Um diagnóstico impactante de doenças como câncer ou mal de Alzheimer geralmente é acompanhado de um pacote de turbulências que desestruturam a família.
Negação (por parte do doente ou dos familiares), culpa ou sobrecarga de um dos parentes podem fazer parte do "combo", junto a outras questões próprias de cada núcleo familiar.
Foi para tratar especificamente parentes que se sentem despreparados para lidar com um diagnóstico difícil que a psicóloga Cláudia Barroso e a psicanalista Sonia Pires criaram o Bem-me-Care - SOS Family.
O serviço da clínica, em São Paulo, é um tipo de pronto-atendimento para os parentes e pode ser feito em um a sete encontros.
"A gente não trabalha os conflitos preexistentes; a ideia é olhar especificamente para esse trauma que 'quebrou' a família", afirma Pires
"Na maioria das vezes, as angústias dos familiares passam na periferia. O efeito existe, mas nem sempre se olha para isso", diz Barroso.
O atendimento tem uma regra: o paciente não pode participar. Sua presença poderia inibir os familiares a falar sobre a culpa ou a raiva que sentem em relação à situação.
TRATAMENTO
Segundo as especialistas, o trabalho ajuda a fortalecer mecanismos para enfrentar a doença e, como resultado, pode até aumentar o sucesso do tratamento do adoecido.
"Se há negação da doença, o paciente deixa de ter o atendimento e a melhora que poderia ter. Quando você trata a família, acaba provocando efeitos no paciente, colabora com a adesão ao tratamento. Há um entendimento maior sobre a doença e o prognóstico", afirma Barroso.
Foi o que aconteceu com a professora aposentada Reginea Diana Nunes, 56.
O marido dela, Luiz Carlos Ferreira, 61, recebeu o diagnóstico de câncer de intestino no fim do ano passado.
"Aparentemente, ele recebeu bem a notícia, mas, quando saiu do consultório, parecia enlouquecido. Estava em total desequilíbrio. Perguntava 'Por que comigo?', e chorava muito", conta.
"Ele não queria aceitar a doença e colocou na minha mão toda a responsabilidade por sua vida. Eu tinha que falar para ele beber água, comer, ele agia como se fosse uma criança, não seguia as recomendações médicas."
Ela sugeriu que o marido fizesse terapia, mas ele não quis. Abalada, ela própria foi atrás de ajuda profissional. Reginea ficou mais tranquila e auxiliou o marido a enfrentar a doença. "Vi o que era bom para mim e para ele. Mostrei o que ele não via, que poderia acontecer com qualquer um e que ele tinha um caminho a percorrer no tratamento, estava amparado."
Ela dizia também que ele tinha de resolver a insegurança e o medo que sentia da doença voltar e de não poder voltar a trabalhar. Deu tão certo que Luiz Carlos procurou um psicólogo depois.
LIMITES
A empresária Adriana Trussardi, 41, também procurou ajuda quando sua mãe, Katia Abdenour, foi diagnosticada com câncer de ovário em estágio avançado.
"Era difícil acreditar na doença. Queria fazer o possível e o impossível para ela ficar viva", conta.
Quando os médicos falavam em tentar uma nova quimioterapia, sua mãe se recusava. "Ela dizia que queria descansar e eu falava que ela não podia nos abandonar. Sabia que era egoísmo, mas queria lutar até o último minuto", conta Adriana.
A terapia a ajudou a entender e respeitar o sofrimento da mãe. "Minha mãe não falava, não comia e eu a queria viva. Comecei a respeitar a vontade dela."
Ela conta que seu sofrimento se refletiu em seus filhos. "Praticamente passei a morar no hospital e vi que não estava dando muita atenção a eles. A terapia trouxe a estrutura familiar de volta."
DIFERENÇAS
Cada família, com suas relações afetivas, lida com o diagnóstico de uma forma diferente. A recomendação é procurar ajuda quando a pessoa sentir que não consegue suportar a situação.
"As famílias podem ficar presas ao trauma. Às vezes, a pessoa já morreu, mas os parentes ficam voltando àquela época, podem acusar uns aos outros, há quem diga: 'Eu fiquei responsável pelo papai e vocês não fizeram nada'", diz Pires.
Sessões de psicoterapia ou psicanálise, mesmo que fora de centros especializados no tema, ajudam a família a lidar com a questão. Outra opção são os centros de psicologia de hospitais e os grupos de apoio de pacientes. A diferença é que, no último caso, o tratamento costuma ser em grupo.
