11.09.2015

José, arquiteto das pirâmides?


O pré-candidato republicano Ben Carson (Crédito: Gage Skidmore/Creative Commons)A tese foi citada publicamente pelo médico durante uma palestra em 1998 na Universidade Andrews, e ele confirmou que continua tendo essa opinião hoje. Eis, textualmente, o que ele disse na ocasião.
“Minha teoria pessoal é que José construiu as pirâmides para armazenar grãos. Bom, todos os arqueólogos acham que elas foram feitas para funcionarem como túmulos de faraós. Mas, sabe, seria preciso algo tremendamente grande — quando você pensa um pouco, e não acho que seria algo que desapareceria ao longo do tempo –, para guardar tantos grãos [quanto os citados na história de José].”
José, para quem não leu o livro do Gênesis, é o filho do patriarca bíblico Jacó que foi vendido como escravo por seus irmãos invejosos e, após muitas peripécias, tornou-se vizir (primeiro-ministro) do Egito graças à sua capacidade de interpretar sonhos proféticos. Uma dessas interpretações precisas foi sobre um sonho do faraó que previa sete anos de vacas magras no país do Nilo. Graças aos conselhos de José, o governo faraônico conseguiu se prevenir contra o desastre (foi isso, aliás, que rendeu ao filho de Jacó o melhor cargo público do mundo antigo).
Bem, há alguns probleminhas em relação à hipótese de Carson:

1)Não dá para saber se José é mesmo um personagem histórico. Não há registros egípcios da carreira dele, por exemplo, embora outros indivíduos de origem semita como ele tenham feito carreira de sucesso na administração egípcia.

2)Temos uma noção bastante boa da cronologia da construção das pirâmides, com inscrições especificando os faraós responsáveis e tudo o mais. Ocorre que as mais famosas datam todas de 2600 a.C. a 2500 a.C. — muitos séculos antes de Abraão (se é que ele também existiu…), que dirá de José. As últimas pirâmides da Idade do Bronze são de 1750 a.C. — também anteriores a José, provavelmente. E as últimas mesmo são de 664 a.C., muito depois do tempo do intérprete de sonhos semita. Ou seja…
Cenário clássico das pirâmides de Gizé (Crédito: Reprodução)

3)Finalmente, há ampla documentação sobre o uso das pirâmides como câmaras mortuárias, até porque elas não são ocas, mas possuem apenas passagens estreitas em seu interior. Quantidades industriais de trigo e cevada simplesmente não cabem dentro delas. Aliás, os arqueólogos também já acharam celeiros egípcios, e o formato deles não tinha nada a ver com a dos pirâmides.
Moral da história: diploma de medicina, ao contrário do que muita gente acredita, não faz o sujeito virar onisciente, nem equivale a um atestado geral de bom senso.

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