5.21.2010

DESENVOLVIMENTO DE TECNOLOGIA DE VIDAS (BACTÉRIAS SINTÉTICAS) OU "CIÊNCIA DA À LUZ" A 1ª CÉLULA DESENVOLVIDA POR COMPUTADOR

Célula controlada por genoma fabricado em laboratório
Estudo abriria caminho para produção de bactérias artificiais sob medida.
Grupo é liderado pelo polêmico J. Craig Venter, o ‘pai do genoma’.
Do G1, em São Paulo
Etapas do experimento foram detalhadas emartigo publicado pela 'Science'
Cientistas do Instituto J. Craig Venter anunciaram nesta quinta-feira (20) o desenvolvimento da primeira célula controlada por um genoma sintético.
Agora, esperam usar o método para compreender melhor o mecanismo básico que guia todas as formas de vida e para desenvolver bactérias sob medida que, por exemplo, produzam biocombustível ou ajudem a limpar vazamentos de petróleo.
O instituto entrou com pedidos de patente para salvaguardar direitos de propriedade intelectual sobre algumas das técnicas desenvolvidas.
O grupo já havia sintetizado quimicamente um genoma de bactéria, e também já havia transplantado o genoma de uma bactéria para outra.
Agora, o cientista Daniel Gibson e seus colegas (todos empregados no instituto criado pelo empresário-biólogo Craig Venter) juntaram os dois métodos para criar o que batizaram de “célula sintética” – ainda que apenas o genoma da célula seja sintético. "Nós chamamos de sintético porque a célula é totalmente derivada de um cromossomo fabricado em um sintetizador químico, com base em informações em um computador”, explicou Venter.
É uma ferramenta muito poderosa para tentar projetar o que desejamos que a biologia faça. Temos uma ampla gama de aplicações em mente"
Craig Venter
O genoma sintético é uma cópia de genoma da bactéria Mycoplasma mycoides. Só que à cópia foram adicionadas sequências de DNA montadas em laboratório que serviram como marcas d’água para distingui-la de um genoma natural. O resultado, transplantado na bactéria Mycoplasma capricolum, deu “reboot” nas células receptoras. Na hora do transplante, 14 genes foram deletados ou rompidos, mas mesmo assim as M. mycoides se comportaram como M. mycoides normais, e só produziram proteínas próprias de M. mycoides.
“Se os métodos que descrevemos no artigo puderem ser generalizados, projeto, síntese, montagem e transplante de cromossomos sintéticos não serão mais uma barreira para o progresso da biologia sintética”, escrevem os pesquisadores. “É uma ferramenta muito poderosa para tentar projetar o que desejamos que a biologia faça. Temos uma ampla gama de aplicações em mente”, avisa Venter.
Uma das propostas de Venter (que ele vem propagandeando não é de hoje) é fazer sua "vida 2.0" produzir etanol (álcool) ou hidrogênio, como forma barata de obtenção desses combustíveis limpos. O cientista-empresário já foi acusado de estar criando a "Micróbiosoft" (em referência à Microsoft de Bill Gates), impedindo o uso livre da chamada biologia sintética e mesmo monopolizando a tecnologia.
Outros cientistas defendem a chamada "biologia sintética open-source" (de fonte aberta), na qual as informações para a construção de novos organismos ficariam disponíveis para uso gratuito de toda a comunidade científica.
G1.com
Saiba mais
Ciência ‘dá à luz’ a 1ª célula filha de computador
Pesquisadores americanos anunciam experimento com genoma artificial. Feito abre caminho para criar ‘bactérias programadas’
Washington - Cientistas americanos anunciaram um dos grandes feitos da Ciência no século: o desenvolvimento da primeira célula controlada por um genoma sintético. Os pesquisadores do J. Craig Venter Institute, nos Estados Unidos, apostam que a técnica descoberta vai permitir criar bactérias programadas para resolver graves problemas enfrentados pela humanidade, como ambientais e energéticos.
Os dados do estudo foram publicados na revista ‘Science’. A equipe de pesquisadores, liderada por Craig Venter, já havia conseguido sintetizar quimicamente o genoma de uma bactéria. Eles também haviam feito um transplante de genoma de uma bactéria para outra. “Essa é a primeira criatura do planeta, uma espécie que pode se replicar, cujo pai é um computador”, disse Craig Venter.
Ele destacou que diante do avanço, cientistas já podem pensar na fabricação de vacinas contra a gripe, por exemplo, feitas a partir de células sintéticas.
