3.03.2013

RIO QUASE PACIFICADO

Bandeiras do Brasil e do governo do estado são hasteadas no Complexo do Caju

  • Conjuto de favelas e a Barreira do Vasco foram ocupadas pelas forças de segurança nesta manhã
  • Ação conta com apoio de fuzileiros navais, policiais militares e civis, além de agentes rodoviários federais
  • Linha Vermelha chegou a ser interditada por cerca de duas horas no fim da madrugada
As bandeiras do Brasil e do governo do estado foram hasteadas no Parque Alegria, no Complexo do Caju Foto: Domingos Peixoto / Agência O Globo
As bandeiras do Brasil e do governo do estado foram hasteadas no Parque Alegria, no Complexo do Caju Domingos Peixoto / Agência O Globo
RIO - As bandeiras do Brasil e do Rio de Janeiro foram hasteadas na manhã deste domingo no Parque Alegria, e marcam o início do processo de pacificação do Complexo do Caju e da Barreira do Vasco, em São Cristóvão. Um contêiner - que servirá como base provisória da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) - já foi instalado na região. A ocupação da região foi rápida e sem resistência de traficantes. A entrada das forças de segurança no complexo de favelas começou às 4h48m deste domingo. Vinte e cinco minutos depois, os policiais já estavam no interior das favelas. A ação transcorreu sem um disparo sequer. O clima é de aparente tranquilidade na região ocupada. Uma força-tarefa foi montada na Praça Futuro do Boa Esperança, onde aconteceu a cerimônia de hasteamento das bandeiras.
Segundo o secretário municipal de Conservação, Marcus Belchior, 80 agentes da RioLuz e da Comlurb estão no interior da favela fazendo a limpeza da área. Duas retroescavadeiras e caminhões estão sendo usados para recolher lixo e barricadas. Segundo ele, nesta segunda-feira a região vai receber uma espécie de “banho de loja”. Mais de 120 homens vão dar continuidade aos serviços essenciais nas comunidades. Apesar da presença da polícia, o clima na região já é diferente. Nesta manhã, crianças brincavam com cavalos do Regimento de Polícia Montada (RPMont) da PM. Agentes das corregedorias das polícias Civil e Militar também estão no local para receber denúncias sobre a atuação dos policiais durante a ocupação.
Até as 10h20m, cinco homens haviam sido detidos. Um "microondas" - estrutura, segundo os policiais, usada supostamente para queimar os rivais da facção que controlava o tráfico de drogas - foi encontrado em uma casa no alto da comunidade Vila dos Sonhos, no Complexo do Caju. Também foram encontrados material para endolação de drogas próximo a uma creche na Barreira do Vasco. No Parque Alegria, no Complexo do Caju, foram apreendidos frascos de lança-perfume, alguns coletes à prova de bala, rádios transmissores, pequena quantidade de maconha e crack, folhas de contabilidade do tráfico, além de uma réplica de fuzil feita em madeira. Os detidos e o material foram levados para a 17ª DP (São Cristóvão), onde estão concentradas as ocorrências registradas durante a ocupação.
De acordo com a polícia, 10 mandados de prisão e 19 de busca e apreensão obtidos na Justiça pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), do Ministério Público do Rio, estão sendo cumpridos nas comunidades ocupadas. O Disque-denúncia recebeu sete ligações até as 9h. A polícia recomenda que os moradores do Caju e Barreira do Vasco andem com documentos de identificação pessoal, já que podem ser parados em operações neste domingo.
O secretário de Segurança Pública, José Mariano Beltrame, afirmou que apesar da ocupação ter sido bem sucedida, o momento não é de comemoração. Em entrevista coletiva no Quartel Central da Polícia Militar, ele disse que desde o dia 14 de fevereiro - quando começou o cerco nas comunidades - 284 pessoas foram presas e 36 menores foram apreendidos.
— Não existe vitória. Vocês nunca vão me ver comemorando vitória. Porque o problema é muito antigo e muito sério, não vamos reverter isso na "segunda-feira". Segurança pública é um bem subjetivo, é uma conquista diária, é um sentimento — afirmou Beltrame.
Beltrame informou que o plano é que as UPPs cheguem à Baixada Fluminense e Niterói. No entanto, não informou prazos para que essas operações aconteçam:
— Não estamos fazendo um projeto para as Olimpíadas, Copa das Confederações. Estamos fazendo um programa para o cidadão fluminense. Se a população refletir, as pacificações não estão acontecendo por acaso, uma coisa é feita depois da outra. Existe sim um plano para a Baixada e Niterói. Mas não vou ser mercenário da ilusão de dizer que vamos fazer uma UPP nesses lugares na semana que vem.
Para o governador Sergio Cabral, a região ocupada neste domingo estava em decadência:
— A região necessitava da UPP para os moradores e até para o aspecto econômico. A área recolhe cerca de um bilhão em impostos por ano para a prefeitura, por causa das empresas que estão instaladas ali. É o renascimento de uma região. Estou muito feliz. Vi aquela área crescer com a violência. As famílias que lá residem vão viver um outro momento de vida.
Áreas estratégicas do Rio — as comunidades do Caju, cortadas por vias expressas como a Linha Vermelha e a Avenida Brasil, além de ser passagem obrigatória para o Aeroporto Internacional Tom Jobim rumo ao Centro e à Zona Sul — devem ganhar Unidades de Polícia Pacificadoras (UPPs), beneficiando aproximadamente 30 mil pessoas. Fuzileiros navais, policiais civis e militares usaram aparato cinematográfico na ação. Ao todo 17 veículos blindados da Marinha, com capacidade para até 25 pessoas cada, além de caveirões, retroescavadeiras e motocicletas deram apoio às forças de segurança. Três carros da Marinha estão na Barreira do Vasco, os demais no entorno do Complexo do Caju. Duzentos fuzileiros navais, 1.400 policiais do Batalhão de Operações Especiais (Bope), do Batalhão de Choque (BPChoq), cerca de 200 policiais civis, além de 150 agentes rodoviários federais atuam em conjunto. O hasteamento da bandeira nacional será às 10h, no Parque Alegria.
Desde a ocupação do Complexo do Alemão, em 2010, a Marinha dá suporte às policiais Militar e Civil na ocupação de favelas. A estratégia inicial foi cercar as favelas do Caju com os policiais do Batalhão de Choque, enquanto o Bope, com a ajuda de cães farejadores, buscam suspeitos. Apesar da tranquilidade, a Secretaria de Segurança recomenda que os moradores das comunidades da Barreira do Vasco e do Caju permaneçam em suas casas. No ar, helicópteros sobrevoam pontos estratégicos e, pelo Canal do Cunha, lanchas do Grupamento Aeromarítimo monitoram as margens ao longo das comunidades. Por volta das 5h30m, policiais do Bope removeram uma barreira colocada por traficantes na Rua Peter Lund, acesso ao Parque Alegria, no Caju. Com o auxílio de uma retroescavadeira, um enorme pedregulho foi retirado da entrada da favela.
Alheios ao enorme aparato montado pelo governo do estado, alguns moradores aos poucos saíam às ruas. Poucos se dispunham a falar com jornalistas. Numa próxima etapa, que deverá durar dois meses, as forças de segurança devem entrar aos poucos no Complexo da Maré, composto por 16 comunidades.
— Não tenho o que falar, não. Mas vai melhorar, a gente tem fé — disse um morador do Parque Alegria, sem se identificar.
Antes da ocupação, o secretário estadual de Segurança, José Mariano Beltrame, agradeceu o empenho de seus subordinados e afirmou que os moradores das favelas ocupadas poderão “dormir melhor” num futuro próximo:
— Vocês estão diminuindo áreas onde colegas de vocês muitas vezes foram mortos. Vocês poderão se dedicar cada vez mais a uma polícia cada vez mais legítima. Que a gente consiga ter, daqui a pouco, uma área distante do fuzil, distante dos tiros. Que a gente consiga fazer com que esse povo durma cada vez melhor. Deus esteja com todos nós.
Devido à ação neste domingo, a Linha Vermelha foi fechada às 4h, entre São Cristóvão e Ilha do Governador, incluindo as vias de acesso a este trecho, reabrindo por volta das 6h. O objetivo foi dar segurança aos motoristas durante a ação. Além de evitar que veículos fiquem no meio do fogo cruzado, caso houvesse confrontos.
Com a Linha Vermelha fechada, a alternativa para os motoristas foi pegar a Avenida Brasil, que não foi afetada pela operação. Enquanto as demais pistas estavam livres, a lateral no sentido Zona Oeste estava parcialmente fechada, para facilitar a movimentação dos policiais. Na altura da Ilha do Governador, o desvio do tráfego foi realizado pela Avenida Brigadeiro Trompowisk, seguindo pela Avenida Brasil em ambos os sentidos. Na altura da Linha Amarela, o desvio foi pela Avenida Bento Ribeiro Dantas, acessando a Linha Amarela e Avenida Brasil em ambos os sentidos. Já para quem seguia no sentido Baixada, os acessos à Linha Vermelha pelo Elevado Paulo de Frontin e pelo Elevado Professor Rufino Pizarro estavam fechados. O desvio de tráfego foi feito para as alças de acesso do Viaduto dos Fuzileiros e da Avenida Francisco Bicalho.
O projeto de pacificação, que começou em 2008, prevê levar segurança às áreas turísticas e aos trajetos que serão feitos por atletas e integrantes do Comitê Olímpico. Nesse planejamento, a Zona Sul, onde fica a maioria dos hotéis, já foi pacificada. As favelas da região do Maracanã, onde serão as festas de abertura e encerramento dos Jogos, também já ganharam Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs). Diante da lógica do cinturão olímpico, os próximos passos devem ser rumo à região de Deodoro, onde também serão realizadas competições.

