Novos estudos mostram por que homens e
mulheres lidam de forma diferente com o dinheiro. E especialistas
revelam os segredos para obter sucesso financeiro nas relações a dois
Paula Rocha e Natália Martino
Cofira as dicas do casal de consultores Roberta e Bruno Omeltech :
É melhor ter conta conjunta ou separada? Quem ganha mais paga mais?
Qual é a hora certa de falar sobre dinheiro com o parceiro? É um
problema a mulher ganhar mais do que o homem? Essas dúvidas, que
atormentam os casais modernos, moveram pesquisadores a produzir
trabalhos científicos sobre o tema e inspiraram especialistas a buscar
respostas práticas, que ajudem homens e mulheres a conquistar o tão
desejado sucesso financeiro no casamento. Entre as descobertas está o
fato de que eles e elas lidam de forma diferente com o dinheiro, além de
um novo método que promete auxiliar os casais a colocar em prática seus
sonhos, garantindo que as dificuldades financeiras não destruam os
castelos amorosos que motivaram a união.
“Noventa por cento dos problemas financeiros não são matemáticos, mas
sim comportamentais”, afirma o consultor financeiro André Massaro. É aí
que entram as diferenças entre os gêneros na relação com o dinheiro. De
acordo com um estudo realizado em 2011 pela Ledbury Research, mulheres
são melhores investidoras, uma vez que são mais disciplinadas, se expõem
a menos riscos e possuem maior visão de longo prazo. Contudo, elas
também se endividam mais do que os homens, pois gastam mais dinheiro em
várias coisas de pequeno valor, enquanto eles preferem investir uma
grande quantia em um único bem. “É uma questão sociológica”, diz Gustavo
Cerbasi, consultor financeiro e autor do best-seller “Casais
Inteligentes Enriquecem Juntos” (Editora Gente, 2004). “Durante séculos,
o homem atuou como o provedor. Hoje, ambos trabalham, mas a mulher está
mais acostumada a lidar com as despesas do dia a dia.” Por isso,
geralmente são elas quem melhor administram a renda da família. “A
situação se complica, porém, quando a esposa tem um salário maior do que
o marido”, afirma Massaro. “A maioria dos homens diz não se importar
com isso, mas o que eu vejo prova o contrário. Eles ficam com o ego
ferido quando a mulher ganha bem mais.”
Os rendimentos mensais da paulistana Marília Cardoso, 27 anos, são
superiores aos do marido, Kauê Khouri Bochmakian, 27. Quando eles
começaram a sair, há sete anos, Marília ficava admirada com o
desprendimento financeiro do namorado. “Ele sempre pagava a conta, e
aniversários e datas comemorativas eram sinônimo de presentes caros”,
diz. Tudo financiado com o salário de bancário, que não chegava a R$
900. Desconfiada, a moça colocou o rapaz contra a parede e descobriu que
ele tinha uma dívida que já somava R$ 15 mil. “Sou de família humilde e
aprendi a sempre poupar antes de comprar. Então, aquela situação para
mim era inadmissível”, diz Marília. Nesse momento, começaram as brigas
entre o casal. “Eu achava que ela estava se intrometendo demais na minha
vida quando me dizia para não gastar”, afirma Bochmakian. As discussões
só diminuíram quando Marília pegou dinheiro emprestado com a irmã para
quitar a dívida do namorado e o ajudou a economizar para pagar a
cunhada, que não cobrou juros. Hoje casados, conseguiram encontrar um
equilíbrio. Com o salário dele – ainda bancário, mas em um cargo mais
elevado –, pagam as contas cotidianas. O dinheiro dela vai para a
poupança e é destinado a gastos maiores. “Recentemente, usamos parte
desse montante para comprar uma moto, um terreno onde vamos construir
nossa casa e um petshop que pretendemos tocar juntos”, diz Marília, que,
inspirada pelas dificuldades do namorado, lançou o livro “Você Sabe
Lidar com o Seu Dinheiro?” (Primavera Editorial, 2010).
