6.16.2011

Perturbações psicossomáticas e Interação corpo-mente



O termo «perturbação psicossomática» não tem uma definição precisa. Na maioria dos casos aplica-se às perturbações que se consideram originadas por fatores psicológicos. No entanto, não existem perturbações físicas que sejam originadas exclusivamente por fatores psicológicos. Mais ainda, uma perturbação física tem necessariamente de incluir uma componente biológica (um factor essencial para que a doença ocorra).
Por exemplo, para contrair a tuberculose, uma pessoa tem de estar infectada pela bactéria Mycobacterium, que causa a doença. Mas muitas pessoas infectadas pelo Mycobacterium têm apenas uma doença ligeira ou simplesmente não sofrem dela. São necessários outros fatores para que a tuberculose se declare doença como tal, o que inclui possivelmente uma predisposição hereditária, fatores ambientais (como viver em condições de amontoamento), a presença de desnutrição e o stress social ou psicológico (como a perda de um ente querido) e a sua reacção emocional consequente, a depressão. Os fatores biológicos, ambientais, sociais e psicológicos combinam-se para que alguém infectado pelo Mycobacterium adoeça de tuberculose. O termo «psicossomático» abrange esta combinação de fatores.



O stress social ou psicológico pode desencadear ou agravar uma ampla variedade de doenças, como a diabetes mellitus, o lúpus eritematoso sistémico (lúpus), a leucemia e a esclerose múltipla. No entanto, a importância relativa dos factores psicológicos varia amplamente entre diferentes pessoas com a mesma perturbação.
A maior parte das pessoas, baseando-se na sua intuição ou na sua experiência pessoal, acredita que o stress emocional pode precipitar ou alterar o curso inclusive de doenças físicas graves. Não é claro como é que estes factores stressantes podem actuar desse modo. As emoções podem obviamente afectar certas funções corporais como a frequência cardíaca, a sudação, os padrões do sono e o ritmo das evacuações intestinais, mas o estabelecimento de outras relações parece menos óbvio. Por exemplo, não foram identificadas as vias de comunicação e os mecanismos pelos quais interagem o cérebro e o sistema imunitário. Poderá a mente (o cérebro) alterar a actividade das células brancas (leucócitos) do sangue e com isso o sistema imunitário? Se isso for assim, como é que o cérebro comunica com as células do sangue? No fim de contas, os leucócitos do sangue movem-se por todo o corpo através da corrente sanguínea ou no interior dos vasos linfáticos e não estão ligados aos nervos. No entanto, as investigações demonstraram que essas relações existem. Por exemplo, a urticária pode produzir-se por uma alergia física ou por uma reacção psicológica. A depressão pode inibir o sistema imunitário, fazendo com que a pessoa deprimida esteja mais predisposta a certas infecções, como as causadas pelos vírus do catarro comum.
Portanto, o stress pode causar sintomas físicos, embora não exista doença orgânica. O corpo responde fisiologicamente ao stress emocional. Por exemplo, o stress pode causar ansiedade, que, por sua vez, activa o sistema nervoso autónomo, e as hormonas, como a adrenalina, aumentam o ritmo cardíaco, a pressão arterial e a quantidade de suor. O stress também pode causar tensão muscular, que desencadeará dores no pescoço, nas costas, na cabeça ou noutras partes do corpo. A alteração emocional que desencadeou os sintomas pode passar despercebida se tanto o doente como o médico assumirem que estes foram causados por uma doença orgânica. Podem chegar a efectuar-se muitos exames diagnósticos infrutíferos, procurando descobrir a causa do aumento do ritmo cardíaco, das dores de cabeça ou das dores de costas, por exemplo.
Os factores psicológicos podem influir indirectamente no curso de uma doença. Por exemplo, algumas pessoas gravemente doentes negam está-lo ou negam a sua gravidade. A negação é um mecanismo de defesa que ajuda a reduzir a ansiedade e torna mais tolerável uma situação ameaçadora. Se a negação aliviar a ansiedade, pode ser benéfica. No entanto, a negação pode impedir que uma pessoa faça um tratamento, o que pode acarretar consequências graves.
Por exemplo, uma pessoa com diabetes que nega a necessidade das injecções de insulina e o controlo de uma dieta rigorosa pode sofrer variações acentuadas nos valores de açúcar no sangue e corre o risco de ter complicações, como o coma diabético. De forma semelhante, uma percentagem elevada de pessoas com pressão arterial elevada (hipertensão) ou epilepsia não tomam os medicamentos, como o deveriam fazer.
A interacção corpo-mente é uma via de direcção dupla. Não só os factores psicológicos podem contribuir para o início ou para o agravamento de uma ampla variedade de perturbações físicas, como também as doenças físicas podem afectar o pensamento de uma pessoa ou o seu estado de espírito. As pessoas com doenças graves, recorrentes ou crónicas, geralmente, deprimem-se. Embora a depressão nestas circunstâncias possa aparecer como uma reacção normal, o estado mental merece atenção. A depressão pode piorar os efeitos da doença orgânica e juntar-se aos sofrimentos do doente. Muitas vezes, um tratamento adequado, como o uso de antidepressivos, melhora estas situações.
Uma pessoa que está ansiosa ou deprimida pode exprimir uma preocupação através de um problema físico. Este fenómeno é mais frequente nas pessoas deprimidas que parecem incapazes de aceitar que os seus sintomas são primariamente psicológicos. A depressão pode conduzir à insónia, à perda de apetite, à perda de peso e ao cansaço extremo. Em vez de dizer «estou tão deprimido», a pessoa julga que a causa da sua sintomatologia é provocada por uma perturbação física. Isto é conhecido como depressão «mascarada». Algumas pessoas são capazes de admitir que se encontram deprimidas, mas então tratam de o explicar como resultado de uma perturbação física.
Manual Merck

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