A taxa de repetência no Brasil está mais próxima da realidade da África Subsaariana que de qualquer outra região do planeta
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Se tudo continuar como está, o prognóstico para esses alunos é temerário, revela um novo estudo da organização Todos Pela Educação. O trabalho comprova com estatísticas abrangentes aquilo que os educadores já intuíam: a repetência compromete o aprendizado do estudante para o resto da trajetória escolar. Para chegar a essa conclusão, pesquisadores da entidade usaram dados da Prova Brasil, do Ministério da Educação, que avalia em português e matemática todos os alunos das escolas públicas de ensino fundamental.
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Casos como Paulo são reflexos de uma cultura de repetência. Em 1982, segundo cálculo do matemático Ruben Klein, da Fundação Cesgranrio, o Brasil chegou ao absurdo de reprovar 60% dos alunos da 1a série. Na raiz das altas taxas de reprovação no Brasil está a visão de que a ameaça da repetência é um instrumento que o professor pode usar para controlar a disciplina em sala de aula. “O que faz um aluno que não quer estudar e sabe que não tem chance de ser reprovado? Nada”, diz Maria Izabel Azevedo Noronha, presidente do sindicato dos professores de São Paulo. Não é por acaso que o sindicato é um dos principais críticos do sistema de progressão continuada implantado em 1997 em São Paulo para baixar as taxas de repetência e evasão escolar. A progressão continuada prevê que os alunos só sejam reprovados no 5o ou no 9o ano do ensino fundamental. Em 15 anos, o sistema obteve resultados controversos. Baixou as taxas de repetência, mas não melhorou significativamente as de aprendizagem. Por falta de estrutura adequada, como um sistema de aulas de recuperação para os alunos com desempenho inferior, parte deles não aprende, chega despreparada ao ensino médio e acaba reprovada mais tarde.
O desafio de São Paulo – conciliar baixas taxas de reprovação com bom rendimento escolar – é o mesmo enfrentado por cidades com redes de ensino infinitamente menores e consideradas modelos em educação. O município de Cocal dos Alves, no Piauí, simboliza um paradoxo educacional. Tem proporcionalmente o maior número de alunos campeões das Olimpíadas de Matemática do país. E ostenta a segunda maior taxa de repetência do Brasil: 32%. O professor de matemática Antonio Amaral, responsável pela preparação dos estudantes de Cocal dos Alves para as Olimpíadas, dá duas explicações para esse índice. A primeira é a falta de estrutura adequada, com profissionais qualificados, para dar apoio a alunos com dificuldades de visão e audição. A segunda explicação está relacionada à atitude dos alunos. Amaral ilustra seu argumento com um relato. No ano passado, deu aula para duas turmas do 6o ano. De manhã, os alunos eram interessados e faziam o dever de casa. De tarde, era o contrário. Poucos prestavam atenção às aulas, quase nenhum fazia a lição de casa, e as provas voltavam sempre com notas vermelhas. Em setembro, pouco mais de 60% do livro didático fora ensinado – enquanto a outra turma já terminara. Amaral diz que tentou de tudo, mas não adiantou. Boa parte da turma foi reprovada.
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Seu depoimento mostra como é difícil erradicar a cultura da repetência. Mas esse também não é um obstáculo intransponível. As melhores escolas particulares brasileiras já conseguiram vencê-lo. Elas não reprovam praticamente ninguém. Para isso, contam com a vantagem de receber alunos com uma boa base prévia. O mesmo pode ser feito no ensino público, com investimento em creches e pré-escolas de qualidade. As pesquisas mostram que é da infância que vêm a motivação para aprender e as primeiras habilidades cognitivas.
Investir na pré-escola é uma medida de longo prazo. Mas há estudos e experiências que mostram o que fazer para quem já está atrasado: avaliação e reforço escolar. O professor deve diagnosticar rapidamente que alunos não estão aprendendo e fazê-los recuperar ao longo do ano o tempo perdido. E, principalmente, não deve repetir o que não funcionou. “Alguns alunos aprendem melhor com exercícios repetidos, outros com uma lousa organizada, outros trabalhando em grupo”, diz Priscilla, do Todos Pela Educação. “O que não adianta é fazer a criança passar de novo pelo mesmo processo que já não deu certo uma vez.”
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