Delegado Orlando Zaccone analisou 308 autos de resistência e descobriu que todos foram arquivados pelo Ministério Público
Rio - Em uma década e meia, as ações policiais registradas nos inquéritos como ‘autos de resistência’, aqueles em que os agentes alegam legítima defesa, mataram 12.594 pessoas em todo o Estado do Rio. É como se, nesse período, a população fluminense tivesse travado 14 Guerras das Malvinas — conflito entre argentinos e britânicos que terminou com a vitória da Inglaterra e um saldo de 907 mortos.
Na guerra urbana carioca não há vencedores. Todos perdem, sobretudo os jovens negros das periferias. Foi o que constatou o delegado da Polícia Civil Orlando Zaccone, que também é doutor em Ciência Política, a partir de um trabalho investigativo para a sua tese de doutorado que deu origem ao livro ‘Indignos de vida: a forma jurídica da política de extermínio de inimigos na cidade do Rio de Janeiro’.
Para provar que o Estado criou um sistema que legitima a violência como forma de punição, o mestre em Ciências Penais esmiuçou 308 autos de resistência ocorridos entre 2003 e 2009. Descobriu que todos foram arquivados a pedido do Ministério Público e que, em apenas um caso, uma viatura policial havia sido atingida por disparos de arma. Do total, 99% foram engavetadas em menos de três anos.
Ao analisar o perfil das vítimas, Zaccone observou que 75,6% dos autos de resistência aconteceram dentro de favelas. A maior parte das vítimas (78%) era negra ou parda. Em 60,7% dos processos nos quais os mortos eram maiores de idade, foi anexado ao processo a folha de antecedentes criminais da vítima.
Segundo ele, esses indícios reforçam a ideia de que o governo, a sociedade e o Judiciário , através de promotores e juízes, sustentam uma política que aprova as execuções policiais contra aqueles que, por supostamente estarem envolvidos no crime, não teriam direito à vida. “A Justiça peca por omissão. O promotor ao fazer o arquivamento omite indícios de execução”, denuncia o delegado.
Na visão dele, a polícia mata, mas não mata sozinha. “A sociedade aplaude quando a violência é dirigida aos ‘matáveis’. Quando essa ação transborda e atinge outros inocentes, essa mesma sociedade não tolera e exige a punição do policial”, critica.
Em 2014, chegou a 584. Os números ainda superam os casos registrados nos anos 90. Naquela década — auge da chamada ‘gratificação faroeste’ — os homicídios decorrentes de intervenção policial eram inferiores a 400 casos no ano.
“Discordo quando dizem que as mortes por autos de resistência diminuíram depois das UPPs. A bem da verdade, os índices apenas retornam para os níveis da década de 90”, diz o delegado Zaccone.
Pela legalização de todas as drogas
Na opinião do delegado Orlando Zaccone, a redução da violência no Rio de Janeiro só tem uma saída: a legalização da produção, do comércio e do consumo de todas as drogas ilícitas, inclusive de tipos mais letais, como a cocaína. “No dia em que a cocaína for oferecida no mercado, ninguém vai buscar o crack. Ele desaparece. É o mesmo que acontece com o álcool, uma droga lícita. Quem vai comprar cerveja não autorizada no camelô, se pode levar uma cerveja de qualidade?”, defende o delegado.
Como porta-voz da Law Enforcement Against Prohibition (Leap) do Brasil — entidade que prega o fim da proibição às drogas — Zaccone lembra que o país está perto de alcançar a marca de 600 mil presidiários nas penitenciárias brasileiras. “Somos a terceira nação que mais encarcera no mundo, atrás apenas dos Estados Unidos e da China”, enfatiza.
Mais de 60% das detenções de mulheres estão ligadas ao tráfico de drogas. “Na maioria dos casos, elas são presas servindo de ‘mulas’, ou seja, fazendo o transporte das drogas ou levando pequenas quantidades para os companheiros na prisão”, constata Orlando Zaccone.
De acordo com a Leap, composta por agentes da lei como juízes e delegados, os elevados índices de homicídios dolosos no Rio — mais de 4 mil por ano — têm estreita relação com o combate às drogas. Resultam de guerras entre facções por pontos de vendas, cobranças de dívidas e ações policiais.
