O vírus HPV está se desenvolvendo onde
menos se imaginava - na boca - e atingindo um número maior de pessoas
mais jovens podendo ser transmitido até pelo beijo
por: Talita Eredia | design: Fernanda Didini | fotos: Alex Silva
Sexo
oral não é brincadeira quando se trata do HPV, o papilomavírus humano.
Todo mundo associa a famosa doença sexualmente transmissível — ou DST —
com a área genital, mas ela também representa um perigo para a boca. E,
uma vez instalado na mucosa bucal, seu vírus é transmitido até pelo
beijo. Resultado: o aumento dos casos de câncer de boca e garganta em
gente cada vez mais jovem.
Antes, as vítimas desses tumores costumavam ter mais de 50 anos e, em comum, o hábito de acender um cigarro atrás do outro e de consumir demais bebidas alcoólicas. Mas uma pesquisa feita pelo Hospital A.C. Camargo, em São Paulo, revela que o perfil mudou: hoje, mais de 30% das pessoas com câncer na cavidade bucal têm menos de 40 anos. “Muitas nunca fumaram na vida”, conta o líder do estudo, o cirurgião oncologista Luiz Paulo Kowalski. Segundo ele, entre os que desenvolvem o carcinoma na garganta, a contaminação pelo HPV alcança 80%. “O sexo oral é o principal comportamento de risco, mas a epidemia é tão grande que suspeitamos de formas de contágio mais simples, que ainda nem conhecemos”, afirma Kowalski.
Existem mais de 100 tipos de HPV por aí. Uns passam batidos pelo organismo, enquanto outros causam as grandes infecções. Mas as variações que provocam tumores e mais preocupantes são a 16 e a 18 — a primeira é responsável por 90% das encrencas no pescoço. Esses dois tipinhos desencadeiam o câncer nas mucosas em que se instalam — sempre no revestimento externo dos órgãos. Na garganta, a região preferida é a orofaringe, ou seja, tudo o que fica atrás do tal sininho: a amígdala e a base da língua. Mas o HPV também protagoniza tumores na laringe, na ponta da língua, na gengiva, no assoalho e no céu da boca (saiba mais na próxima página).
O câncer começa como algo parecido com uma afta que não desaparece. “São como pequenas feridas e verrugas que até podem sangrar. Mas, se não cicatrizar em até duas semanas, é preciso buscar a avaliação de um médico ou dentista”, aconselha o otorrinolaringologista Onivaldo Cervantes, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Quando não é descoberto ligeiro, evolui para um formato de couve-flor; isso quando ele não cresce internamente. O principal sintoma, por incrível que pareça, é a dor de ouvido. Mas é possível sentir também dificuldade para mastigar, engolir e até para falar.
Os estudos ainda não esclareceram o motivo pelo qual a garganta é a favorita do HPV, mas as suspeitas recaem sobre a rica rede linfática da região. “A hipótese é que ela favoreça a disseminação do vírus na mucosa e a sua transformação, alterando a maquinaria celular e facilitando a proliferação do câncer”, considera André Lopes Carvalho, diretor científico do Hospital de Câncer de Barretos, no interior de São Paulo.
Visualmente, o aglomerado de células malignas causado pelo papilomavírus se assemelha a qualquer outro tumor originado sem a sua participação — por isso só uma biopsia pode confirmar a culpa do HPV. Seja qual for o resultado, o tratamento segue o padrão indicado a outros tipos de tumor. “Se a lesão é pequena, é feita a operação convencional. Se é grande, segue-se um protocolo de preservação do órgão para evitar uma grande mutilação”, diz o cirurgião Terence Farias, do Instituto Nacional de Câncer (Inca), no Rio de Janeiro. “E sempre recomendamos a quimioterapia e a radioterapia mesmo se o paciente não é HPV positivo”, ele complementa.
Uma característica, porém, diferencia o carcinoma causado pela DST: ele é menos agressivo e tem um desenvolvimento mais lento. Por isso, o prognóstico de cura é mais otimista. “Esse tipo de tumor é mais sensível às terapias. Se a pessoa não fuma para complicar a situação, as chances de eliminá-lo são ainda maiores”, diz Carvalho.
E a vacina?
Existem dois tipos: a bivalente, que só protege contra as variantes que causam o câncer, e a quadrivalente causadores das verrugas genitais. Embora as duas versões só devam entrar no calendário oficial de vacinação no ano que vem, elas já estão disponíveis em clínicas particulares — e para meninos e meninas, a despeito de a turma do sexo feminino ser o alvo preferencial do vírus. Ambas são aplicadas em três etapas, e têm eficácia comprovada por dez anos. A única contraindicação é a gravidez.
Uma questão ainda controversa diz respeito a quem deve ser vacinado. Uns defendem que o procedimento vale a pena só para jovens que não iniciaram a vida sexual. Outros alertam: ser sexualmente ativo não é sinônimo de ter sido contaminado, portanto deixar de receber a imunização seria uma roubada.
“A vacinação é sempre recomendada, até para quem já foi contaminado por um tipo, lembrando que o corpo não fica imune para sempre após esse contato, como acontece com o vírus do sarampo”, argumenta o ginecologista José Focchi, professor da Unifesp e consultor do laboratório SalomãoZoppi, na capital paulista. “Os riscos de ser reinfectado são enormes”, acrescenta. O fato é que a vacina não mata o HPV já instalado. Em 90% das vezes, o próprio organismo se encarrega de eliminar o agente infeccioso — o problema é que isso pode levar muitos anos.
