2.08.2012

Morre cantor Wando, aos 66 anos


Ídolo da música popular brasileira estava internado desde dia 27 de janeiro e sofria de problemas cardíacos

Wando, de 66 anos, morreu na manhã desta quarta-feira
Foto: Marcelo Franco / O Globo
Wando, de 66 anos, morreu na manhã desta quarta-feira Marcelo Franco / O Globo
RIO - Morreu, por volta das 8h desta quarta-feira, o cantor Wanderley Alves dos Reis, o Wando, ao 66 anos de idade, vítima de uma parada cardio-respiratória. Ele estava internado desde o dia 27 de janeiro no Hospital Biocor, em Nova Lima, Minas Gerais, onde deu entrada queixando-se de dores no peito. Conhecido por sucessos como "Fogo e paixão", o cantor teve um princípio de infarto no final de janeiro e passou por uma angioplastia coronária para desobstrução das artérias do coração. O corpo de Wando será velado às 17h no cemitério Bosque da Esperança, em Belo Horizonte. O enterro será às 11h de quinta-feira, no mesmo local.

Segundo os últimos boletins médicos divulgados, o quadro clínico do cantor vinha apresentando melhora. Wando estava acordado, se comunicando e passava pelo processo de retirada do aparelho que o auxiliava na respiração. No domingo, o cantor enviou um bilhete para os fãs por meio de parentes que o visitaram. "Eu estou na oficina de Deus arrumando a turbina. Me aguardem!”, escreveu o artista.
Mais improvável símbolo sexual da música popular brasileira, Wando costumava admitir: “Na verdade, me acho até feio, mas é inegável que tenho um jeitinho todo especial com elas.” Ou então: “Sou um cara feio mas toco violão e falo de amor. Isso ajuda muito.” Ajudou-o, sim, a vender milhões de discos e a tornar-se referência da canção muito romântica brasileira — brega, para quem preferir o termo. Com seus lábios grossos, ui-wando paixão e cantando “o amor para maiores de 25 anos”, o artista virou febre na segunda metade dos anos 1980, a partir do sucesso da música “Fogo e paixão” (que seria posteriormente cantada por Nando Reis, Fábio Junior, Demônios da Garoa e Wilson Sideral, entre outros). Nos anos 2000, a canção batizou um bloco de Carnaval no Rio de Janeiro — para o qual o próprio Wando ajudou a angariar fundos, autografando calcinhas e camisetas e doando uma tanga amarela do seu acervo pessoal.
“(‘Fogo e paixão’) é um sucesso de 1985, uma canção que gravei para minha ex-mulher, com quem fui casado durante 13 anos, a Rose (ela assina a autoria da música). Na verdade escrevemos essa música juntos”, contou Wando, em entrevista. Incluída no disco “Vulgar e comum é não morrer de amor”, a música rompeu a barreira das FMs e ajudou a firmar a imagem do cantor como a voz da franqueza sexual.
“Se há assunto em moda é o amor homem e mulher do jeito que eu canto nas letras: homem tem cheiro de homem, mulher tem cheiro de mulher. É real”, teorizava Wando, dispensando as metáforas (“não gosto de entrelinhas, prefiro o que vai direto ao coração”) e assumindo sua condição de cantor popular (“fazer a coisa complicada é muito mais fácil. O difícil é simplificar”).
Além de “Fogo e paixão”, Wando teve como grandes sucessos em sua voz as músicas “Moça” (com a qual vendeu mais de 1,2 milhão de discos, em 1974), “Coisa Cristalina” (“inspirada num amigo viciado em cocaína, que queria uma paixão tão avassaladora pela mulher quanto a que tinha pela droga”), “Chora Coração” (que “foi feita na morte de Tancredo para a dona Risoleta Neves”), “Eu já tirei a tua roupa”, “Gosto de maçã”, “O que que eu vou dizer para o meu corpo?” e “Deus te proteja de mim” — todos clássicos da canção popular brasileira.
Wando bateu recordes de bilheteria no Rio e em São Paulo com o show do disco “Obsceno” (1988, que teve mais de um milhão de cópias vendidas). No espetáculo do disco seguinte, “Tenda dos Prazeres” (1990), ele inaugurou um procedimento que se tornaria sua marca. “Resolvi colocar uma calcinha na capa do disco porque, se virasse ao contrário, ela parecia uma tenda. Comecei a distribuir algumas peças nos shows e passei a receber outras. Hoje, tenho 17 mil calcinhas”, recordou-se recentemente.
O show “Tenda dos prazeres” foi sua primeira superprodução, com tenda árabe, dançarinas do ventre e banheira de acrílico transparente. Ele pôs telões na rua para para o povo que não podia pagar o ingresso. O disco acabou vendendo 300 mil cópias em plena recessão da indústria. Em seus shows, Wando ainda sorteava suítes de motéis e bonecas infláveis e distribuía maçãs, pêssegos em calda e rosas.
Wando nasceu em Cajuri, cidadezinha perdida na Zona da Mata, antigo distrito do município de Viçosa, em 2 de outubro de 1945, e foi batizado de Wanderley Alves dos Reis. Ainda criança, mudou-se com a família para Juiz de Fora. Foi feirante, caminhoneiro e ainda tentou a carreira teatral em Belo Horizonte. Foi para o Rio em 1972, onde conheceu Oswaldo Sargentelli, que incentivou sua carreira. Seu primeiro LP, “Glória Deus no Céu e samba na Terra”, foi lançado em 1973. Nesse começo de carreira, Wando foi gravado por Roberto Carlos (“A menina e o poeta”), Jair Rodrigues (“O importante é ser fevereiro”), Ãngela Maria (“Vá mas volte”) e Originais do Samba (“Velho poeta Pixinguinha”). Um de seus sucessos dessa fase inicial, “Nega do Obaluauê”, foi regravada nos anos 2000 por Pedro Luís e a Parede.
Apesar de pecha de brega, Wando orgulhava-se do seu engajamento político (participou de comício das Diretas em 1984, em Curitiba) e de ter sido censurado (nas canções “Boca calada” e “Jesus, negro bonito de olhos azuis”). Em 2005, ele lançou seu primeiro DVD, “Romântico brasileiro, sem vergonha” e iniciou parceria com Nando Reis (na canção “Minhas amigas”). Mas o cantor também experimentou dissabores na sua vida pessoal: em 1999, o filho Wanderley Alves dos Reis Júnior, o Wandinho Pitbull, foi preso após trocar tiros com seguranças de um condomínio na Barra da Tijuca.
Wando deixa quatro filhos e dois netos.
O Globo.

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