De acordo com relato da experiência na ‘Science’, os cientistas juntaram as duas técnicas para criar o que chamaram de ‘célula sintética’, mas apenas o genoma da célula em questão era sintético, pois a célula que o recebeu era natural.
Sem esconder a felicidade pelo avanço científico, Venter destacou que a célula sintética é um instrumento poderoso para tentar determinar rumos da biologia no futuro.
Seria o caso da criação de algas para absolver dióxido de carbono e, a partir deles, criarem novos hidrocarbonetos. Ou da criação de novas substâncias químicas, ingredientes para alimentos e métodos para limpeza de água, aposta o cientista americano.
Em entrevista à BBC, o especialista em biologia sintética Paul Freeman, codiretor do EPSRC Centre for Synthetic Biology do Imperial College, em Londres, disse que o estudo de Venter e sua equipe pode marcar o início de uma nova era na biotecnologia.
O Dia
Avaliação
Stevens Rehen, da UFRJ, avalia implicações da 'célula artificial'
Abre-se caminho para estudar neurônios vivos de neandertais, por exemplo.20 pesquisadores gastaram mais de 10 anos e US$ 40 milhões na pesquisa.
Stevens Rehen*
Quais os requisitos mínimos para um micróbio funcionar?
Com essa pergunta originalmente na cabeça e US$ 40 milhões para gastar, o grupo do biólogo Craig Venter foi capaz de criar vida a partir do zero, ou melhor,
O Vaticano demonstrou preocupação de que os cientistas desejem "brincar de Deus".
O dilema é: as bactérias sintéticas são prova definitiva de que a vida não precisa de uma força especial ou, pelo contrário, darão fôlego aos simpatizantes do Design Inteligente? Afinal de contas, o trabalho em questão pode ser também chamado de “ciência da criação 1.0”.
Em 2007, os pesquisadores do instituto que carrega seu nome já tinham conseguido transplantar cromossomos naturais de uma bactéria em outra. No ano seguinte, produziram DNA artificial. Era portanto questão de tempo até combinarem os dois feitos num único experimento.
O potencial biotecnológico é enorme mas os riscos associados à nova tecnologia não podem ser menosprezados.
Ao montar o genoma do novo micro-organismo, a equipe eliminou os genes originais da bactéria Mycoplasma mycoides que as tornam nocivas às cabras. Eliminaram também as sequências de DNA que permitiriam sua eventual reprodução fora de um laboratório de pesquisa. Só depois inseriram o material genético sintético numa versão “oca” de outra bactéria, a Mycoplasma capricolum.
Tais precauções são essenciais, mas não reduzem o receio de que esses novos organismos escapem para o meio ambiente ou sejam usados na fabricação de armas biológicas.
Barack Obama já convocou seus conselheiros especializados em biossegurança para discutir o assunto.
A equipe de 20 pesquisadores levou mais de 10 anos até aprender a montar o cromossomo de uma bactéria e inseri-lo na carcaça biológica de outra.
As células sintéticas cresceram e se multiplicaram aos bilhões – assim como as especulações acerca do impacto dessa nova tecnologia para a humanidade.
Não é de hoje que as implicações éticas desse feito são discutidas.
A façanha tecnológica permitirá que células desempenhem funções específicas de maneira mais eficiente ou assumam novas funções.
Além do seu interesse comercial para a produção de biocombustíveis, vacinas e despoluição ambiental, podemos especular sobre seu impacto no futuro das ciências biológicas e na configuração de áreas de pesquisa antes impensadas, como por exemplo, a antropologia celular.
No começo desse mês, a equipe de Svante Pääbo divulgou a sequência de 60% do genoma do homem de neandertal.
Com o avanço das técnicas desenvolvidas por Craig Venter, talvez no futuro seja possível sintetizar esse genoma pré-histórico e inseri-lo no interior de células humanas, previamente desprovidas de seus núcleos originais.
Dessa forma, recorrendo à reprogramação celular de Shynia Yamanaka, neurônios vivos ou qualquer outro tipo celular gerados a partir de células-tronco desses nossos primos extintos há cerca de 30 mil anos poderão ser estudados.
Novamente a caixa de Pandora foi aberta, com seus riscos e esperanças.
Com o surgimento das bactérias sintéticas de Craig J. Venter, a biologia não será mais a mesma.
* Neurocientista, professor do Instituto de Ciências Biomédicas da UFRJ
G1.com

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