Gaeco cumpre mandados contra traficantes do Complexo do Caju
O Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), do Ministério Público do Rio, obteve na Justiça a decretação da prisão temporária de dez traficantes de drogas do Parque Alegria, no Complexo do Caju. Dezenove mandados de busca e apreensão de armas, munições e veículos utilizados pelos criminosos também foram obtidos. Os mandados estão sendo cumpridos durante a ocupação das favelas do complexo para a implantação de Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs). Esta é a primeira vez que uma ação do Gaeco acontece durante a ocupação de uma comunidade. Estão sendo realizadas buscas no Caju, São Cristóvão, Costa Barros, Bonsucesso, Centro, Copacabana, Jacarepaguá, Nova Iguaçu, Duque de Caxias e Belford Roxo.
De acordo com o Gaeco, os pedidos de prisão tiveram por base uma investigação do Ministério Público originada pela 8ª Promotoria de Justiça de Investigação Penal, com o auxílio do GAECO. Os objetos da investigação eram o tráfico de drogas e a associação para o tráfico na região. O grupo também era responsável por roubo e furto de carros, porte ilegal de armas e homicídios.
“Só agora, com o esforço da pacificação e com a ocupação do território pelas forças de segurança, foi possível entrar nas comunidades para cumprir os mandados necessários contra os criminosos que atuam naquela área” - afirmou, em nota, o coordenador do Gaeco, promotor de Justiça Alexandre Themístocles.
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