2.06.2012

Desconhecimento sobre fontes de informação confiável na internet agrava ansiedade de quem faz buscas sobre sintomas e doenças

Buscas sobre saúde na web geram fenômeno da ‘cybercondria’





José Ricardo Savassa, ao fundo, no consultório de seu médico: web aliada nas buscas sobre tratamento
Foto: Marcos Alves



José Ricardo Savassa, ao fundo, no consultório de seu médico: web aliada nas buscas sobre tratamento Marcos Alves
RIO - Muitos brasileiros já descobriram que internet facilita a vida quando o assunto é saúde. Mas poucos sabem onde obter informações de fato confiáveis sobre o tema. No Brasil, 35% dos internautas procuram sites dedicados a assuntos de saúde, de acordo com a pesquisa de 2010 do Centro de Estudos sobre as Tecnologias da Informação e da Comunicação. Outro estudo global, publicado em 2011 pelo Instituto Ipsos, em parceria com a London School of Economics, revela uma demanda ainda mais forte: 86% dos internautas brasileiros disseram buscar assuntos de saúde. Apenas um quarto deles, no entanto, certifica-se de que a fonte é confiável. O problema é que esta multidão anônima pode começar a sentir os efeitos de uma ansiedade que os médicos já diagnosticam com a expressão “cybercondria”, a mais nova versão da hipocondria, a mania de doença, que inclui riscos de automedicação e o autodiagnóstico.
Nos EUA, de acordo com relatório do Pew Research Institute, 66% das buscas na internet sobre saúde são, na verdade, de internautas que querem saber mais sobre doenças. As pesquisas sobre saúde na web inspiraram a criação de um site chamado Dr. Google, que, com nome e interface bem parecidos ao do mais famoso buscador mundial, oferece resultados sobre doenças, medicamentos, sintomas... E tudo sem o consentimento da empresa californiana. Procurada pela reportagem do GLOBO, a assessoria de imprensa da Google no Brasil informou que encaminhou o caso para o seu setor jurídico.
A cybercondria acontece, por exemplo, quando uma simples googlada sobre um sintoma faz a pessoa acreditar que sofre de uma doença grave. O cardiologista Cláudio Domênico já recebeu em seu consultório no Rio uma paciente que achava ter um tumor na cabeça, porque, depois de abrir um exame e tentar entender o que os termos técnicos significavam, ela se equivocou e digitou no buscador uma palavra errada. Foi o suficiente para acreditar que estava com câncer quando, na verdade, estava perfeitamente saudável.
O susto também tomou conta do operador de torno José Savassa, de 46 anos, que sofre de uma doença reumática e foi orientado pelo médico a se informar na web sobre o problema. Nas buscas, ele se deparou com fotos de pessoas com problemas sérios. E levou as dúvidas ao consultório:
— Foi uma longa consulta. Fiquei assustado com o que vi, mas serviu para que eu me cuidasse melhor.
Gerson Zafalon, do Conselho Federal de Medicina (CFM), alerta que a ansiedade causada por dados descontextualizados pode traumatizar:
— Não é incomum psiquiatras receberem pacientes com distúrbios de comportamento agravados por desinformações originadas na web.
A repercussão enorme que tópicos negativos ganham na internet também agrava a ansiedade dos usuários, na opinião da pesquisadora Wilma Madeira, da USP:
— Se uma pinta parecer câncer para um usuário, há mais chances de ele encontrar resultados alarmantes, dizendo que pinta pode levar à morte, do que tranquilizadores, mostrando que aquele sinal não é grave.
Wilma diz que a cybercondria ocorre com quem já sofre de hipocondria:
— Eu não acho que a web amplia o número de hipocondríacos, mas facilita o acesso a quem tem esse distúrbio.
Para evitar sustos, Gerson Zafalon aconselha que as buscas sejam feitas após o diagnóstico, e direcionadas para informações sobre tratamentos e experiências. Diversificar fontes, debater dúvidas com os médicos e buscar sites de instituições como governos e universidades ajudam. Para Wilma, são meios de manter o que a web traz de melhor: conhecimento e autonomia.

Como usar a web a seu favor, na hora de se informar sobre saúde

Conferir informações com o médico e buscas fontes confiaveis  são dicas de como não acreditar em dados errados

 Não se automedique. A Internet deve ser uma fonte de informação e não um consultório médico"boaspraticasfarmaceuticas"


RIO - Os excessos provocados pela cybercondria incluem os riscos do autodiagnóstico e da automedicação, esta um sério problema no país, mesmo antes da popularização dos meios digitais. Os especialistas que estudam o assunto defendem que a melhor forma de evitar exageros que coloquem os pacientes em risco é a contextualização das informações, a checagem das fontes e a prática de tirar dúvidas que surjam das pesquisas online com os médicos.
- Ler informação na internet sem contextualizar, sem conferir diversas fontes pode ser um problema - diz Wilma Madeira, pesquisadora da Usp.
- Adquirir informação sobre saúde pode gerar uma busca por uma opção de vida dita saudável. Por outro lado, pode gerar um ansiedade fenomenal nas pessoas. Por exemplo, se você tem uma doença degenerativa, entra na internet, começa a ler sobre adoecimento e a ver fotos das pessoas com sequelas daquela doença - afirma Helena Garbin, da Fiocruz, que completa: - É claro que as pessoas sempre tiveram avó, livros, vizinhos, mas a quantidade de informação e a facilidade da web são insuperáveis.
A especialista explica que o autodiagnóstico e a automedicação não dependem da qualidade da informação. Muitas vezes, os dados estão corretos, mas os tratamentos são individualizados: cada pessoa reage de forma diferente. Não se automedique. A Internet deve ser uma fonte de informação "boaspraticasfarmaceuticas"
- Você pode encontrar respostas para seus sintomas, achar que tem determinada doença, tomar o remédio e vir a morrer, porque aquela não era a melhor terapia para você, porque você não podia tomar aquela medicação, ou porque aquela não era a sua doença.
Para evitar este tipo de problema e usar a web para adquirir mais conhecimento, melhorando sua relação com o médico, Helena, Wilma e Gerson Zafalon, do Conselho Federal de Medicina, são unânimes em dizer que a melhor forma de lidar com a informação sobre saúde é conferi-la com o médico.
- À medida em que as pessoas têm cada vez mais dúvidas e e questionamentos, buscam outras fontes e passam a acreditar nela, o autodiagnóstico tende a crescer. Mas o legal é o paciente que busca, leva dúvidas e informações ao médico. Facilita o trabalho, leva novidades e ajuda na relação - defende Helena.
Sites oficiais, de universidades, de governos, inclusive o do Ministério da Saúde, entram na lista de fontes de informação confiáveis. Mas as comunidades virtuais de pacientes que se reúnem para falar sobre médicos, tratamentos e sintomas também levam crédito, por permitirem a troca de experiências que só quem enfrenta uma doença tem.
Outra dica, diz Helena, é consultar sempre a parte do "quem somos" do site, onde as pessoas podem conferir mais informações sobre os autores, o que pode dar mais segurança ao leitor. Além disso, a comparação com outros sites é bem-vinda.
- Considere a internet como instrumento útil para maiores informações sobre um problema, mas isso jamais substituirá a relação médico-paciente -
O Globo
 Juliana Câmara

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