A ver. No caso do Brasil, ele flui cada vez mais para os serviços e menos para a indústria
por Carlos Drummond
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publicado
09/06/2014 04:48
Em meio ao ambiente internacional
desfavorável e ao pessimismo do empresariado nacional, o Brasil recebeu
19,4 bilhões de dólares em investimentos diretos estrangeiros entre
janeiro e abril deste ano. No mesmo período de 2013, o valor atingiu
18,9 bilhões de dólares. O aumento indica a resistência da economia do
País e a sua atratividade ao capital externo. O governo comemora o
resultado, mas a distribuição do fluxo externo mostra a participação
crescente de setores de bens não comercializáveis no mercado
internacional ou non tradeables, principalmente no
setor de serviços, e a redução da parcela disponível para a produção
voltada para a exportação, aponta a Sociedade Brasileira de Estudos de
Empresas Transnacionais e da Globalização Econômica. O resultado é a
ampliação da fatia do mercado interno ocupada por multinacionais sem
aumento da capacidade do Brasil de obter saldos comerciais positivos.
“Entre 1980 e 2014, a parte da indústria
caiu de 74,4% para 21,2% e o fluxo para os serviços e o setor primário
mais que triplicou. A maior parcela vai para plantas existentes e visa
atender ao mercado local com serviços de comércio, financeiros, de
transportes, de educação, de atividade imobiliária e nas áreas de
telecomunicações e eletricidade”, explica Luis Afonso Lima, presidente
da Sobeet. Em vez de investir na construção de unidades novas ou greenfield
e aguardar até um ano e meio de maturação para faturar e lucrar, a
empresa transnacional compra o acesso imediato ao mercado interno e às
receitas das vendas.
A forma mais utilizada para ingressar no
mercado interno são os processos de fusões e aquisições. No primeiro
trimestre foram realizadas 164 dessas operações, 18% acima do mesmo
período do ano passado. O total de transações passou de 9 bilhões de
reais para 44 bilhões, segundo levantamento do banco de investimento
Greenhill. Em consequência do fluxo crescente de recursos para o
segmento de bens não comercializáveis, a parte do IDE global endereçada
ao Brasil, acima de 4% em 2013, distancia-se cada vez mais da
participação do País nas exportações mundiais, em torno de 1%.
As chamadas “modalidades de
internacionalização sem capital”, não incluídas no censo de capitais do
BC até o ano 2000, ajudaram a impulsionar o setor de serviços. Os novos
itens são aluguéis não imobiliários, gestão de ativos intangíveis,
serviços financeiros de holdings não financeiras, prestação de serviços
de informação e atividades de sedes de empresas e de consultoria em
gestão de empresas.
O IED cresce acima de 60 bilhões de
dólares anuais desde 2011, mas “o déficit da balança comercial de
serviços, setor determinante para a competitividade da indústria, é de
92 bilhões de dólares, um dos maiores do mundo”, disse o economista
Jorge Arbache, da UnB e do BNDES, no seminário Indústria e
Desenvolvimento Produtivo do Brasil, promovido pela Fundação Getulio
Vargas nos dias 26 e 27.
Ao se instalar no
País e produzir para exportação, uma empresa se submete a condições
adversas de câmbio, juros, carga tributária, concorrência de importados,
infraestrutura e custo de energia e se torna menos competitiva no
mercado externo. Quando investe em serviços não exportáveis, supera as
rivais nacionais por ter escala mundial e tecnologia mais avançada. O
fenômeno contribuiu para o declínio da balança comercial de
manufaturados, de um superávit de 5 bilhões de dólares em 2004 para um
déficit de 105 bilhões de dólares em 2013, segundo a Fiesp. O setor foi
responsável por 13% do PIB em 2012, a menor proporção dos últimos 50
anos.
O quadro mostra a atualidade do trabalho
de 2002 “O investimento direto estrangeiro e a internacionalização da
economia brasileira nos anos 1990”, dos economistas Fernando Sarti e
Mariano F. Laplane, do Instituto de Economia da Unicamp. “Diante da
Coreia do Sul e da China, entre outros países, o Brasil se diferencia
por um processo de internalização “introvertida”, caracterizado pela
transferência da propriedade de empresas nacionais para investidores
estrangeiros sem contrapartida proporcional de investimentos de empresas
brasileiras no exterior e pela assimetria entre o expressivo incremento
de volume e conteúdo importados no mercado e na produção doméstica vis-à-vis
o apenas modesto desempenho exportador.” A exposição a uma estrutura
produtiva muito mais eficiente, em vez de funcionar como agente
modernizador da estrutura empresarial brasileira, como defende o
neoliberalismo, contribuiu para agravar a sua vulnerabilidade externa.
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