Língua Portuguesa
Quase todos acham que cometer erros de grafia é o fim do mundo, um sinal de ignorância. Mas não são erros mais graves do que outros (os contábeis, principalmente). Além disso, em geral, esses erros são excelentes pistas para aprender sobre a língua e sobre o sistema de escrita.
Primeiro, o sistema de escrita: a chamada escrita alfabética não é nem fonética (um símbolo para cada som) nem fonológica (um símbolo para cada fonema). Em uma escrita fonética, “tio” teria tantas grafia quantas fossem as pronúncias ([t] ou [tch] no começo, [o] ou [u] no final, fora os sons intermediários). Uma escrita fonológica implicaria que escrevêssemos /caza/ (ou /kaza/) em vez de “casa” e /sinema/ em vez de “cinema”.
A escrita fonética de “final” seria [final] ou [finau] (ou [finaw]), conforme a pronúncia, mas a fonêmica seria sempre /final/ (como prova o “l” em “finalidade”).
E como escreveríamos “peixe”? Foneticamente, [pexe] ou [peixe] (ou [peyxe] – estou sem um bom símbolo para o som que escrevemos com “x” ou “ch”). Fonemicamente? Hoje, /peixe/. No futuro, quem sabe seja /pexe/.
Crianças aprendendo a escrever, adultos com pouca escolaridade ou prática e cronistas anteriores às leis ortográficas fazem, todos, o mesmo tipo de escolhas. Digamos, para simplificar, que cometem os mesmos tipos de “erros”. Empregam grafias diversas e juntam palavras que os mais experientes (ou os mais recentes) separam.
Analistas apressados podem chegar a diagnósticos severos (por exemplo, de dislexia) em relação a esses escreventes. Mas, de fato, trata-se apenas de: a) instabilidade do sistema ortográfico (casa / caza; borracha / borraxa); b) de grafias baseadas na pronúncia, que é variável (menino / mininu), em hipercorreção (se “peixe”, por que não “badeija”; se “menino”, porque não “menistro”; se “final”, porque não “degral”?). Para um aprendiz, convenhamos, não é nenhum desastre.
Um aluno que comete estes erros, evidentemente comete erros. Afinal, a grafia correta está definida em lei! Mas seus erros não são devidos à falta atenção ou a algum tipo de déficit cognitivo. Podem, ao contrário, ser resultado de hipóteses inteligentes, embora erradas, e de generalizações que não deveriam fazer, mas que, na fase de aprendizagem em que estão, são comuns e demonstram independência intelectual e inventividade.
Em um texto famoso de Mattoso Câmara sobre o assunto, uma análise chama particular atenção. O lingüista encontrou diversas grafias para a palavra “silvou” (no ditado de “a serpente silvou”). Elas são devidas especialmente à instabilidade do “l” em sua relação com “u” em final de sílaba e de “u” em sua relação com “o” em posição átona: silvou, silvol, siuvou, siovol etc. A pronúncia é sempre a mesma, é importante observar.
O caso mais interessante é silivou. Diz Mattoso Câmara que o acréscimo de “i” depois de “l” é uma manobra do aluno (de 12 anos !!!) para manter o “l”. Sua explicação: como já que o “l” flutua em final de sílaba (é pronunciado [l] ou [u]), mas é fixo no começo, ao colocar uma vogal depois dele, o aluno garante que o “l” esteja em começo de silaba e, assim, não se vocalize (não se “confunda” com u).
Que diferença poder ler uma análise de quem conhece o assunto!!
Primeiro, o sistema de escrita: a chamada escrita alfabética não é nem fonética (um símbolo para cada som) nem fonológica (um símbolo para cada fonema). Em uma escrita fonética, “tio” teria tantas grafia quantas fossem as pronúncias ([t] ou [tch] no começo, [o] ou [u] no final, fora os sons intermediários). Uma escrita fonológica implicaria que escrevêssemos /caza/ (ou /kaza/) em vez de “casa” e /sinema/ em vez de “cinema”.
A escrita fonética de “final” seria [final] ou [finau] (ou [finaw]), conforme a pronúncia, mas a fonêmica seria sempre /final/ (como prova o “l” em “finalidade”).
E como escreveríamos “peixe”? Foneticamente, [pexe] ou [peixe] (ou [peyxe] – estou sem um bom símbolo para o som que escrevemos com “x” ou “ch”). Fonemicamente? Hoje, /peixe/. No futuro, quem sabe seja /pexe/.
Crianças aprendendo a escrever, adultos com pouca escolaridade ou prática e cronistas anteriores às leis ortográficas fazem, todos, o mesmo tipo de escolhas. Digamos, para simplificar, que cometem os mesmos tipos de “erros”. Empregam grafias diversas e juntam palavras que os mais experientes (ou os mais recentes) separam.
Analistas apressados podem chegar a diagnósticos severos (por exemplo, de dislexia) em relação a esses escreventes. Mas, de fato, trata-se apenas de: a) instabilidade do sistema ortográfico (casa / caza; borracha / borraxa); b) de grafias baseadas na pronúncia, que é variável (menino / mininu), em hipercorreção (se “peixe”, por que não “badeija”; se “menino”, porque não “menistro”; se “final”, porque não “degral”?). Para um aprendiz, convenhamos, não é nenhum desastre.
Um aluno que comete estes erros, evidentemente comete erros. Afinal, a grafia correta está definida em lei! Mas seus erros não são devidos à falta atenção ou a algum tipo de déficit cognitivo. Podem, ao contrário, ser resultado de hipóteses inteligentes, embora erradas, e de generalizações que não deveriam fazer, mas que, na fase de aprendizagem em que estão, são comuns e demonstram independência intelectual e inventividade.
Em um texto famoso de Mattoso Câmara sobre o assunto, uma análise chama particular atenção. O lingüista encontrou diversas grafias para a palavra “silvou” (no ditado de “a serpente silvou”). Elas são devidas especialmente à instabilidade do “l” em sua relação com “u” em final de sílaba e de “u” em sua relação com “o” em posição átona: silvou, silvol, siuvou, siovol etc. A pronúncia é sempre a mesma, é importante observar.
O caso mais interessante é silivou. Diz Mattoso Câmara que o acréscimo de “i” depois de “l” é uma manobra do aluno (de 12 anos !!!) para manter o “l”. Sua explicação: como já que o “l” flutua em final de sílaba (é pronunciado [l] ou [u]), mas é fixo no começo, ao colocar uma vogal depois dele, o aluno garante que o “l” esteja em começo de silaba e, assim, não se vocalize (não se “confunda” com u).
Que diferença poder ler uma análise de quem conhece o assunto!!
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