A
iniciação sexual é algo cada vez mais discutido na atualidade. Isto
porque, numa cultura apegada ao sexo como a nossa, jovens precocemente
iniciam suas vidas sexuais sem os devidos cuidados, para que essa
prazerosa atividade não se torne danosa no futuro. No entanto, fugindo
dessa batida discussão em torno da “primeira vez juvenil” há outro perigo propagado pela “cultura das novinhas”.
Com letras que incitam a sexualidade de crianças e adolescentes, certas
canções não só apelam para que a juventude erroneamente se enverede
pelos caminhos do sexo descabido, como também difundem inconscientemente
a ideia do sexo com prazo de validade. Em outras palavras, a nossa
sociedade abraça, aceita, curti e compartilha jovens se exibindo em
danças ousadas e repudia, por outro lado, indivíduos maduros, velhos ou
fora dos padrões sexuais vigentes, de declararem suas fantasias sexuais.
Isso se dá através da validação do prazer baseado na faixa etária do
indivíduo. Como se a idade fosse um empecilho na busca pelo êxtase.
O
fetiche pela juventude não é recente e perpassa vários momentos da
história humana. Jovens donzelas serviam como concubinas a imperadores,
rapazes como acompanhantes de grandes sábios, estes são alguns dos
exemplos do desejo humano por jovens ao longo do tempo. E isso não tem
mudado muito. A saudosa época em que “panela velha é que faz comida boa”
já não existe mais. Hoje os recipientes são menos usados, ou melhor,
muitas vezes intactos. Meninos e meninas, nesse sentido, se tornaram
símbolos de prazer, vigor e sexualidade, como se a realização sexual
tivesse hora para começar e se encerrasse na vida madura. Essa inversão é
sentida na plastificação da idade em cirurgias, fotoshops, botox, nas
mulheres. E, em alguns homens, além de tudo isso, a procura pela
musculatura perfeita tem mudado a postura masculina na sociedade. Tudo
isso seria válido se a intenção fosse apenas retardar o tempo,
entretanto, a verdade ultrapassa essa questão: é a necessidade de se
sentir jovem e desejado sexualmente nessa sociedade que fala muito em
pedofilia, mas, na prática comete atos pedófilos “inconscientemente”
contra si e contra o outrem.
O fenômeno das “novinhas”
evidencia essa mudança de paradigmas. De norte a sul do Brasil, seja no
funk carioca ou no forró do nordeste, as músicas em torno dessa questão
se popularizaram, conquistando públicos de perfis diversos. Nas letras
há uma espécie de transgressão juvenil e, ao mesmo tempo, a evocação de
uma sexualidade que, na prática, já era conhecida por todos. São meninas
“que descem, descem, descem, gostam de ir até o chão”, que se amarram numa balada, beijo na boca, roupa sinuosa e ainda fazem “carinhas de safada” para demonstrar que já estão prontas para o acasalamento. Elas, nesse sentido, já foram rotuladas de tudo, de “broto legal”, “cachorra” a “potranca”, passando pela impronunciável “tchutchuca” e chegando hoje ao rótulo de “novinha”.
Nominalizações não faltam, mas o foco continua o mesmo: exaltar a
sexualidade entre adolescentes cada vez mais imaturos quanto ao sexo,
sobretudo numa sociedade recalcada a respeito desse assunto.
E
essa cultura não se limita apenas ao universo musical. Na mídia
televisiva ela se manifesta nos beijos ardentes entre adolescentes, nas
cenas picantes das novelas, nos filmes que exibem “noviças rebeldes”
aflorando sua sexualidade. Sem contar a exaltação da beleza feminina e a
sua constante busca pelo congelamento do tempo. Mais jovens, lindas,
turbinadas e siliconadas, artistas diversos influenciam jovens a
valorizar doentiamente o seu estereótipo físico, pautado, sobretudo, na
sensualidade que os corpos possam demonstrar. Por isso que ser jovem tem
ganhado tanto “status”,
pois o viço dessa época aguça a pedofilia existente na nossa cultura e
renega a maturidade o sexo ligado à procriação, não ao prazer. Essa
paradoxal construção das práticas sexuais se dá ainda por causa dos
tabus ancestrais que enegrecem as discussões em torno do sexo. Falar
dele em casa, na escola, não é tão comum e quando ocorre é feito de
forma ensaiada, sem a naturalidade necessária para que este tema seja
discutido. Por isso que a massa pueril encontra na rua os apelos sexuais
ausentes na sua rotina diária e os encontram da pior forma possível, em
destaque para as mulheres.
