Excessos na higiene íntima feminina estão prejudicando a saúde das mulheres, de acordo com os médicos. Isso porque a limpeza exagerada remove bactérias e fungos que normalmente habitam e protegem a área, tornando a região genital mais vulnerável a micro-organismos nocivos. Uma pesquisa que acaba de ser publicada pela revista científica internacional PLoS Medicine reforça essa preocupação da classe médica.
Feito pela Universidade de Berna, na Suíça, o novo estudo encontrou uma relação entre o costume de lavar a parte interna da vagina com sabonete e uma maior vulnerabilidade à contração do vírus HIV. Foram analisados dados de quase 15 mil mulheres da África subsaariana, entre as quais 791 foram contaminadas com o vírus do HIV durante o período do estudo. Nos casos analisados, a limpeza genital interna esteve relacionada a infecções e alterações da flora vaginal, condições ligadas a um risco maior de contração do HIV.
A prática da ducha interna vaginal é expressamente condenada pelos ginecologistas. Para o ginecologista Nilson Szylit, do Hospital Israelita Albert Einstein, o asseio exagerado está se tornando cada vez mais comum no Brasil também. “Algumas pacientes começam a fazer uma hiper higienização, lavando e secando demais, o que é ruim. Acaba ressecando e deixando a região irritada.”
Para Szylit, algumas mulheres, por uma questão cultural, sentem-se “sujas” por causa da secreção natural da vagina. “A vagina é uma cavidade que tem a sua secreção normal, como a saliva, a lágrima ou a cera de ouvido. O aumento dessa secreção pode ser influenciado por outros fatores que não sejam infecciosos e a hiper higienização não vai resolver”, esclarece.
Outros hábitos da mulher moderna, como o uso de protetores diários e a depilação frequente também agridem a região genital. No caso do sabonete íntimo, ainda não há consenso. Para Szylit, a higiene íntima não precisa ser necessariamente feita com um sabonete íntimo, a não ser que exista uma indicação médica. “A limpeza pode ser feita com um sabonete comum, de preferência líquido, porque desidrata menos, deixando a pele mais lubrificada”.
Para o ginecologista Paulo Cesar Giraldo, diretor científico da Sociedade Paulista de Obstetrícia e Ginecologia e professor da Unicamp, o sabonete íntimo é mais adequado porque contém um pH ácido, similar ao da área genital. “Geralmente os sabonetes em barra são mais alcalinos e podem alterar o pH da pele”, diz. Giraldo foi o coordenador do projeto do 1º Guia de Condutas sobre Higiene Genital Feminina, uma iniciativa da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) com o apoio do laboratório Sanofi Aventis, fabricante de uma marca de sabonete íntimo do mercado.
A paulistana Sylvia Palma, de 23 anos, tinha o costume de usar o sabonete íntimo feminino até três vezes por dia. Em uma consulta de rotina, a médica detectou uma inflamação. “Ela me disse que eu perdi a minha proteção vaginal e peguei uma bactéria do ar” lembra. Ela conta que, segundo sua ginecologista, o uso exagerado do sabonete a deixou vulnerável.
Outro costume nocivo que tem origem na tendência ao excesso de limpeza é o uso de protetores diários de calcinha. A ginecologista Fabiane Sabbag Corrêa, do Hospital São Luiz, afirma que o uso frequente não é recomendado, apesar de as propagandas do produto prometerem ‘frescor permanente’.
O uso ininterrupto dos protetores pode facilitar o aparecimento de corrimentos. Seguindo a mesma lógica, as calcinhas de algodão devem ser priorizadas em relação às feitas com tecidos sintéticos. Também é melhor evitar roupas muito apertadas. Outro cuidado: a depilação total da região genital, que está na moda, também não é bem vista pelos médicos.
Apesar de a ausência de pelos dar um aspecto de limpeza, na prática ela pode ter efeito contrário. “Na medicina, os pelos são vistos como uma barreira externa a bichinhos e bactérias. A partir do momento em que se tira os pelos, a mulher se torna mais suscetível aos micro-organismos”, explica Fabiane.
A prática da depilação, se feita com frequência, também pode provocar fissuras e irritações na pele, abrindo as portas para as bactérias, de acordo com o ginecologista Nilson Szylit, do Hospital Israelita Albert Einstein. “Mas o que se torna cultural é muito difícil modificar”
MARIANA LENHARO
Estadão
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