 deputados que participaram da sessão, 60 se posicionaram contra a PEC e apenas um - Weliton Prado (MG) - foi favorável.

Cunha (PMDB-RJ), que articulou a votação da PEC da maioridade penal, derrotada pelo plenário da Casa, disse que a análise do assunto "está muito longe de acabar". Por uma questão regimental, o plenário tem que examinar o texto original da PEC, apresentada em 1993 pelo ex-deputado Benedito Domingos (PP-DF), depois que o substitutivo do deputado Laerte Bessa (PR-DF) foi rejeitado. Cunha afirmou que não colocará a PEC original em votação nesta quarta-feira, para que haja tempo de os deputados se articularem para apresentar eventuais emendas ou modificações ao texto, que deve enfrentar mais resistências, uma vez que ela prevê a redução da maioridade para todos os crimes. Parte dos deputados que aceitam votar o relatório de Bessa - que estipula a diminuição da maioridade paras os crimes hediondos e outros considerados mais graves - não quer a redução para todos os casos. Pela previsão do presidente, a matéria poderá voltar à pauta na semana que vem ou no segundo semestre.
— Apesar de o governo ter trabalhado contra, ter todo tipo de movimentação, foram 303 votos (favoráveis), número representativo, o que mostra que o tema é polêmico — afirmou Cunha. — Se na votação do texto original com alguma aglutinativa atingir o quórum, ótimo.
Ao final da sessão, os deputados contrários à redução da maioridade pediram que a PEC original fosse votada logo. Eles temem que ocorram o mesmo que se deu na votação do financiamento privado de campanha, quando o texto foi vencido no plenário e, no dia seguinte, Cunha o colocou, fatiado, para ser votado, surpreendendo a todos. Na ocasião, ele conseguiu apoio para aprovar o financiamento para partidos.
O líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), comemorou a vitória apertada, destacando que o governo começará a trabalhar, a partir desta quarta-feira, no aperfeiçoamento do Estatuto da Criança e Adolescente (ECA). A ideia é agilizar a votação de projetos para aumentar a pena dos adultos que cometem crimes com menores e aumentar o tempo de internação de três para oito anos no máximo.
O deputado Heráclito Fortes (DEM-PI) subiu à tribuna da Câmara, momentos antes de o resultado da votação da maioridade penal ser anunciado, para avisar que se absteve de votar motivado pelo fato de ter sido derrubado no chão pelos manifestantes.
— O episódio de hoje (terça-feira) contribuiu para a decisão que tomei. Talvez vá primeira vez na vida eu tenha votado abstenção — disse Fortes.
O deputado afirmou ter sido do movimento estudantil e compreender que "essas coisas acontecem", mas afirmou que "não justifica" a maneira como os manifestantes agiram.
O resultado da votação foi comemorado com hostilidades dirigidas pelos manifestantes que estavam na galeria a Cunha. "Oh, Cunha, preste atenção, a sua hora vai chegar", gritaram. O presidente da Câmara pediu respeito e, não sendo atendido, mandou que os manifestantes fossem retirados.
PROTESTOS
Cerca de 30 profissionais das Polícias Legislativa e Militar fecharam as entradas principais do Congresso Nacional. Após cair no chão, o deputado Heráclito Fortes disse que ia mudar de voto.
— Eu pedi, quero passar, eu voto com vocês pela manutenção da idade. Eles me puxaram e eu caí. Depois, ficaram de sacanagem, fingindo que também tinham caído. Agora, vou mudar meu voto. Vou votar pela redução da maioridade. Isso que fizeram é desrespeito à liberdade, à democracia — reclamou Heráclito.
No Departamento de Polícia Legislativa foram registradas duas ocorrências, uma delas pela deputada Moema Gramacho (PT-BA) contra manifestantes pró-redução da maioridade. Segundo o Depol, a deputada se sentiu moralmente ofendida pelo manifestante. Também foi registrada uma ocorrência de injúria racial. Entre os manifestante pró-redução da maioridade, segundo o Depol, havia um estrangeiro não identificado e que foi enviado para a Polícia Civil do Distrito Federal.
O diretor de comunicação da União Nacional dos Estudantes (UNE), Mateus Weber, segurava uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) para exigir a entrada no espaço. Segundo ele, 60 pessoas conseguiram a liminar, nominalmente, para acompanhar a votação. Dezenove pessoas são da UNE e da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes), o restante é de um grupo criado para se manifestar contra a redução chamado Amanhecer.
— A minha senha é o habeas corpus, uma decisão do STF que o presidente da Casa não quer cumprir. Estamos sendo barrados, mesmo com o habeas corpus — reclamou Mateus.
Manifestantes derrubaram o deputado Heráclito Fortes (PSB-PI), que tentava chegar ao plenário. - Jorge William / Agência O Globo
Antes de iniciar a sessão, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), negou que esteja descumprindo o Habbeas Corpus conquistado por 64 manifestantes no Supremo Tribunal Federal (STF) para ter acesso às dependências da Câmara e acompanhar a sessão pública da maioridade penal. Segundo Cunha, a ordem que ele recebeu diz que a permissão para a entrada tem que ser "de acordo com a garantia da ordem" e é o que ele está fazendo.
— A ordem que eu recebi é cumprir de acordo com a garantia da ordem — disse Cunha.
Segundo o presidente, foram distribuídas entre os partidos, 200 senhas para acesso às galerias e não irá permitir o acesso de mais pessoas porque é preciso ter a garantia de que, em caso de tumulto, possa evacuar sem riscos o local. Cunha também rebateu críticas de que teria impedido a realização de uma coletiva de representantes da sociedade contrários à redução da maioridade penal no Salão Verde. Segundo ele, o Salão Verde é aberto aos parlamentares. Em plenário, deputados reclamavam da dificuldade de acesso dos colegas ao plenários. Outros faziam apelo para que Cunha liberasse mais lugares nas galerias.
Estudantes protestam contra a redução da maioridade penal - Givaldo Barbosa / Agência O Globo
Além dos grandes movimentos estudantis, existem manifestantes que não estão ligados a nenhum partido político ou grandes entidades. Entre os movimentos autônomos presentes na Câmara estão os Meninos Negros das Periferias, que não foram contemplados com o critério utilizado por Cunha para a distribuição de senhas.
Para ajudar e fazer com que esses movimentos tivessem representação mínima na Galeria, o deputado Jean Wyllys (PSOL-RJ) tentou negociar com o presidente da Casa.
- Negou periptoticamente. Inclusive, ele (Cunha) disse que vai usar a força se preciso for - criticou o deputado.
Manifestantes contra a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos no Brasil realizaram à tarde passeata, na Esplanada dos Ministérios. Com buzinas, apitos e fogos de artifício, eles se reuniram no Museu Nacional e caminharam até o Congresso Nacional. As faixas utilizadas pelo movimento trazem as frases: "A educação é a cura" e "Somos contra a redução". O Hino Nacional foi cantado diversas vezes.
Na Câmara, grupos que são a favor da PEC também vieram acompanhar a votação. Usando camisas distribuídas pela Frente Parlamentar de Segurança Pública com os dizeres "Se você é contra a impunidade do menos, diga sim!", eles prometem ocupar a galeria da Casa e pressionar os deputados a aprovarem o projeto


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