9.13.2010

Informações contidas no DNA: a quem pertencem?


Dois casos recentes de recusa em fornecer DNA para testes têm reacendido na mídia questões éticas acerca das informações contidas no nosso DNA. No primeiro deles, o goleiro Bruno, acusado de assassinato, se recusa a fornecer material para testes que podem elucidar sua participação na morte de Eliza Samudio. O segundo caso é o do vice-presidente José Alencar, que se recusa a fazer o teste para comprovar uma suspeita de paternidade.

No primeiro caso, segundo a legislação, uma pessoa suspeita de ter cometido crime não precisa fornecer provas contra si mesmo. Já nos casos de acusação de paternidade, a recusa em se submeter aos testes implicaria que o “suspeito” é presumivelmente o pai da criança. Tivemos um debate muito interessante sobre esse assunto em VEJA.com (que irá ao ar nos próximos dias).

Existem, porém, outras situações nas quais o DNA de uma pessoa pode ser fundamental para determinar se um parente tem risco de vir a ter filhos com uma doença genética cujo nascimento poderia ser prevenido. É possível negar-se a fornecer essa informação?

Como alertar familiares em risco? – O aconselhamento genético (AG) envolve uma série de procedimentos complexos. Por exemplo, quando um casal tem uma criança com uma doença genética, o primeiro passo é confirmar o diagnóstico e determinar se há risco de que futuras crianças também venham a ser afetadas. Dependendo da situação, esse risco pode se estender a outros familiares. Nesses casos pedimos aos consulentes para alertar as pessoas interessadas de que elas podem se submeter a testes genéticos para determinar se elas têm ou não um risco aumentado, desde que queiram, é claro. O fundamental é que sejam informadas. A decisão de se submeter ou não ao teste genético é única e exclusivamente da pessoa interessada. Na prática, essa conduta tem se mostrado eficiente na maioria dos casos. Mas existem exceções…

E se houver recusa em fornecer DNA? Como proceder nesses casos? – Maria veio nos procurar porque vai casar e quer saber se tem risco de vir a ter filhos com distrofia de Duchenne (DMD), uma doença degenerativa dos músculos que só afeta meninos. A sua preocupação procede. Seu primo Paulo, filho de sua tia materna, Joana, faleceu afetado por essa doença. Existem duas possibilidades. A doença de Paulo pode ter se originado de uma mutação nova e nesse caso não há risco de que nasçam outras crianças com o mesmo problema naquela família. Ninguém tem o risco genético aumentado. A segunda possibilidade é de que o gene alterado já esteja presente na família. Nesse caso, Maria pode também ser portadora da mutação. Se isso for verdade existe o risco de que metade de seus filhos também venham a ser afetados pela DMD. Para tirar isso a limpo precisamos comparar seu DNA com o do primo afetado e o de Joana, a tia materna. É o procedimento padrão.

Qual é a dificuldade? – Acontece que logo depois do falecimento de Paulo, sua mãe sofreu um acidente e também não resistiu. Quando contatado, o pai afirmou que não quer fornecer qualquer dado ou material genético de Paulo ou de sua esposa falecida – que estão armazenados em um hospital – já que isto não vai beneficiá-lo em nada. Mesmo sabendo que esse DNA poderá ajudar muito a sobrinha, inclusive prevenindo o nascimento de novos afetados, ele permanece irredutível.

Como proceder em situações como essas? É possível solicitar o DNA contra a vontade do pai? Existe uma jurisprudência a respeito? Gostaria de saber a opinião de vocês.

Por Mayana Zatz
Veja

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