MARIANA VERSOLATO
DE SÃO PAULO
Negação (por parte do doente ou dos familiares), culpa ou sobrecarga de um dos parentes podem fazer parte do "combo", junto a outras questões próprias de cada núcleo familiar.
Foi para tratar especificamente parentes que se sentem despreparados para lidar com um diagnóstico difícil que a psicóloga Cláudia Barroso e a psicanalista Sonia Pires criaram o Bem-me-Care - SOS Family.
O serviço da clínica, em São Paulo, é um tipo de pronto-atendimento para os parentes e pode ser feito em um a sete encontros.
"A gente não trabalha os conflitos preexistentes; a ideia é olhar especificamente para esse trauma que 'quebrou' a família", afirma Pires
"Na maioria das vezes, as angústias dos familiares passam na periferia. O efeito existe, mas nem sempre se olha para isso", diz Barroso.
O atendimento tem uma regra: o paciente não pode participar. Sua presença poderia inibir os familiares a falar sobre a culpa ou a raiva que sentem em relação à situação.
TRATAMENTO
Segundo as especialistas, o trabalho ajuda a fortalecer mecanismos para enfrentar a doença e, como resultado, pode até aumentar o sucesso do tratamento do adoecido.
"Se há negação da doença, o paciente deixa de ter o atendimento e a melhora que poderia ter. Quando você trata a família, acaba provocando efeitos no paciente, colabora com a adesão ao tratamento. Há um entendimento maior sobre a doença e o prognóstico", afirma Barroso.
Foi o que aconteceu com a professora aposentada Reginea Diana Nunes, 56.
O marido dela, Luiz Carlos Ferreira, 61, recebeu o diagnóstico de câncer de intestino no fim do ano passado.
Adriano Vizoni/Folhapress |
Reginea Diana Nunes e seu marido Luiz Carlos Ferreira, de São Paulo, lidaram juntos com o diagnóstico da doença |
"Ele não queria aceitar a doença e colocou na minha mão toda a responsabilidade por sua vida. Eu tinha que falar para ele beber água, comer, ele agia como se fosse uma criança, não seguia as recomendações médicas."
Ela sugeriu que o marido fizesse terapia, mas ele não quis. Abalada, ela própria foi atrás de ajuda profissional. Reginea ficou mais tranquila e auxiliou o marido a enfrentar a doença. "Vi o que era bom para mim e para ele. Mostrei o que ele não via, que poderia acontecer com qualquer um e que ele tinha um caminho a percorrer no tratamento, estava amparado."
Ela dizia também que ele tinha de resolver a insegurança e o medo que sentia da doença voltar e de não poder voltar a trabalhar. Deu tão certo que Luiz Carlos procurou um psicólogo depois.
LIMITES
A empresária Adriana Trussardi, 41, também procurou ajuda quando sua mãe, Katia Abdenour, foi diagnosticada com câncer de ovário em estágio avançado.
"Era difícil acreditar na doença. Queria fazer o possível e o impossível para ela ficar viva", conta.
Quando os médicos falavam em tentar uma nova quimioterapia, sua mãe se recusava. "Ela dizia que queria descansar e eu falava que ela não podia nos abandonar. Sabia que era egoísmo, mas queria lutar até o último minuto", conta Adriana.
Gabo Morales/Folhapress |
A empresaria Adriana Trussardi, que começou a fazer terapia quando soube da doença em estágio avançado da mãe |
Ela conta que seu sofrimento se refletiu em seus filhos. "Praticamente passei a morar no hospital e vi que não estava dando muita atenção a eles. A terapia trouxe a estrutura familiar de volta."
DIFERENÇAS
Cada família, com suas relações afetivas, lida com o diagnóstico de uma forma diferente. A recomendação é procurar ajuda quando a pessoa sentir que não consegue suportar a situação.
"As famílias podem ficar presas ao trauma. Às vezes, a pessoa já morreu, mas os parentes ficam voltando àquela época, podem acusar uns aos outros, há quem diga: 'Eu fiquei responsável pelo papai e vocês não fizeram nada'", diz Pires.
Sessões de psicoterapia ou psicanálise, mesmo que fora de centros especializados no tema, ajudam a família a lidar com a questão. Outra opção são os centros de psicologia de hospitais e os grupos de apoio de pacientes. A diferença é que, no último caso, o tratamento costuma ser em grupo.
MARIANA VERSOLATO
DE SÃO PAULO
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