Introdução
'Anestesia local' corresponde ao bloqueio reversível da condução nervosa, determinando perda das sensações sem alteração do nível de consciência. Reversibilidade de efeito é a principal característica que diferencia anestésicos locais de agentes neurolíticos, como fenol e álcool.A molécula típica de anestésico local é constituída por um grupo lipofílico (usualmente um anel benzeno) e um grupo hidrofílico (usualmente amina terciária), separada por uma cadeia intermediária que incluem ligação éster ou amida. O grupo lipofílico (lipossolúvel) é necessário para a passagem da molécula pela membrana da célula nervosa, enquanto o grupamento hidrofílico (ionizável) interage com o receptor celular.
Classificação
De acordo com a natureza da cadeia intermediária, os anestésicos locais classificam-se em agentes tipo éster ou amida.Classificação dos anestésicos locais de acordo com a estrutura química | ||
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Ésteres | ||
De ácido benzóico | ||
Cocaína | ||
Benzocaína | ||
Tetracaína | ||
De ácido para-aminobenzóico (PABA) | Procaína | |
Cloroprocaína | ||
Propoxicaína | ||
Amidas | ||
Agentes derivados da xilidina | ||
Lidocaína | ||
Mepivacaína | ||
Bupivacaína | ||
Ropivacaína | ||
Etidocaína | ||
Agentes derivados da toluidina | ||
Prilocaína | ||
Articaína |
Anestésicos locais são bases orgânicas fracas, pobremente solúvel em água. Por isso, as soluções comerciais são preparadas como sais ácidos (hidrossolúvel), geralmente obtidos por adição de ácido clorídrico. Assim, apesar de os agentes serem bases fracas, as preparações farmacêuticas (sais de hidrocloretos) são levementes ácidas, com o pH variando de 4,5 a 6,0 em tubetes odontológicos. Esta acidez aumenta a estabilidade das soluções anestésicas. Uma vez injetadas nos tecidos, com pH mais alcalino (pH = 7,4), há tamponamento do ácido, liberando base em forma não-ionizada, passível de ser absorvida. Quando o pH do meio não favorece essa transformação, a ação anestésica não se processa. É o que ocorre em presença de processos inflamatórios e/ou infecciosos, em que o pH tecidual extremamente baixo promove ionização da molécula, impedindo sua ação. Em meio ácido, as bases recebem íons hidrogênio e tornam-se carregadas positivamente (ionizadas ou polarizadas), diminuindo sua positividade de atravessar membranas celulares (menor lipossolubilidade). Suplementação excessiva de doses num mesmo local determina menor resposta, pois esgota a capacidade tamponante do meio, não liberando a base.
Anestésicos locais atuam sobre os processos de geração e condução nervosa, reduzindo ou prevenindo o aumento de permeabilidade de membranas excitáveis ao sódio, fenômeno produzido por despolarização celular. Embora vários modelos tenham sido propostos para explicar sua ação sobre fibras nervosas, aceita-se hoje que o principal mecanismo envolve sua interação com um ou mais sítios específicos de ligação em canais de sódio.
História
Embora inúmeras substâncias de estrutura química diversa sejam capazes de produzir anestesia local, a maioria das drogas de comprovada utilidade clínica (identificadas com o sufixo "caína") compartilham uma configuração fundamental com o primeiro anestésico local verdadeiro, a cocaína.Durante séculos, os nativos das montanhas peruanas vêm utilizando folhas de coca para evitar a fome, aliviar a fadiga e elevar o espírito. O interesse pelas propriedades psicotrópicas da Erythroxylon coca levou ao isolamento da cocaína por Albert Niemann, em 1859, e ao estudo de sua farmacologia por Von Anrep, em 1880. Embora ambos tenham descrito a ação anestésica local da cocaína, o crédito para sua introdução na medicina pertence a Carl Koller, um médico vienense. Em 1884, Koller familiarizou-se com os efeitos fisiológicos da cocaína descrito por Sigmund Freud. Koller reconheceu o grande significado clínico da droga e logo demostrou sua ação no alívio da dor em vários procedimentos oftalmológicos.