Dinheiro e casamento estão intimamente ligados desde sua origem. “O
casamento como instituição social surgiu na Idade Média, em meados do
ano 1000, como uma forma de preservar propriedades”, afirma a psicóloga
Cleide M. Bartholi Guimarães, especialista em terapia de casal com foco
em finanças e autora do livro “Até Que o Dinheiro Nos Separe” (Editora
Saraiva, 2010). “Entre os séculos XVIII e XIX, porém, floresceu a ideia
do amor romântico, o que tornou tabu misturar amor e dinheiro”, diz. Os
reflexos dessa visão romântica sobre o casamento influenciam o
comportamento dos casais até hoje, segundo Cleide. “Percebo que alguns
têm mais disponibilidade para falar de valores, mas a maioria não gosta
de tocar nesse assunto.” O resultado dessa falta de vontade ou tato para
abordar o tema acaba tornando as finanças um ponto de conflito. Segundo
um estudo conduzido pelo Instituto de Pesquisa Social da Universidade
de Michigan, nos Estados Unidos, o dinheiro é o principal motivo de
discórdia entre casais. Esse dado foi constatado após os pesquisadores
acompanharem 373 casais ao longo de 25 anos. Nesse meio-tempo, 46% deles
se divorciaram. Entre os divorciados, 49% disseram que brigavam muito
com o ex-parceiro por causa de dinheiro e previam enfrentar problemas
financeiros também com companheiros futuros.
Falar sobre finanças desde o começo do namoro é o primeiro passo para
o sucesso de um casal, defendem os especialistas. “E se, a partir
dessas conversas, eles perceberem que têm perfis financeiros diferentes,
devem trabalhar para lidar da melhor forma um com o outro”, afirma
Cerbasi. O consultor, que definiu os cinco perfis mais comuns e como
conciliá-los (leia quadro na pág. 57), diz que é possível melhorar as
características financeiras do cônjuge, mas não mudá-las por completo.
“Se o perfil do outro incomoda demais, deve-se considerar a separação.”
Foi o que aconteceu com o gaúcho Gérson Worobiej, de 43 anos. Querendo
manter o mesmo padrão de vida de antes do casamento, a ex-mulher dele
gastava mais do que ganhava e logo eles tinham contraído dívidas no
cheque especial e no cartão de crédito. “Depois de 13 anos, olhei para
trás e vi que não havia construído nada”, afirma. Após a separação,
Worobiej ainda enfrentou meses de dificuldades financeiras até conhecer
sua atual esposa, a contadora Patrícia de Andrade Garcia, 35 anos. Com
Patrícia, as compras do casal são calculadas e até sobra dinheiro para
colocar na poupança todo mês. “Nunca dormi tão bem na minha vida, sem
ter que me preocupar com credores”, diz Worobiej.
Para os casais que desejam acertar os ponteiros financeiros, mas não
sabem como, uma orientação é colocar no papel os projetos a curto e a
longo prazo de cada um. Esse método, batizado de “livro dos sonhos”, foi
criado pela planejadora financeira americana Kimberly K. Maez. Segundo a
especialista, eles devem se fazer as seguintes perguntas: “Onde você se
vê em cinco anos? E em dez?”, “O que você espera que o dinheiro traga
para você? E para sua família?” Depois que ambos tiverem respondido
individualmente, é hora de sentar e conversar sobre as respostas. “Essa é
uma forma de fazer os casais falarem sobre seus objetivos e valores, e
checar se eles são compatíveis”, diz Kimberly. Cerbasi concorda. “Falar
sobre dinheiro é falar sobre sonhos”, diz.
Compartilhar o mesmo sonho foi a chave do sucesso financeiro do casal
paulistano Rodrigo Geammal, 39 anos, e Fabiana Azevedo, 38. Há seis
anos, eles alugavam um pequeno apartamento de um quarto, onde tinham
apenas um colchão, um cobertor, um baú e uma televisão, quando a agência
de marketing de Geammal faliu. “Eu disse para a Fabiana: ‘O sonho
acabou’”, conta Geammal. “Mas ela me respondeu: ‘Não acabou, não. Nem
que a gente tenha que morar debaixo da ponte, vamos fazer esse sonho
acontecer.’” Atuando como atendente publicitária, Fabiana passou a
cobrir todos os gastos do casal enquanto Geammal reestruturava o
conceito da empresa. Aos poucos, o negócio prosperou e Fabiana deixou o
emprego para tocar a agência com o marido. Hoje eles possuem clientes
entre grandes companhias e trocaram o quarto e sala por um confortável
apartamento na zona sul de São Paulo.
