por ALLAN KARDEC – tradução de José Herculano Pires
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– A prece é uma invocação: por ela nos pomos em relação mental com o
ser a que nos dirigimos. Ela pode ter por objeto um pedido, um
agradecimento ou um louvor. Podemos orar por nós mesmos ou pelos outros,
pelos vivos ou pelos mortos. As preces dirigidas a Deus são ouvidas
pelos Espíritos encarregados da execução dos seus desígnios; as que são
dirigidas aos Bons Espíritos vão também para Deus. Quando oramos para
outros seres, e não para Deus, aqueles nos servem apenas de
intermediários, de intercessores, porque nada pode ser feito sem à
vontade de Deus.
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– O Espiritismo nos faz compreender a ação da prece, ao explicar a
forma de transmissão do pensamento, seja quando o ser a quem oramos
atende ao nosso apelo, seja quando o nosso pensamento eleva-se a ele.
Para se compreender o que ocorre nesse caso, é necessário imaginar os
seres, encarnados e desencarnados, mergulhados no fluido universal que
preenche o espaço, assim como na Terra estamos envolvidos pela
atmosfera. Esse fluido é impulsionado pela vontade, pois é o veículo do
pensamento, como o ar é o veículo do som, com a diferença de que as
vibrações do ar são circunscritas, enquanto as do fluido universal se
ampliam ao infinito. Quando, pois, o pensamento se dirige para algum
ser, na terra ou no espaço, de encarnado para desencarnado, ou
vice-versa, uma corrente fluídica se estabelece de um a outro,
transmitindo o pensamento, como o ar transmite o som.
A
energia da corrente está na razão direta da energia do pensamento e da
vontade. É assim que a prece é ouvida pelos Espíritos, onde quer que
eles se encontrem, assim que os Espíritos se comunicam entre si, que nos
transmitem as suas inspirações, e que as relações se estabelecem à
distância entre os próprios encarnados.
Esta
explicação se dirige sobretudo aos que não compreendem a utilidade da
prece puramente mística. Não tem por fim materializar a prece, mas
tornar compreensíveis os seus efeitos, ao mostrar que ela pode exercer
ação direta e positiva. Nem por isso está menos sujeita à vontade de
Deus, juiz supremo em todas as coisas, e único que pode dar eficácia à
sua ação.
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– Pela prece, o homem atrai o concurso dos Bons Espíritos, que o vêm
sustentar nas suas boas resoluções e inspirar-lhe bons pensamentos. Ele
adquire assim a força moral necessária para vencer as dificuldades e
voltar ao caminho reto, quando dele se afastou; e assim também podem
desviar de si os males que atrairia pelas suas próprias faltas. Um
homem, por exemplo, sente a sua saúde arruinada pelos excessos que
cometeu, e arrasta, até o fim dos seus dias, uma vida de sofrimento. Tem
o direito de queixar-se, se não conseguir a cura? Não, porque poderia
encontrar na prece a força para resistir às tentações.
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– Se dividirmos os males da vida em duas categorias, sendo uma a dos
que o homem não pode evitar, e outra a das atribuições que ele mesmo
provoca, por sua incúria e pelos seus excessos. (Ver cap. V, nº 4),
veremos que esta última é muito mais numerosa que a primeira. Torna-se
pois evidente que o homem é o autor da maioria das suas aflições, e que
poderia poupar-se, se agisse sempre com sabedoria e prudência.
É
certo, também, que essas misérias resultam das nossas infrações às leis
de Deus, e que, se as observássemos rigorosamente, seríamos
perfeitamente felizes. Se não ultrapassássemos os limites do necessário,
na satisfação das nossas exigências vitais, não sofreríamos as doenças
que são provocadas pelos excessos, e as vicissitudes decorrentes dessas
doenças. Se limitássemos as nossas ambições, não temeríamos a ruína. Se
não quiséssemos subir mais alto do que podemos, não recearíamos a queda.
Se fossemos humildes, não sofreríamos as decepções do orgulho abatido.
Se praticássemos a lei de caridade, não seríamos maledicentes, nem
invejosos, nem ciumentos, e evitaríamos as querelas e as dissensões. Se
não fizéssemos nenhum mal a ninguém, não teríamos de temer as vinganças,
e assim por diante.