Então, é por isso que “novinhas” e não “novinhos?”.
A questão do gênero ai se explica porque desde cedo o homem é educado
(quase que obrigado, em alguns casos) a iniciar os fulgores sexuais,
geralmente na adolescência. Nesse período, o destaque vai para a
masturbação, muito comum e aceita pela nossa sociedade, que restringe o
prazer ao lado masculino da questão. Enquanto isso, as meninas sofrem
por não serem preparadas devidamente a uma vida sexual, a qual a
autonomia do seu corpo e o reconhecimento deste esteja presente nas
discussões, desde a masturbação, passando pelo primeiro contato sexual
delas, doenças, gravidez e aborto. Por causa dessa educação submissa, a
nossa sociedade acaba se surpreendendo quando elas denotam, de alguma
forma, que sentem prazer e que tem vontade de fazer sexo.
Despreparadas, elas querem dar “dá, dá, dá, dá, dá, dá, dá, dá, dá, dá”,
para provar a sociedade machista que elas são tão machos que muitos
homens quando o assunto é sexo, mesmo correndo o risco de serem chamadas
de putas, vadias ou famosas “piriguetes”.
Dessa
atmosfera que cheira a sexo, o resultado não poderia ser mais nocivo.
Em todo o país é comum encontrar meninas entre 12, 13, 14 e 15 anos
grávidas ou mães de mais de uma criança. Entre os meninos ocorre algo
semelhante, porém no caso deles o agravante se dá através das infecções
sexualmente transmissíveis. Como são educados a iniciar uma vida sexual
bem antes delas, os garotos, afobados com a hormonização da idade, não
usam devidamente os meios contraceptivos, principalmente a caminha e
acabam dessa forma contraindo e pegando doenças sérias e, muitas vezes,
até a AIDS. Todos esses problemas ocorrem porque as questões ligadas a
sexo não são tratadas com naturalidade pela sociedade, seja por uma
questão patriarcal, e/ou por imposição religiosa. No primeiro caso, a
figura do homem é alçada a altíssimos patamares no ato sexual, desde o
orgasmo às posições que o favoreçam na cama. Já no segundo caso, o
discurso pecaminoso de algumas instituições religiosas acaba limitando
os prazeres humanos, obrigando, por assim dizer, uma possível
transgressão. Em ambos, lamentavelmente a mulher ainda é a parte
secundária, mesmo que isso esteja finalmente mudando.
É
por essa razão que elas se tornaram o principal alvo da cultura do
sexo. Em gaiolas, popozudas ou em bondes, elas rebolam, quebram e
requebram os corpos em acasalamentos em forma de dança, aguçando uma
precoce sexualidade nos jovens e, discriminando outras faixas etárias.
Elas são melão, melancia e uma infinidade de outras frutas. São cada vez
mais novas, esculturais, difundido um ideal de idade e beleza quase
incorpóreo. Longe disso, muitas meninas, adolescentes e mulheres sonham
em ser a “panicat”
do momento, pois, impedidas de sentir prazer, de serem sensuais e
desejadas, acabam rompendo as barreiras do preconceito da pior forma
possível. Disso tudo resvala na coisificação do sexo, limitando-o ao
universo viçoso juvenil. Logo, não só a questão do gênero fica
prejudicada, mas também a validação do prazer seguro e responsável, com
direito a tudo, desde “ralar a tcheca no chão” a fazer o sexo “daquele jeito”.
Também pode transar na adolescência, até porque é nessa época onde as
descobertas sobre o corpo dos jovens são feitas e não há nada que possa
impedi-los disso. No entanto, tudo isso deve e precisa ser feito com
maturidade, começando com debates sérios sobre sexo, sem psicologismos
desnecessários ou regras ultrapassadas. Para falar “na real”
é preciso apenas contar o sexo real, aquele que acontece na
adolescência e deve perdurar até o fim da vida, pois, quando o assunto é
prazer, tudo mundo canta a mesma música: “eu adoro, eu me amarro”.
Blog Sociedade Anônima
cimitan@terra.com.br
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Um comentário:
a verdade que ninguém quer comentar, principalmente que compete a todos, desde os adolescentes que não tem consciência do agora, e dos adultos e velhos, que aproveitam e querem realizar seus desejos sexuais
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