2.17.2014

Sucessão de falhas nos trens reformados com contratos superfaturados provoca caos no metrô de São Paulo

A temível frota K

 Poucas vezes foi possível comprovar uma relação tão direta entre o desvio de recursos públicos e os prejuízos causados às pessoas

Fabíola Perez (fabiola.perez@istoe.com.br)

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O Centro de Controle Operacional do Metrô de São Paulo registrou uma falha sistema de fechamento de portas de um trem que saía da estação Bresser-Mooca e tinha como destino a estação Corinthians-Itaquera, ambas integrantes da Linha-3 Vermelha. O problema impediu que o veículo seguisse viagem com as portas fechadas, colocando em risco a segurança dos passageiros. No mesmo dia – e no mesmo trajeto – houve um defeito no sistema de tração e o trem passou a operar no modo manual, em que o limite de velocidade permitido é de 30 quilômetros por hora. As duas falhas fizeram com que na estação Tatuapé o trem fosse evacuado. A paralisação, que ocorreu por volta das 18 horas, durou 30 minutos, impediu a passagem de outras composições e gerou atrasos na rede inteira. O trem que apresentou problema é conhecido como K-07, o mesmo que descarrilou em agosto do ano passado. “O Metrô quer acobertar essas situações, mas o K-07 é o único trem que opera com um supervisor de maquinista”, diz um funcionário do Metrô paulista que não quis se identificar. “Isso é um absurdo. É como se eles reconhecessem os perigos que o K-07 oferece às pessoas.”

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O K-07 é um dos dez trens que integram a chamada frota K, que está no centro do caso de corrupção na área de transportes sobre trilhos paulista nas gestões de José Serra e Geraldo Alckmin. Como ISTOÉ revelou há dois anos, o Ministério Público investiga irregularidades nas reformas das composições da frota K. Ao contrário do argumento do Metrô de que os reparos seriam vantajosos por razões econômicas, constatou-se que os veículos foram renovados a preços mais altos do que o de um trem novo em folha. A modernização de 98 trens – incluindo os da frota K – das Linhas Azul e Vermelha foi orçada em R$ 1,6 bilhão. A conta final, porém, chegou a R$ 2,5 bilhões, o que representa um rombo de R$ 857 milhões aos cofres públicos. De acordo com a apuração do Ministério Público de São Paulo, dos 98 trens que precisavam ser reformados, somente 46 foram entregues. Hoje, restam 52 composições sem reforma, mas que permanecem em circulação.

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As falhas da frota K são o retrato pronto e acabado de como a corrupção é nefasta. Poucas vezes foi possível comprovar uma relação tão direta entre a malversação dos recursos públicos e os prejuízos causados às pessoas. Agora, dois dossiês obtidos com exclusividade por ISTOÉ junto ao Sindicato dos Metroviários revelam que, além de colocar em risco a vida de operadores e usuários, o lote de trens reformados pelo consórcio liderado pela Alston e investigado pelo Ministério Público causa um prejuízo anual de R$ 168 milhões ao governo de São Paulo. De acordo com o Sindicato dos Metroviários, os trens da temível frota K são obrigados a parar para fazer manutenção com frequência maior do que outras linhas, graças às recorrentes falhas. Isso gera danos aos usuários e perdas ao Erário. O último dossiê produzido pelo Sindicato dos Metroviários, entre outubro e novembro do ano passado, registrou 696 problemas somente nesse período em sete trens que haviam sido reformados. Desses, mais de 300 falhas ocorreram no trem K-07.

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O caso mais grave foi a pane que paralisou os trens da Linha-3 Vermelha no dia 4 de fevereiro. De acordo com um relatório produzido pela Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (Cipa), foram levantadas dez anormalidades técnicas nas composições, o que contraria a afirmação do secretário de Transportes Metropolitanos de São Paulo, Jurandir Fernandes, de que o tumulto teria sido causado por “grupos organizados” (ver quadro). “Os seguranças do Metrô relataram na reunião extraordinária que não viram ninguém com o rosto coberto ou pessoas envolvidas em atos de vandalismo que pudessem caracterizar grupos organizados”, disse à ISTOÉ um condutor da Linha Vermelha. Os perigos são imensos diante da quantidade de usuários da Linha 3 do Metrô. São aproximadamente 629 mil passageiros por dia. Para atender à forte demanda, os trens são colocados em circulação mesmo apresentando falhas graves. “Provar a eficiência dos trens se torna uma prioridade em detrimento da segurança das pessoas”, diz um funcionário do Metrô. O mesmo operador diz que os maquinistas foram impedidos de ter acesso aos softwares que registram as falhas técnicas. “É inadmissível uma sequência de falhas como as que foram vistas em um metrô moderno como o de São Paulo, que transporta milhões de usuários”, afirma Cláudio Weber Abramo, diretor-executivo da ONG Transparência Brasil.

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Procurado por ISTOÉ, o Metrô informou, por meio de sua assessoria de imprensa, que “todos os sistemas de metrô do mundo estão sujeitos a falhas e elas são proporcionais ao número de viagens realizadas, à quilometragem percorrida e à quantidade de passageiros”. A assessoria informou ainda que “os trens da frota K passam pelo mesmo processo de manutenção preventiva das demais frotas novas ou modernizadas. Essas frotas, que recentemente iniciaram sua operação, necessitam de um período de ajustes até que comecem a apresentar seu melhor desempenho”. O problema é que parte da frota K circula desde 2011.  

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FOTO: HÉLVIO ROMERO/AE
Foto: Eduardo Anizelli/Folhapress

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