A ciência comprova eficácia de compostos da planta
no tratamento de diversas doenças, mas pacientes e usuários, tratados
como criminosos, só podem cultivar a planta com determinação judicial
Para manter o controle dos sintomas da doença da menina, Cidinha, como é mais conhecida, e seu marido, passaram a cultivar plantas de maconha em casa, para extrair o óleo e tratar a filha. Só há um ano conseguiu na Justiça um habeas corpus que garante o cultivo para fins medicinais. “Nosso medo era de a Justiça determinar a destruição das plantas que foram para frente depois de tanta dificuldade no cultivo. E se destruíssem, de onde iríamos tirar o óleo?”, questiona Cidinha, presidente da Cultive Associação de Cannabis e Saúde, que há que há um ano a família obteve o habeas corpus na Justica. A Cultive é uma entidade que luta pela regulamentação da cannabis para uso medicinal.
Com histórico semelhante, Bruna Fernanda Dias Lima Moraes, presidenta da Associação Humanitária Cannabica do Brasil, é mãe de autista. O filho Mateus, que atualmente vai bem na escola, onde tem muitos amigos, e se tornou carinhoso com os irmãos e as pessoas, não lembra a criança que só aos 5 anos começou a balbuciar palavras difíceis de entender. Tampouco que vivia em meio a tamanha agressividade, urrando, batendo a cabeça na parede ou quebrando porta, móveis e utensílios em casa. “Sem contar que ele viveu diversas crises asmáticas, com insuficiência respiratória, que quase o matou”, conta Bruna. “A cannabis tem de ser a única opção para tratar o autismo. Essa é a nossa luta e não vou desistir.”
Cidinha e Bruna participaram na tarde de hoje (11), na Câmara dos Vereadores de São Paulo, de um fórum que apresentou o sucesso em tratamento de diversas doenças com o uso medicinal da maconha. O objetivo do evento, promovido pelo mandato da vereadora Soninha Francine (PPS), foi discutir a necessidade de regulamentação do cultivo da cannabis e da produção de extratos da planta, bem como de uma política de redução de danos para ser incorporada à legislação brasileira.
Apesar de a ciência comprovar que determinados compostos da planta são eficazes no tratamento de diversas doenças, pacientes e usuários ainda são tratados como criminosos no Brasil e têm de recorrer à Justiça para obter licença para cultivar a planta, o que torna a obtenção do extrato mais em conta do que a importação.
Os bons resultados do uso do óleo da maconha para tratar sintomas e consequências de doenças cardiovasculares, desordens mentais, neurológicas – entre elas o autismo – e inflamatórias, além de doenças metabólicas e câncer foram abordados pela médica neuro-oncológica Paula Dall'Stella, o neurocirurgião Pedro Antonio Piero Neto, a psiquiatra Eliane Guerra Nunes e a farmacêutica Renata Monteiro Dantas Ferreira.
Um dos principais nomes em todo o mundo na pesquisa com a cannabis, o professor emérito da Escola Paulista de Medicina, Elisaldo Carlini, defendeu a regulamentação do plantio e produção do óleo no país. "O ministério da Saúde holandês comprou uma fazenda e cultiva a planta com rigor científico e segurança, para distribuir às farmácias. E no Brasil o avanço é a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) retirar o canabidiol do rol de substâncias proibidas e o reclassificar como substância de uso controlado, regulamentando a importação do óleo. Não por acaso está para ser vendido no país o Sativex", apontou Carlini.
O custo do medicamento, estimado entre R$ 1.500 e R$ 3.000 o vidrinho, esteve no centro da crítica dos especialistas. "Não deve mesmo ter sido por acaso que a Anvisa mudou a classificação do canabidiol, em 2015", disse a farmacêutica Renata Monteiro Dantas Ferreira.
A psiquiatra Eliane Guerra Nunes defendeu a planta como prioritária no tratamento do autismo, bem como seu uso em relação à epilepsia. "Estudos mostram que outras substâncias presentes na planta, e não apenas o canabidiol, são benéficas no tratamento", disse. Para ela, a cannabis deve ser defendida também pelo avanço do canabidiol sintético, que deverá chegar ao Brasil em breve.
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