“Muitas pessoas acham que podem resolver sozinhas um problema
financeiro e acabam escondendo isso do parceiro, até a situação se
tornar insustentável”, diz o consultor Massaro. O ideal, defende o
especialista, é ser sincero. “Especialmente se o problema for uma dívida
que só cresce.” Caso dos servidores públicos federais Ubiratan Hops
Guimarães, 44 anos, e Ângela Stela Guimarães, 42, casados há 22 anos e
pais de Isabella, 14. “A gente gastava mais do que ganhava. Cartão de
crédito, cheque especial, empréstimos consignados... tinha de tudo”, diz
Guimarães. Para não irem à falência, decidiram vender um apartamento
financiado em uma área nobre de Curitiba, que consumia todos os meses R$
3,2 mil da família, e se mudaram para uma casa em um bairro mais
modesto. “Ainda não estamos conseguindo guardar dinheiro, mas acredito
que dentro de seis meses a gente vire investidor. Esse é o nosso
projeto: de gastador a investidor!”, diz Guimarães, que conta com a
orientação de um consultor para atingir esse objetivo.
Livrar-se das dívidas pode trazer uma sensação de alívio e melhorar a
convivência, mas o ideal, garantem os consultores, seria planejar os
gastos. “Para dar certo, o casal deve deixar de pensar na vida
financeira de solteiro e focar na família”, diz o economista carioca
André Braz, do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação
Getulio Vargas. Com o casamento marcado para 31 de julho de 2013,
Liliane Santos Lima, 24 anos, e Jefferson Augusto Moskoski, 25, estão
juntando dinheiro há um ano, com a ajuda de um casal de consultores
financeiros. Todo mês, ela, que é assistente-administrativa, e o noivo,
empresário, depositam uma parte de seus salários em uma poupança, para
custear as despesas com a festa. “Nós temos perfis bem parecidos, somos
controlados e queremos começar nossa vida a dois sem dívidas”, diz
Liliane.
Não existe uma fórmula que garanta o sucesso financeiro de um
casamento, mas algumas atitudes caracterizam o comportamento dos casais
que chegaram lá. “Entre os segredos dos bem-sucedidos, está cultivar a
transparência e a confiança na hora de juntar rendas e dividir os
gastos”, diz Cerbasi. Lição aprendida com louvor pela dupla Carla Sarni,
38 anos, e Cleber Soares, 36. A parceria financeira entre eles fez o
casal sair de um faturamento de R$ 360 mil anuais do pequeno consultório
odontológico de Carla para os atuais R$ 180 milhões que a Sorridents,
franquia de consultórios fundada por ambos, fatura hoje anualmente.
Quando se casaram, Carla propôs ao marido que largasse a carreira
militar e a faculdade de análise de sistemas para estudar odontologia.
Quando ele se formou, eles já tinham mais de duas dezenas de clínicas.
Hoje, são 183 unidades. Para Carla, o maior motivo do sucesso da
Sorridents é o apoio incondicional entre os dois. “No início, resolvi
abrir mais de dez consultórios de uma vez e acabamos precisando vender o
apartamento em que morávamos para colocar dinheiro no negócio. Ele
nunca me criticou por isso. Apenas dizia que em breve compraríamos outro
imóvel”, diz a empreendedora, que acaba de se mudar com o marido para
um belo apartamento de 355 metros quadrados em São Paulo.
Colaborou Wilson Aquino
Foto: João Castellano/ag. istoé
Fotos: Marcos Nagelstein; Kelsen Fernandes; Rogério Cassimiro/ag. istoé
Fontes: André Massaro e Gustavo Cerbasi
Foto: Gabriel Chiarastelli - ilustração: Fernando Brum
Fonte: “Casais Inteligentes Enriquecem Juntos”, de Gustavo Cerbasi, Editora Gente
Foto: Guilherme Pupo
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