Alerta final: a eficácia da camisinha em conter a transmissão do vírus é de 70 a 80%, porque ela não cobre todas as áreas suscetíveis à infecção. Isso, claro, não legitima as desculpas para esquecê-la na hora H. Afinal, esse ainda é o melhor método de prevenção, além da vacina.
Antes, as vítimas desses tumores costumavam ter mais de 50 anos e, em comum, o hábito de acender um cigarro atrás do outro e de consumir demais bebidas alcoólicas. Mas uma pesquisa feita pelo Hospital A.C. Camargo, em São Paulo, revela que o perfil mudou: hoje, mais de 30% das pessoas com câncer na cavidade bucal têm menos de 40 anos. “Muitas nunca fumaram na vida”, conta o líder do estudo, o cirurgião oncologista Luiz Paulo Kowalski. Segundo ele, entre os que desenvolvem o carcinoma na garganta, a contaminação pelo HPV alcança 80%. “O sexo oral é o principal comportamento de risco, mas a epidemia é tão grande que suspeitamos de formas de contágio mais simples, que ainda nem conhecemos”, afirma Kowalski.
Existem mais de 100 tipos de HPV por aí. Uns passam batidos pelo organismo, enquanto outros causam as grandes infecções. Mas as variações que provocam tumores e mais preocupantes são a 16 e a 18 — a primeira é responsável por 90% das encrencas no pescoço. Esses dois tipinhos desencadeiam o câncer nas mucosas em que se instalam — sempre no revestimento externo dos órgãos. Na garganta, a região preferida é a orofaringe, ou seja, tudo o que fica atrás do tal sininho: a amígdala e a base da língua. Mas o HPV também protagoniza tumores na laringe, na ponta da língua, na gengiva, no assoalho e no céu da boca (saiba mais na próxima página).
O câncer começa como algo parecido com uma afta que não desaparece. “São como pequenas feridas e verrugas que até podem sangrar. Mas, se não cicatrizar em até duas semanas, é preciso buscar a avaliação de um médico ou dentista”, aconselha o otorrinolaringologista Onivaldo Cervantes, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Quando não é descoberto ligeiro, evolui para um formato de couve-flor; isso quando ele não cresce internamente. O principal sintoma, por incrível que pareça, é a dor de ouvido. Mas é possível sentir também dificuldade para mastigar, engolir e até para falar.
Os estudos ainda não esclareceram o motivo pelo qual a garganta é a favorita do HPV, mas as suspeitas recaem sobre a rica rede linfática da região. “A hipótese é que ela favoreça a disseminação do vírus na mucosa e a sua transformação, alterando a maquinaria celular e facilitando a proliferação do câncer”, considera André Lopes Carvalho, diretor científico do Hospital de Câncer de Barretos, no interior de São Paulo.
Visualmente, o aglomerado de células malignas causado pelo papilomavírus se assemelha a qualquer outro tumor originado sem a sua participação — por isso só uma biopsia pode confirmar a culpa do HPV. Seja qual for o resultado, o tratamento segue o padrão indicado a outros tipos de tumor. “Se a lesão é pequena, é feita a operação convencional. Se é grande, segue-se um protocolo de preservação do órgão para evitar uma grande mutilação”, diz o cirurgião Terence Farias, do Instituto Nacional de Câncer (Inca), no Rio de Janeiro. “E sempre recomendamos a quimioterapia e a radioterapia mesmo se o paciente não é HPV positivo”, ele complementa.
Uma característica, porém, diferencia o carcinoma causado pela DST: ele é menos agressivo e tem um desenvolvimento mais lento. Por isso, o prognóstico de cura é mais otimista. “Esse tipo de tumor é mais sensível às terapias. Se a pessoa não fuma para complicar a situação, as chances de eliminá-lo são ainda maiores”, diz Carvalho.
E a vacina?
Existem dois tipos: a bivalente, que só protege contra as variantes que causam o câncer, e a quadrivalente causadores das verrugas genitais. Embora as duas versões só devam entrar no calendário oficial de vacinação no ano que vem, elas já estão disponíveis em clínicas particulares — e para meninos e meninas, a despeito de a turma do sexo feminino ser o alvo preferencial do vírus. Ambas são aplicadas em três etapas, e têm eficácia comprovada por dez anos. A única contraindicação é a gravidez.
Uma questão ainda controversa diz respeito a quem deve ser vacinado. Uns defendem que o procedimento vale a pena só para jovens que não iniciaram a vida sexual. Outros alertam: ser sexualmente ativo não é sinônimo de ter sido contaminado, portanto deixar de receber a imunização seria uma roubada.
“A vacinação é sempre recomendada, até para quem já foi contaminado por um tipo, lembrando que o corpo não fica imune para sempre após esse contato, como acontece com o vírus do sarampo”, argumenta o ginecologista José Focchi, professor da Unifesp e consultor do laboratório SalomãoZoppi, na capital paulista. “Os riscos de ser reinfectado são enormes”, acrescenta. O fato é que a vacina não mata o HPV já instalado. Em 90% das vezes, o próprio organismo se encarrega de eliminar o agente infeccioso — o problema é que isso pode levar muitos anos.
Alerta final: a eficácia da camisinha em conter a transmissão do vírus é de 70 a 80%, porque ela não cobre todas as áreas suscetíveis à infecção. Isso, claro, não legitima as desculpas para esquecê-la na hora H. Afinal, esse ainda é o melhor método de prevenção, além da vacina.
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