4.16.2010

TECNOLOGIAS UTILIZADAS PARA PROLONGAR A LIBERAÇÃO DE FÁRMACOS, ENSAIOS DE DISSOLUÇÃO E FFSO DISPONÍVEL NO MERCADO


As formas farmacêuticas sólidas orais (FFSO) de liberação prolongada caracterizam-se pela liberação gradual do fármaco e manutenção da sua concentração plasmática em níveis terapêuticos, durante um período de tempo prolongado.


Sistemas matriciais

As matrizes são dispersões ou soluções de um
fármaco em uma ou mais substâncias capazes de modular
a sua liberação, geralmente polímeros de natureza
hidrofílica ou inerte (Costa, Lobo, 1999; Colombo et al.,
2000; Qiu, Zhang, 2000; Charman, Charman, 2002). Essas
matrizes podem ser elaboradas sob as formas de comprimidos, cápsulas gelatinosas,
grânulos, péletes ou minicomprimidos.

Nos sistemas matriciais, a liberação do fármaco pode
envolver processos de intumescimento do polímero, difusão
do fármaco e erosão da matriz.

Em alguns casos, o fármaco pode estar ligado quimicamente à cadeia
polimérica e ser liberado pela quebra hidrolítica ou
enzimática dessa ligação. Um ou mais desses processos
podem regular a liberação em uma mesma FFSO, dependendo
do tipo de polímero empregado e das propriedades
físico-químicas do fármaco (Khan, 2001; Charman,
Charman, 2002; Kumar, Domb, 2004).

Nas matrizes insolúveis, constituídas por ceras (nesse
caso, também denominadas matrizes hidrofóbicas) ou
polímeros insolúveis em água (nesse caso, também denominadas
matrizes inertes), o fármaco é liberado essencialmente
por difusão (para matrizes hidrofóbicas, pode haver um mecanismo de erosão associado). Em decorrência de sua insolubilidade, a matriz ou
parte dela pode ser eliminada nas fezes, mas isso não
significa que não houve liberação total do fármaco no TGI
(Kumar, Domb, 2004; Collett, Moreton, 2005; Lopes,
Lobo, Costa, 2005).

Nas matrizes hidrofílicas, a liberação é regulada
pelos processos de intumescimento, difusão e erosão
(Bettini et al., 2001). Quando a FF entra em contato com
os fluidos gastrintestinais, o polímero na sua superfície é
hidratado e intumesce, formando uma camada gelificada.

A camada gelificada é posteriormente dissolvida, promovendo
a erosão do comprimido. Outras camadas de gel são
formadas e dissolvidas sucessivamente na superfície da FF.

O fármaco é liberado por difusão através dessas camadas
gelificadas e/ou erosão da matriz, como representado na
Figura 2 (Costa, Lobo, 1999; Colombo et al., 2000;
Collett, Moreton, 2005; Lopes, Lobo, Costa, 2005).

Sistemas reservatório

Nestes sistemas, um reservatório (núcleo) contendo
o fármaco é revestido por uma membrana polimérica. O
núcleo pode ser um comprimido, um grânulo, um pélete ou um minicomprimido.
O fármaco é liberado por difusão através da membrana de
revestimento, que pode ser microporosa ou não apresentar
poros (Qiu, Zhang, 2000; Kumar, Domb, 2004; Vernon,
Wegner, 2004; Collett, Moreton, 2005).

Quando uma membrana não-porosa é utilizada, a liberação é
governada pela difusão da substância ativa através do polímero e,
assim,pode ser modulada pela seleção de um polímero no qual ela
apresente a difusividade adequada. No caso de membranas
microporosas, a difusão do fármaco no meio que estiver
preenchendo os poros (em FFSO, fluidos gastrintestinais)
determinará o processo de liberação (Kumar, Domb, 2004).

Outra forma de se obter liberação prolongada mediante
o uso de um sistema de reservatório é preparar uma
FFSO que contenha camadas alternadas de ativo e de um
polímero hidrossolúvel. O fármaco será liberado gradualmente à medida que cada camada de polímero dissolver, sendo que a velocidade do processo estará condicionada
pela velocidade de dissolução do filme polimérico e dependerá
da sua espessura e do tipo de polímero empregado
(Kumar, Domb, 2004).
.

Matriz insolúvel: após a administração, a água presente nos fluidos do TGI penetra na FF e dissolve o fármaco. Como conseqüência, são formados canais na estrutura da matriz, através dos quais o fármaco é gradualmente liberado por difusão.
494 B. R. Pezzini, M. A. S. Silva, H. G. Ferraz

Bombas osmóticas

Bombas osmóticas são sistemas que utilizam pressão
osmótica para modular a liberação do fármaco. A FF é
constituída por um núcleo (comprimido, cápsula gelatinosa
dura ou mole) revestido com uma membrana semipermeável,
que possui um orifício feito a laser.
O núcleo contém um agente osmótico, que pode ser a substância ativa ou
outro material. Após a administração da FF, o solvente
penetra no núcleo (atraído pelo agente osmótico), aumentando
a pressão interna, o que resulta na liberação do
fármaco dissolvido ou disperso, através do orifício na
membrana (Santus, Baker, 1995; Verma, Krishna, Garg,
2002; Wong, Gupta, Stewart, 2002; Kumar, Domb, 2004;
Vernon, Wegner, 2004).

Alguns sistemas osmóticos possuem dois compartimentos:
um contém a substância ativa e outro um polímero
hidrofílico (agente osmótico). Quando o solvente penetra na
FF, o polímero é hidratado e intumesce, impulsionando o
fármaco junto com o solvente para fora, através do orifício
no revestimento. Esses sistemas são chamados de “pushpull”
e estão representados na Figura 4 (Santus, Baker,
1995; Venkatraman et al., 2000; Verma, Krishna, Garg,
2002; Wong, Gupta, Stewart, 2002).


