Descobri que a melhor dieta para perder peso é se permitir o prazer de preparar a própria comida
FLÁVIA YURI OSHIMA
No ano passado, decidi, pela primeira vez, fazer uma dieta para
emagrecer. Passei seis meses acima do peso, tentando domá-lo com os
truques que sempre funcionaram comigo: brecar o doce durante a semana,
me afastar de frituras e de pão francês com manteiga e dar um tempo nos
queijos em dias úteis. Não adiantou. Passei, então, mais alguns meses
pesquisando o que faria para voltar a entrar nas minhas calças jeans.
Estava cinco quilos acima do que considero normal para mim. Tenho 1,56
metro. Cinco quilos são uma imensidão em medidas extras para alguém do
meu tamanho.
Saí de férias com três livros sobre nutrição e dietas. Fui para os
Estados Unidos. Enquanto devorava bagels e frappuccinos (como
despedida), encarei os textos que me livrariam do peso extra. Esbocei
meu plano de ataque e voltei ao Brasil disposta a chegar ao verão magra
(isso foi em julho do ano passado).Minha dieta era baseada em alimentos naturais: carnes, vegetais, legumes, frutas, cereais. Adoro comer carnes de todos os tipos (corrigindo: todos os tipos à venda em supermercados brasileiros). E adoro saladas e frutas. Seria fichinha. No início da segunda semana, percebi que estava enganada. Como queria emagrecer, tinha de maneirar nas frutas. E aí as opções diminuíram. Não dá para comer grelhado com folhas o tempo todo.
Ocorre que em meu planejamento adquiri dois livros de receita que davam dicas gostosas e não engordativas para levar a vida de quero-ser-magra sem morrer de tédio e frustração. Ocorre que não são receitas para toda a família. Não dava para entregar as instruções para a babá das crianças (ela me demitiria se tivesse de cozinhar dois tipos de comida todos os dias). Ocorre que tinha de arregaçar as mangas.
Pela primeira vez na vida faria o que não julgava possível: cozinhar o que comeria no almoço e no jantar. Tenho a facilidade de morar perto do meu trabalho (Deus seja louvado). O planejamento do cardápio da semana começava no domingo, na hora de ir ao mercado. Quando saía de casa pela manhã, já sabia o que ia almoçar e deixava as coisas ajeitadas (carne descongelada, tempero picado, lentilha de molho etc). À noite, cozinhava com mais vagar, enquanto as crianças, devidamente alimentadas, me contavam as novidades daquele dia. Misturava macarrão de konhaco com shoyu e cebolinha, missoshiro, fritada de legumes -- o que me desse vontade. E passei a ter pelo menos uma (muitas vezes, duas) opções de sobremesa magra na geladeira. Coisa que nunca me importei em fazer fora da dieta. Comecei como o pessoal do AA: vivendo um dia de cada vez, na base do só por hoje não para algumas coisas e só por hoje sim para outras. Se parasse para pensar, desistiria.
Fiquei nessa toada por quatro meses. Com furos, claro. Comia no trabalho por conta da pressa ou encarava almoços de trabalho uma ou duas vezes na semana. Nessas horas, o grelhado com folhas e vegetais me mantinha na linha. Às vezes, me lembrava, no meio do dia, do vidrinho de ovas lacrado na dispensa, que poria em cima do peixe que assaria enquanto estivesse no banho. Voltava para casa animada para ir ao fogão.
Dos cinco quilos que tinha de perder, perdi seis (dois já voltaram, mas estamos no inverno e também sou filha de Deus). Tão bom quanto voltar a entrar nas minhas calças foi descobrir essa possibilidade: preparar minha refeição, com pitacos de pequenas invencionices improvisadas, em pleno meio da semana, com o planeta rodando, sem que isso se torne uma tarefa hercúlea.
Preparar a minha comida foi tão importante quanto o que comi para emagrecer. O prazer de mexer nas minhas panelas, antes confinado a finais de semana (e ao quando dava), me deu boa parte da satisfação que buscava na comida quando queria repetir a lasanha de funghi sem estar mesmo com fome. Ou de quando pegava o pote de sorvete de café na geladeira antes de dormir e exagerava.
Morei sozinha por muitos anos antes de me casar. E quando queria cozinhar chamava amigos para participar. Nunca encarei cozinhar só para mim. É engraçado. Agora que tenho minha família para alimentar, assumir o fogão em causa própria se tornou um tipo de tratamento individual que esvazia vários dos impulsos que me levam a exagerar, comer sem fome ou comer errado. Essa mudança me permitiu voltar aos pequenos prazeres do dia a dia. Agora no inverno, como chocolate com vinho tinto de sobremesa todos os dias sem culpa. No verão, tentarei perder os dois quilos que voltaram. Mas lá será outra estação, com outro cardápio, mais leve, que pode ser tão saboroso quanto o de agora. E, o mais importante: preparado pela mesma chef.
Nenhum comentário:
Postar um comentário