12.28.2011

Jesus Guerreiro?


Algo que sempre me muito estranhou foi essa visão transcendental de Cristo, como se ele não fosse também um homem de seu tempo. Além de totalmente anacrônica, essa visão é uma imposição de nossos valores atuais para um acontecimento de um contexto totalmente diferente. Muitos teólogos da libertação, em minha opinião, têm uma visão muito mais coerente de Cristo quanto a isso.
Depois da festa da Páscoa do ano 3790 do calendário hebraico, a maioria dos camponeses seguiu sua rotina normalmente. Em Jerusalém, contudo, no dia anterior houve a morte de um judeu, mas nada que não estivessem acostumados. Naquele tempo, a cidade era palco de conflitos político-religiosos em que quase sempre algum agitador morria por incitar a rebelião contra os romanos, que governavam a região com o apoio da elite judaica do Templo de Jerusalém.
Dessa vez, tinha sido um judeu camponês chamado Yeshua, que foi aprisionado e condenado à morte por ter desafiado o poder romano em plena Páscoa.
Yeshua morreu sem chamar muita atenção dos cidadãos do Império Romano. Além dos evangelhos (que não podem ser consideradas fontes imparciais de sua vida, já que foram escritos por seus seguidores) há apenas uma menção direta a ele, feita provavelmente no fim do século 1. Essa falta de citações seria um indício da pouca repercussão que Jesus teria tido em sua época. 
A época que Cristo viveu coincide com vários movimentos populares de contestação ao poder romano. O esquema de poder na Galiléia, assim como em outras regiões de Israel, funcionava num sistema de clientela: para reinar, Herodes contava com o apoio dos romanos. Estes, por sua vez, exigiam que ele recolhesse impostos para Roma e se responsabilizasse pela repressão de qualquer contestação ao poder imperial. Sob essas condições, Roma permitia que os judeus cultuassem o seu Deus único, Javé, em vez de celebrarem as várias divindades que povoavam o panteão romano. O problema é que apenas os romanos e uma elite sacerdotal judaica eram beneficiados nesse sistema. A maioria dos judeus tinha que trabalhar cada vez mais para sustentar essas duas classes.
Cabe aqui lembrar que a distinção de uma consciência política separada da espiritualidade é uma invenção dos pensadores ocidentais modernos. Jesus podia muito bem ser um líder revolucionário social, e ainda assim pregar paz e amor.
Na época de Cristo, o judaísmo era representado por seis facções importantes: os fariseus, os saduceus, os essênios, os herodianos, os zelotes e os sicários.
Os saduceus eram propensos a aceitar a cultura greco-romana. Conforme os escritos do Novo Testamento, eram adversários de Jesus juntamente com os fariseus, pois tanto os saduceus como os fariseus eram contrários a atividades revolucionárias.
Os herodianos, a respeito dos quais pouca documentação existe, são tidos por alguns historiadores modernos como amigos de Roma. O fato é que se opunham a Jesus.
Os essênios, aos quais provavelmente estavam filiados os monges de Qumran, eram monges que viviam em lugares retirados praticando o celibato, a pobreza e a obediência, sendo avessos ao comércio e às armas.
Quanto aos zelotas e aos sicários, eram militantes contra o domínio romano.
Chegamos aqui a duas alternativas viáveis: ou Jesus era um monge essênio muito sábio e instruído, ou um militante mais parecido, se me permitem o anacronismo, com o Che Guevara.
Independente da opção que adotemos, Jesus militante ou Jesus monge, podemos ter certeza que esse aspecto católico/evangélico é um anacronismo. A menos que acreditemos no transcendentalismo ou na santidade do mesmo, o que pode ser aceitável em termos de crença, mas não se quisermos fazer uma pesquisa séria e imparcial.

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