Este e outros pontos polêmicos estão no livro que será lançado na próxima quinta-feira no Circo Voador, na Lapa, às 19h. O evento terá participação de mães que perderam filhos em ações policiais, além de shows, debates e exposição de fotos.
Na guerra urbana carioca não há vencedores. Todos perdem, sobretudo os jovens negros das periferias. Foi o que constatou o delegado da Polícia Civil Orlando Zaccone, que também é doutor em Ciência Política, a partir de um trabalho investigativo para a sua tese de doutorado que deu origem ao livro ‘Indignos de vida: a forma jurídica da política de extermínio de inimigos na cidade do Rio de Janeiro’.
Ao analisar o perfil das vítimas, Zaccone observou que 75,6% dos autos de resistência aconteceram dentro de favelas. A maior parte das vítimas (78%) era negra ou parda. Em 60,7% dos processos nos quais os mortos eram maiores de idade, foi anexado ao processo a folha de antecedentes criminais da vítima.
Segundo ele, esses indícios reforçam a ideia de que o governo, a sociedade e o Judiciário , através de promotores e juízes, sustentam uma política que aprova as execuções policiais contra aqueles que, por supostamente estarem envolvidos no crime, não teriam direito à vida. “A Justiça peca por omissão. O promotor ao fazer o arquivamento omite indícios de execução”, denuncia o delegado.
Na visão dele, a polícia mata, mas não mata sozinha. “A sociedade aplaude quando a violência é dirigida aos ‘matáveis’. Quando essa ação transborda e atinge outros inocentes, essa mesma sociedade não tolera e exige a punição do policial”, critica.
Mais que a pena de morte
Em 2011, 676 pessoas foram executadas nos 20 países que mantêm a pena de morte. No mesmo ano, ocorreram 961 mortes em ações policiais nos estados do Rio e São Paulo. Na série histórica das mortes por autos de resistência, segundo dados do Instituto de Segurança Pública (ISP), o pior índice ocorreu, em 2007. Naquele ano, às vésperas da instalação das primeiras Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), 1.330 pessoas morreram no estado em ações policiais. Nos anos seguintes, esse tipo de ocorrência caiu.Em 2014, chegou a 584. Os números ainda superam os casos registrados nos anos 90. Naquela década — auge da chamada ‘gratificação faroeste’ — os homicídios decorrentes de intervenção policial eram inferiores a 400 casos no ano.
“Discordo quando dizem que as mortes por autos de resistência diminuíram depois das UPPs. A bem da verdade, os índices apenas retornam para os níveis da década de 90”, diz o delegado Zaccone.
Pela legalização de todas as drogas
Na opinião do delegado Orlando Zaccone, a redução da violência no Rio de Janeiro só tem uma saída: a legalização da produção, do comércio e do consumo de todas as drogas ilícitas, inclusive de tipos mais letais, como a cocaína. “No dia em que a cocaína for oferecida no mercado, ninguém vai buscar o crack. Ele desaparece. É o mesmo que acontece com o álcool, uma droga lícita. Quem vai comprar cerveja não autorizada no camelô, se pode levar uma cerveja de qualidade?”, defende o delegado.
Como porta-voz da Law Enforcement Against Prohibition (Leap) do Brasil — entidade que prega o fim da proibição às drogas — Zaccone lembra que o país está perto de alcançar a marca de 600 mil presidiários nas penitenciárias brasileiras. “Somos a terceira nação que mais encarcera no mundo, atrás apenas dos Estados Unidos e da China”, enfatiza.
Mais de 60% das detenções de mulheres estão ligadas ao tráfico de drogas. “Na maioria dos casos, elas são presas servindo de ‘mulas’, ou seja, fazendo o transporte das drogas ou levando pequenas quantidades para os companheiros na prisão”, constata Orlando Zaccone.
De acordo com a Leap, composta por agentes da lei como juízes e delegados, os elevados índices de homicídios dolosos no Rio — mais de 4 mil por ano — têm estreita relação com o combate às drogas. Resultam de guerras entre facções por pontos de vendas, cobranças de dívidas e ações policiais.
Este e outros pontos polêmicos estão no livro que será lançado na próxima quinta-feira no Circo Voador, na Lapa, às 19h. O evento terá participação de mães que perderam filhos em ações policiais, além de shows, debates e exposição de fotos.
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