Dilma Rousseff tem de mostrar que a democracia ainda precisa de uma guerrilheira
por Mino Carta
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publicado
06/11/2015 05h16
Reprodução
Véspera
eleitoral de 2010, almoço em uma “mansão” de bairro “nobre”. Singulares
situações, embora largamente justificadas, me escalam à mesa de alguns
“colunáveis” a rodearem o rei da Suécia, como se sabe casado com
brasileira e desde então a fazer lobby do seu célebre caça Gripen.
Coloquei algumas palavras entre aspas por obra de respeitosa adequação
ao linguajar do jornalismo nativo.
Permito-me uma digressão. Eu também moro
em região “nobre”, os Jardins paulistanos, e me abalo a garantir que de
nobre ali não há coisa alguma. O bairro do almoço, de fato um banquete, é
ainda mais graúdo, e me pergunto como o chamariam os repórteres ao
confrontá-lo com o meu. Nobilíssimo? Principesco?
Reina
naquele recanto uma acentuada balbúrdia arquitetônica, de sorte a impor
no mesmo cenário a casa dos sete anões, sempre à espera da neve, e
Tara, moradia neoclássica de Scarlett O’Hara, em meio aos algodoais. Ou a
vivenda de Zorro e um disco voador.
Há outros contrastes, contudo, naquele
faiscante rincão: nele se encravam favelas do tamanho de históricas
cidades europeias, uma Siena ou uma Bruges. Sem maior tormento por parte
dos moradores, acham tudo muito natural. Afora os assaltos.
Retorno ao almoço opíparo. Inquietava a
alguns dos convivas a perspectiva de ver eleita uma “guerrilheira”
(continuam as aspas) de origem búlgara, uma tal de Dilma Rousseff.
A conversa produzia um ruído desagradável aos meus ouvidos e lá pelas
tantas não me contive e, de lança em riste, proclamei que uma coisa é
ser guerrilheiro contra uma ditadura e outra é sê-lo contra um Estado de
Direito.
É a diferença entre Dilma, digamos, e
Cesare Battisti, o assassino que ganhou asilo no Brasil graças à
devastadora ignorância nativa, alimentada, inclusive, por muitos ditos esquerdistas nas nossas plagas.
Exagerei, repito. Em
determinados momentos pareço-me com Pickwick, a personagem de Dickens
que perdia as estribeiras enquanto aumentava a empolgação do revide.
Deveria eu era ter dado uma gargalhada. Nem sempre, infelizmente, reajo
como convém no confronto com a selvageria.
Por exemplo. Como reagir diante das últimas capas das revistas Veja e Época?
Independentemente das acusações que precisam ser provadas, algo similar
não aconteceria, disso tenham certeza, em qualquer país civilizado e
democrático.
Ninguém à mesa imaginava que algum dia ainda culparia Lula
por ter cumprido a mesma tarefa desempenhada pelo rei da Suécia, afável
presença, alheia ao entrevero, e a quem não foi simples explicar-lhe as
razões. De todo modo, alguém perguntara se um nascido em terra
estrangeira, ou seja, o acima assinado, teria direito de tomar aquelas
ofensivas atitudes.
A evocação se deve a uma consideração posterior: Dilma Rousseff não
foi a “guerrilheira” sugerida naquele almoço guardado na memória. Fez,
porém, um governo inquestionável até final 2013, conforme prova em sua
magistral coluna desta edição o professor Delfim Netto. Os problemas
fermentaram em seguida, e não apenas como efeito da crise econômica
mundial. Os resultados estão aí, e nos penalizam a todos.
Os adeptos do “Fora Dilma” acham, em boa ou má-fé, que o impeachment(golpe) resolve. Enganam-se, obviamente. Nada pior do que golpear fatalmente a nossa incipiente democracia.
Do seu lado, Dilma, para não conferir sentido à sua presidência, não
tem, na minha opinião, outra saída a não ser encarnar o espírito da
guerrilheira prometida, e temida, e não cumprida.
Adaptada aos dias de hoje e às esperanças
de quem sonha o Brasil como um país feliz para todos. Trata-se de
reencontrar a energia da juventude combativa para assumir a chefia
afetiva do governo e reavaliar as políticas até aqui implantadas, e as
figuras políticas chamadas a pô-las em prática.
Trata-se, sobretudo e antes de mais nada,
de enfrentar de cara aberta uma oposição desvairada, apoiada pelo
delírio midiático e favorecida pela tibieza das reações dos seus alvos.
Contra a desesperança, é preciso mostrar imperiosamente que o País não
está desgovernado.
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