ENSAIOS DE DISSOLUÇÃO DE FFSO DE LIBERAÇÃO PROLONGADA

Atualmente, na Farmacopéia Americana, são descritos
7 aparatos para a avaliação das características de dissolução
de FF. Os aparatos 1 e 2 são clássicos para a análise
de FFSO e devem ser utilizados, a menos que haja uma
razão que justifique a adoção de outra metodologia. Os
aparatos 5, 6 e 7 são empregados principalmente para a
avaliação de sistemas transdérmicos (Jorgensen, Bhagwat,
1998; USP 28, 2005).

Os aparatos 3 (cilindros recíprocos ou Bio-Dis) e 4
(“Flow-through cell”) são próprios para FFSO de liberação
prolongada, sendo a sua utilização justificada em decorrência
da maior dificuldade de predição do desempenho
“in vivo” de tais produtos, por meio do ensaio de dissolução,
comparados às FFSO convencionais (Jorgensen,
Bhagwat, 1998). Isso ocorre porque as FFSO de liberação
prolongada são sistemas complexos, que utilizam mecanismos
distintos para modular a dissolução do fármaco e permanecem
no lúmen gastrintestinal por mais tempo que as
formas convencionais (que desagregam rapidamente em
meio aquoso), tornando-se mais suscetíveis às condições de
pH, força iônica, viscosidade, composição e motilidade do
TGI (Borst, Ugwu, Beckett, 1997; Mu, Tobyn, Staniforth,
2003; Ribeiro, Ferreira, Veiga, 2005).
Considerando a importância de uma adequada avaliação
de FFSO quanto às características de dissolução “in
vitro”, destaca-se a aplicação do aparato 3, uma vez que
existem evidências na literatura de que oferece vantagens
sobre os aparatos 1 e 2, na avaliação de sistemas de liberação
prolongada (Borst, Ugwu, Beckett, 1997; Jorgensen,
Bhagwat, 1998).
O aparato 3 possui um banho de aquecimento, no
qual as cubas de dissolução são dispostas em fileiras. As
cubas, de formato cilíndrico e fundo chato, possuem capacidade
de 300 mL e são denominadas cilindros externos.
Cada unidade da FF é inserida em um cilindro de vidro
(cilindro interno), que contém uma malha de abertura definida
em cada uma das extremidades. Os cilindros internos,
contendo o produto, são montados em hastes que fazem
movimentos de imersão e emersão dentro das cubas
(movimento recíproco), durante o ensaio. Cada fileira horizontal
de cubas é preenchida com um meio de dissolução
distinto, considerando-se os valores de pH ao longo do TGI
(Borst, Ugwu, Beckett, 1997; Yu, Wang, Hussain, 2002).
O equipamento é programado de modo que os cilindros
internos permaneçam durante um determinado período
na primeira fileira de cubas. Depois, as hastes elevam-se,
permanecem sobre as cubas por alguns segundos para que
o meio de dissolução escorra e movem-se para a fileira
posterior, contendo um meio com pH diferente. Esse processo
se repete até que todas as fileiras de cubas contendo
os meios de dissolução sejam percorridas pelas unidades da
FF. Os tempos durante os quais os cilindros permanecem
nas cubas são programados respeitando-se as condições
fisiológicas. Dessa forma, a passagem do produto pelo TGI
é simulada (Borst, Ugwu, Beckett, 1997).
São realizadas coletas de amostras ao longo do ensaio
para a quantificação do fármaco e os perfis de dissolução
são traçados após se calcular o porcentual de
fármaco dissolvido cumulativo. Assim, o porcentual de
fármaco dissolvido ao final do ensaio corresponde à soma
dos porcentuais quantificados em todas as cubas percorridas
pela FF. Uma vantagem operacional do aparato 3 é que
dispensa a desgaseificação do meio de dissolução, uma vez
que foi demonstrado que os resultados não são influenciados
pela presença de bolhas de ar, dada a hidrodinâmica do
sistema (Jorgensen, Bhagwat, 1998).

FFSO DE LIBERAÇÃO PROLONGADA
DISPONÍVEIS NO MERCADO BRASILEIRO
Alguns exemplos de produtos disponíveis no mercado
brasileiro são apresentados na Tabela IV. Como se pode
observar, as FFSO de liberação prolongada possuem elevada
aplicabilidade, uma vez que podem ser desenvolvidas
para classes farmacológicas distintas (anti-hipertensivos,
antidepressivos, antiinflamatórios não-esteróides,
hipoglicemiantes, entre outras), empregando-se fármacos
com diferentes propriedades biofarmacotécnicas (solúveis,
como o cloridrato de diltiazem e o cloridrato de
propranolol, ou praticamente insolúveis, como a gliclazida
e o nifedipino) e, ainda, diferentes dosagens (baixas, como
o maleato de dexclorfeniramina e o tartarato de tolterodina,
ou altas, como o bezafibrato e a carbamazepina).

Fonte/autores:
Bianca Ramos Pezzini1*,
Marcos Antônio Segatto Silva2,
Humberto Gomes Ferraz3

2 comentários:

GLAUCIANE SILVEIRA DOS SANTOS disse...

Adorei seu blog.Sou farmacêutica e gostei bastante dos seus posts.

Antonio Celso da Costa Brandão disse...

Obrigado pela iniciativa de externar os elogios ao "boaspraticasfarmaceuticas"
abs
Antonio Brandão