Uma liminar da 20ª Vara da Justiça Federal em Brasília liberou a
comercialização de insetos Aedes aegypti geneticamente modificados. A
Anvisa vinha analisando a regulação do Organismo Geneticamente
Modificado (OGM) OX513A, mas a análise foi suspensa pela ordem judicial.
O OX513A é produzido pela empresa Oxitec.
A ação foi movida pela Oxitec contra a Anvisa. No pedido, a empresa
argumentou que a agência não tem competência para a regulação comercial
do mosquito, uma vez que a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança
(CTNBio) declarou, em 2014, a inexistência de perigo para a saúde
humana, animal ou ambiental em sua circulação. Na decisão, o juiz
federal Renato Borelli afirmou que "a CNTBio possui competência para
emitir decisão técnica sobre a biossegurança de OGM" e que "tal decisão
vincula os demais órgãos e entidades da administração". A Anvisa,
conforme o magistrado, "deveria ter observado a decisão técnica da
CNTBio e promovido o registro do produto".
"A documentação trazida aos autos dá conta de processo administrativo
que se desenrola desde 2014 e que discutiu até o momento, basicamente, a
competência da Anvisa para análise do feito, reclamando a situação
intervenção judicial em face dos danos causados ao livre exercício da
atividade profissional. Diante do exposto, defiro a tutela de urgência
para que seja determinado à Anvisa que suspenda o processo
administrativo de registro e autorização de comercialização do Organismo
Geneticamente Modificado - OGM OX 513A, ficando autorizada a
comercialização do produto pela parte autora, até nova ordem judicial",
diz a decisão.
Os insetos geneticamente modificados são sempre machos e, ao copularem
com as fêmeas, transmitem um gene que impede que seus descendentes
cheguem à fase adulta. A empresa, que já produz os insetos em fábricas
instaladas no Brasil, espera utilizá-los para reduzir a população
selvagem do Aedes transmissor do vírus causador da dengue, zika e
chickungunya.
Segundo informações oficiais da Oxitec, mosquitos foram liberados em
cinco locais, incluindo as cidades brasileiras de Juazeiro (BA),
Jacobina (BA) e Piracicaba (SP), obtendo, como resultado, redução da
população de Aedes aegypti selvagem de 82% a 99% em algumas áreas
afetadas.
O juiz federal Renato Borelli escreveu na decisão que "diligenciando
por meio de pesquisa à rede mundial de computadores, acessei diversas
publicações que mencionam o sucesso da liberação planejada dos mosquitos
transgênicos na cidade de Piracicaba. Ainda, não encontrei menção à
ocorrência de danos, como já previa o parecer do CTNBio acerca do
assunto".
Procurada pela Agência Brasil, a Anvisa informou que ainda não foi
notificada da referida decisão e que, assim que isso ocorrer, analisará
as medidas judiciais cabíveis. A questão vem sendo analisado pela
agência desde 2014. A expectativa, conforme nota divulgada em 2016, era
de regularizar a utilização desse mosquito em pesquisas no território
nacional que produzam as evidências científicas necessárias sobre sua
segurança e eficácia e, só então, avaliar a concessão do registro dos
produtos.
Precaução
A liberação da comercialização foi criticada pela Associação Brasileira
de Saúde Coletiva (Abrasco). Segundo a professora da Faculdade de
Ciências Médicas da Universidade de Pernambuco (UPE), pesquisadora
aposentada da Fiocruz e membro do Grupo de Trabalho Saúde e Ambiente da
Abrasco, Lia Giraldo da Silva Augusto, "essa liberação não tem
sustentação técnico-cientifica".
Ela afirma que "não existem estudos de campo suficientes para garantir a
segurança dessa tecnologia. E, além disso, você tem uso de antibióticos
na própria produção do mosquito transgênico. Então, não há como dizer
que há riscos prováveis à saúde, mas a empresa também não tem como dizer
que eles existem. Deveria ser considerado o princípio da precaução".
A pesquisadora integrava a CNTBio nos anos de 2016 e 2017 e participou
da elaboração de nota técnica da Abrasco que criticou a liberação de
testes sem estudos que assegurassem proteção e efetividade. A
organização apontou que a análise se deu sem dados suficientes, com
ausência de dispositivo de biossegurança e de forma rápida.
Além desses problemas, Lia Giraldo destaca que a tecnologia mantém o
foco no combate ao mosquito, ao passo "se você for verificar, toda a
problemática das arboviroses está relacionada com as questões
ambientais, por questões de organização e falta de estrutura, como
saneamento básico. Nós temos um descontrole da população de aedes por
questões ambientais. O que se vem fazendo é focar no mosquito e não nas
condições que propiciam a propagação do mosquito", criticou.
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