O conhecimento do potencial de reações adversas da cocaína logo acompanhou sua aceitação geral como anestésico local. No entanto, várias mortes atribuídas à cocainização aguda testemunharam o baixo índice terapêutico da droga. A tendência ao abuso da cocaína foi significativamente ilustrada pela autodependência de William Halsted, um pioneiro no bloqueio nervoso regional.
Mecanismo de ação
Os anestésicos locais bloqueiam fisicamente por interacções lipofílicas (ocluindo o poro) os canais de sódio das membranas dos terminais dos neurônios. Como o potencial de ação é dependente do influxo de sódio, ao não ocorrer não há propagação do sinal nervoso.Os neurônios com axônios com menor diâmetro são mais facilmente bloqueados, o que permite ajustar a dose de forma a não inativar os neurônios motores, mas apenas os sensitivos e os do sistema nervoso autônomo, já que os motores têm diâmetros consideravelmente maiores.
A administração local concomitante de um vasoconstritor reduz os seus efeitos sistêmicos e potencializa e prolonga os seus efeitos locais.
O uso de anestesia local é indicado para operações simples, que envolvem pequenas áreas, como algumas cirurgias plásticas ou para suturar cortes (dar pontos).
Seleção
Anestésicos classificam em agentes de:Curta duração
Procaína
Clorprocaína
Média Duração
Lidocaína
É o anestésico padrão, com o qual os demais são comparados. Usada em diversas técnicas anestésicas, também pode ser administrada por via intravenosa para também tratar de arritmias cardíacas em unidades de cuidados intensivos ou durante cirurgias.Mepivacaína
É um anti anestésico local do tipo não amida muito utilizado em odontologia. Tem maior indicação nos casos em que o uso de vasoconstrictores é perigoso para o paciente, pois pode ser usado sem esta substância e sem perda importante da potência e tempo de duração da analgesia. Não é usada topicamente, sendo empregada em anestesias infiltrativas e bloqueios periféricos. Sem vasoconstrictor é usado na concentração de 3%.Prilocaína
Tem amplo uso em Odontologia, especialmente em casos em que aminas simpaticomiméticas estão contra-indicadas, pois está contida na única preparação comercialmente disponível no Brasil que tem felipressina como vasoconstritor.Longa duração
Tetracaína
Ropivacaína
Bupivacaína
Está indicada em procedimentos Odontológicos de maior duração ou em que se deseja analgesia pós-operatória mais prolongada (varias horas). Comparada com lidocaína, o início de efeito da bupivacaína é mais tardio, mas a duração é duas vezes maior. Durante seu uso em anestesia, especialmente obstétrica, foram relatadas casos de parada cardíaca de difícil recuperação. No entanto, o uso odontológico em baixas doses torna essa complicação improvável.Etidocaína
Outros
Ropivacaína
Articaína
Efeitos úteis
Perda completa de sensação local, e em especial da dor, sem perda do controle muscular. O doente pode cooperar, respondendo a pedidos do cirurgião. Não há riscos elevados de efeitos dos anestésicos como para os anestésicos gerais.Efeitos adversos
Apesar das precauções, alguma pequena quantidade de fármaco chega sempre a outros órgãos, nomeadamente ao cérebro e ao coração.- Ansiedade com tremores. Euforia, agitação.
- Confusão
- Convulsões (incomum)
- Depressão nervosa, em altas doses algum risco de depressão respiratória.
- Vasodilatação e redução da frequência cardiaca.
- Hipotensão arterial
- Reacções alérgicas.
Fármacos do grupo
- Procaína: Foi o primeiro composto sintético.
- Cocaína: o mecanismo de acção anestético não tem relação com o mecanismo psicotrópico. Raramente usada, excepto em spray para operações ao nariz.
- Cloroprocaína
- Tetracaína
- Lidocaína: uso generalizado em anestesia e também no tratamento de arritmias cardiacas (ver antiarritmicos da classe I).
- Benzocaína
- Mepivacaína
- Prilocaína
- Ropivacaína
- Bupivacaína
Bibliografia
- Farmacologia clínica para dentistas; Lenita Wannmacher, Maria Beatriz Cardoso Ferreira. Guanabara Koogan; 2º edição; 1999.
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