Admitamos
que o homem nada pudesse fazer contra os outros males; que todas as
preces fossem inúteis para livrar-se deles; já não seria muito, poder
afastar todos os que decorrem da sua própria conduta? Pois bem: neste
caso concebe-se facilmente a ação da prece, que tem por fim atrair a
inspiração salutar dos Bons Espíritos, pedir-lhes a força necessária
para resistirmos aos maus pensamentos, cuja execução pode nos ser
funesta. E, para nos atenderem nisto, não é o mal que eles afastam
de nós, mas é a nós que eles afastam do pensamento que nos pode causar o
mal; não embaraçam em nada os desígnios de Deus, nem suspendem o curso
das leis naturais, mas é a nós que impedem de infringirmos as leis, ao
orientarem o nosso livre arbítrio. Mas o fazem sem o perceberem, de
maneira oculta, para não prejudicarem a nossa vontade. O homem se
encontra então na posição de quem solicita bons conselhos e os segue,
mas conservando a liberdade de segui-los ou não. Deus quer que assim
seja, para que ele tenha a responsabilidade dos seus atos e para lhe
deixar o mérito da escolha entre o bem e o mal. É isso o que o homem
sempre receberá, se pedir com fervor, e ao que se podem sobretudo
aplicar estas palavras: “Pedi e obtereis”.
A
eficácia da prece, mesmo reduzida a essas proporções, não daria imenso
resultado? Estava reservado ao Espiritismo provar a sua ação, pela
revelação das relações entre o mundo corpóreo e o mundo espiritual. Mas
não se limitam a isso os seus efeitos. A prece é recomendada por todos
os Espíritos. Renunciar a ela é ignorar a bondade de Deus; é rejeitar
para si mesmo a sua assistência; e para os outros, o bem que se poderia
fazer.
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– Ao atender o pedido que lhe é dirigido, Deus tem freqüentemente em
vista recompensar a intenção, o devotamento e a fé daquele que ora. Eis
porque a prece do homem de bem tem mais merecimento aos olhos de Deus, e
sempre maior eficácia. Porque o homem vicioso e mau não pode orar com o
fervor e a confiança que só o sentimento da verdadeira piedade pode
dar. Do coração do egoísta, daquele que só ora com os lábios, não
poderiam sair mais do que palavras, e nunca os impulsos da caridade, que
dão à prece toda a sua força. Compreende-se isso tão bem que,
instintivamente, preferimos recomendar-nos às preces daqueles cuja
conduta nos parece que deve agradar a Deus, pois que são melhores
escutados.
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– Se a prece exerce uma espécie de ação magnética, podemos supor que o
seu efeito estivesse subordinado à potência fluídica. Entretanto, não é
assim. Desde que os Espíritos exercem esta ação sobre os homens, eles
suprem, quando necessário, a insuficiência daquele que ora, seja através
de uma ação direta em seu nome, seja ao lhe conferirem
momentaneamente uma força excepcional, quando ele for julgado digno
desse benefício ou quando isso possa ser útil.
O
homem que não se julga suficientemente bom para exercer uma influência
salutar, não deve deixar de orar por outro, por pensar que não é digno
de ser ouvido. A consciência de sua inferioridade é uma prova de
humildade, sempre agradável a Deus, que leva em conta a sua intenção
caridosa. Seu fervor e sua confiança em Deus constituem o primeiro passo
do seu retorno ao bem, que os Bons Espíritos se sentem felizes de
estimular. A prece que é repelida é a do orgulhoso, que só tem fé no seu poder e nos seus méritos, e julga poder substituir-se à vontade do Eterno.
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– O poder da prece está no pensamento, e não depende nem das palavras,
nem do lugar, nem do momento em que é feita. Pode-se, pois, orar em
qualquer hora, a sós ou em conjunto. A influência do lugar ou do tempo
depende das circunstâncias que possam favorecer o recolhimento. A
prece em comum tem ação mais poderosa, quando todos os que a fazem se
associam de coração num mesmo pensamento e têm a mesma finalidade,
porque então é como se muitos clamassem juntos e em uníssono. Mas que
importaria estarem reunidos em grande número, se cada qual agisse
isoladamente e por sua própria conta? Cem pessoas reunidas podem orar
como egoístas, enquanto duas ou três, ligadas por uma aspiração comum,
orarão como verdadeiros irmãos em Deus, e sua prece terá mais força do
que a daquelas cem. (Ver cap. XXVIII, nº 4 e 5 ).
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