4.22.2011

ASPECTOS ÉTICOS DOS ESTUDOS CLÍNICOS TERAPÊUTICOS


Estudo clínico terapêutico consiste na investigação realizada em seres humanos com o objetivo de verificar a eficácia e/ou segurança de fármacos, medicamentos, vacinas e correlatos. A necessidade do estudo clínico baseia-se na necessidade de demonstração científica de eficácia e segurança do novo medicamento comparada aos tratamentos disponíveis. No passado, a realização desses estudos não era exigida para a aprovação do uso de novos medicamentos; entretanto, atualmente nenhum produto é aprovado sem este estudo.

A discussão sobre os aspectos éticos da realização de experiências envolvendo seres humanos começou após a II Guerra Mundial em 1947, com a elaboração do Código de Nuremberg, que estabeleceu as premissas para as pesquisas com seres humanos:

1. Necessidade de consentimento voluntário do participante no estudo;
2. O estudo deve prever benefícios para a sociedade;
3. O estudo deve ser baseado em resultados de pesquisas em animais, e no conhecimento da história natural da doença ou do problema em questão que justifiquem o estudo;
4. O estudo deve ser realizado de modo a evitar sofrimento físico e mental e lesões aos voluntários;
5. Não devem ser realizados estudos quando existirem razões para acreditar que podem ocorrer morte ou invalidez;
6. O grau de risco aceitável deve ser limitado pela importância do problema que o pesquisador se propõe a resolver;
7. Todas as providências devem ser tomadas para proteger os voluntários em todos os aspectos;
8. O estudo deve ser realizado por pessoas cientificamente habilitadas;
9. O voluntário deve ter a liberdade de abandonar o estudo a qualquer momento de sua realização;
10. O investigador principal tem o dever de interromper o estudo em qualquer fase, caso ele acredite que sua continuação possa causar sofrimento, lesões ou o óbito dos voluntários.

A legislação internacional foi aprimorada a partir do Código de Nuremberg, adaptada ao avanço da tecnologia e do método científico, sem abandonar as premissas relacionadas à proteção do voluntário, garantindo seu direito de participação e de recusa. As duas principais diretrizes internacionais de pesquisa em seres humanos são a Declaração de Helsinque e International Ethical Guidelines for Biomedical Research Involving Human Subjects (Normas Éticas Internacionais para Pesquisa Biomédica envolvendo Seres Humanos), ambas revisadas periodicamente.

A complexidade dos estudos e das exigências das agências regulatórias levou ao aparecimento de padrões internacionais para realização dos estudos clínicos, como Good Clinical Practice (GCP – Boas Práticas Clínicas) e International Conference on Harmonization of Technical Requirements for Registration of Pharmaceuticals for Human Use (ICH) (Padronização do Processo para Registro de Medicamento para Uso Humano).

No Brasil, a regulamentação da pesquisa em seres humanos teve início com a Resolução n. 01/1988, que determinou a criação dos Comitês de Ética em Pesquisas Institucionais, mas sua aplicação foi limitada a poucos centros. A partir de 1996, a realização e o acompanhamento de estudos clínicos são regulamentados pela Resolução n. 196/96, do Conselho Nacional de Saúde, que criou a Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP) e comitês institucionais de pesquisa clínica (CEP), exigindo que todo projeto de pesquisa clínica seja analisado antes de seu início.

Antes do início de qualquer estudo clinico, seu protocolo, bem como o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), devem ser analisados pelo CEP. De acordo com sua complexidade, o projeto pode ser aprovado na própria instituição ou precisará ser encaminhado para nova análise pelo CONEP. O objetivo da análise pelo CEP/CONEP é salvaguardar a dignidade, segurança, bem-estar e direitos do voluntário de pesquisa clínica.

Se for necessária a importação de medicamentos ou insumos, o protocolo deve ser submetido à Anvisa para liberação da importação. O protocolo deve conter os seguintes itens referentes ao estudo:

- Objetivos;
- Desenho detalhado dos métodos;
- Racional expectativa de resultados;
- Orçamento financeiro detalhado (recursos, fontes e destino);
- Acordo quanto à propriedade das informações geradas (não pode haver restrição à divulgação pública dos resultados);
- Declaração de que os resultados da pesquisa serão tornados públicos, independentemente de serem favoráveis ou não (exceto no caso de obtenção de patente, quando os resultados devem ser divulgados após a obtenção da mesma);
- Declaração sobre uso e destino do material e dos dados coletados.

A legislação brasileira não permite a remuneração do voluntário ou qualquer tipo de gratificação que influencie sua decisão em participar do estudo. Oferecer ao voluntário uma reparação de eventuais despesas relacionadas com sua participação no estudo. Na legislação atual, os valores destinados à remuneração dos pesquisadores fazem parte do contrato.

Após a aprovação do CEP/CONEP, o estudo pode ter início. Todos os voluntários assinam e datam o TCLE de próprio punho antes de serem incluídos no estudo. O pesquisador esclarece as dúvidas do voluntário antes da assinatura do TCLE e registra em prontuário a forma e a data de obtenção do mesmo. O voluntário recebe uma cópia do TCLE.

O acompanhamento dos pacientes é feito de forma padronizada e os dados são registrados e auditados em fichas clínicas, conhecidas com CRF (case report form) em todos os centros participantes. Essa padronização garante a coleta correta dos dados e a comparação dos mesmos quando é feita a consolidação das informações. Em muitos estudos é preciso garantir a imparcialidade de avaliação tanto do pesquisador como do voluntário, mantendo em segredo o grupo em que o paciente está incluído, o que é revelado apenas no final do estudo, embora os resultados sejam permanentemente acompanhados por um grupo externo para identificar alguma tendência precoce ou de eventos adversos.

Caso o novo medicamento mostre-se, no mínimo, tão eficaz e seguro quanto o tratamento padrão, ou mais eficaz e seguro que o placebo, ele será submetido aos órgãos regulatórios para a liberação de seu uso.

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