Ampla pesquisa realizada por cientistas americanos e dinamarqueses mostra quais são as estratégias que funcionam para o controle de peso e o que não passa de mito. Saiba também o que a ciência ainda quer descobrir a respeito dos regimes
Cilene Pereira e Monique Oliveira
Uma pesquisa recém-divulgada mexeu
profundamente com as convicções de estudiosos, médicos e outros
profissionais ligados ao combate da obesidade. Realizado por
pesquisadores de sete universidades – seis americanas e uma dinamarquesa
–, o trabalho definiu sete mitos, cinco dúvidas e seis verdades em
relação a dietas. Dessa maneira, derrubou conceitos adotados até hoje,
colocou sob suspeita outros tantos também defendidos por muita gente e,
principalmente, destruiu ideias nas quais todos, inclusive
especialistas, acreditavam, mas que, segundo os autores do trabalho,
estão equivocadas. Simplesmente não funcionam. O estudo foi publicado
como um artigo especial no “The New England Journal of Medicine”, uma
das mais respeitadas e importantes publicações científicas do mundo.
Participaram da pesquisa cientistas das áreas de medicina, nutrição, psicologia, educação física, saúde pública e bioestatística. Foi a primeira vez que uma equipe multidisciplinar e desse porte – são todos pesquisadores respeitados em suas respectivas áreas – se dispôs a fazer uma investigação sobre o que há de verdade científica em fundamentos que sustentam o tratamento da obesidade. Primeiro, identificaram algumas das ideias mais comuns sobre o assunto presentes em livros, na internet e também em programas de saúde pública.
Eles encontraram desde questões como a importância da motivação para o sucesso do regime até a eficácia da cirurgia bariátrica. A partir da seleção, iniciaram uma varredura na literatura especializada para saber quanto cada um dos itens tinha de solidez científica. Passaram sete meses levantando e analisando centenas de experimentos acerca dos temas. O parâmetro que separou o joio do trigo – ou seja, os trabalhos realmente bem-feitos do ponto de vista metodológico daqueles pontuados por falhas – foi o modelo considerado hoje o padrão ouro da pesquisa científica: os estudos randomizados controlados. São trabalhos que fazem comparações entre duas ou mais intervenções, aplicadas de maneira aleatória entre os participantes, e que são controlados pelos cientistas. Seu desenho reduz drasticamente a possibilidade de conclusões erradas, como confusões entre causa e efeito de um fator.
Participaram da pesquisa cientistas das áreas de medicina, nutrição, psicologia, educação física, saúde pública e bioestatística. Foi a primeira vez que uma equipe multidisciplinar e desse porte – são todos pesquisadores respeitados em suas respectivas áreas – se dispôs a fazer uma investigação sobre o que há de verdade científica em fundamentos que sustentam o tratamento da obesidade. Primeiro, identificaram algumas das ideias mais comuns sobre o assunto presentes em livros, na internet e também em programas de saúde pública.
Eles encontraram desde questões como a importância da motivação para o sucesso do regime até a eficácia da cirurgia bariátrica. A partir da seleção, iniciaram uma varredura na literatura especializada para saber quanto cada um dos itens tinha de solidez científica. Passaram sete meses levantando e analisando centenas de experimentos acerca dos temas. O parâmetro que separou o joio do trigo – ou seja, os trabalhos realmente bem-feitos do ponto de vista metodológico daqueles pontuados por falhas – foi o modelo considerado hoje o padrão ouro da pesquisa científica: os estudos randomizados controlados. São trabalhos que fazem comparações entre duas ou mais intervenções, aplicadas de maneira aleatória entre os participantes, e que são controlados pelos cientistas. Seu desenho reduz drasticamente a possibilidade de conclusões erradas, como confusões entre causa e efeito de um fator.
Basta uma olhada na lista dos mitos identificados pelos cientistas para se deparar com algumas dessas ideias. E se surpreender ao saber que não passam de inverdades, de acordo com o trabalho. A primeira é a de que adotar pequenas mudanças de hábito – aquela velha história de trocar o elevador pela escada, comer um pouquinho menos... – traz resultado a longo prazo. Trata-se, segundo o estudo, de um conceito ultrapassado segundo o qual um indivíduo perderia 0,45 quilo cada vez que gasta ou deixa de ingerir 3,5 mil calorias. Ou o oposto (ganharia quase meio quilo a cada 3,5 mil calorias consumidas).
Em compensação, argumentam os cientistas, pesquisas mais consistentes afirmam que o aleitamento não tem influência sobre o acúmulo de peso. É o caso do acompanhamento feito por médicos do Departamento de Pediatria da McGill University, no Canadá, de cerca de 14 mil crianças durante seis anos e meio. Em novembro do ano passado, o pesquisador líder desse trabalho, Michael Kramer, publicou um artigo no jornal científico “Epidemiology” reiterando seus achados. Ele escreveu: “Embora a amamentação tenha muitos benefícios bem estabelecidos para a saúde da criança e seu desenvolvimento neurocognitivo, não pode gerar a expectativa de proteção contra a obesidade na infância e idade adulta.” À ISTOÉ, o cientista canadense – um dos mais renomados em sua área – afirmou: “As evidências de que o aleitamento materno protege contra a obesidade são fracas e se enfraquecem a cada ano.”
O outro ponto polêmico do trabalho foi a afirmação de que as aulas de educação física, no formato atual, não têm papel importante na prevenção ou redução da obesidade infantil. Parece um contrassenso. Afinal, é uma oportunidade de as crianças se exercitarem. Entre as evidências que sustentam isso, porém, está uma revisão mais aprofundada de estudos sobre o tema – que envolveram, juntos, 18 mil crianças –, realizada no British Columbia Children’s Hospital, no Canadá. Os pesquisadores concluíram que as aulas não influenciam o índice de massa corporal (IMC), apesar de melhorar o condicionamento físico. No Brasil, os especialistas têm algumas explicações para isso. “Nas escolas públicas convencionais, trabalha-se com cerca de duas aulas semanais. Quando se busca redução de peso, devem ser observadas as variáveis de tempo, duração e intensidade da atividade, com estímulo nos principais dias da semana”, diz José Aroldo Filho, diretor da Nutmed, escola especializada em cursos de nutrição, do Rio de Janeiro. O gastropediatra Valmir Martins, da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, aponta outro problema. “A educação física nas escolas é ruim. E no caso do gordinho é pior. Ele fica excluído.”
A outra grande contribuição dos pesquisadores foi chancelar o que de fato é verdade no que diz respeito à obesidade. Há unanimidade científica, por exemplo, sobre a importância da participação dos pais para o controle do excesso de peso dos filhos. “Eles são responsáveis por seus hábitos alimentares”, corrobora a nutricionista Paula Castilho, da consultoria Sabor Integral, de São Paulo. Também é inquestionável que a obesidade hoje é considerada uma doença que deve ser tratada pelo resto da vida. “É uma enfermidade crônica”, concorda a cardiologista Gláucia Maria Moraes, presidente da Sociedade de Cardiologia do Rio de Janeiro. Outro fato é que as dietas baseadas em refeições prontas são mais eficazes. “Elas ajudam porque limitam as escolhas e os erros, especialmente de quantidade”, diz a nutricionista Lorença Dalcanale, mestre em ciências da saúde pela Universidade de São Paulo.
Entre outras verdades, está ainda a eficácia da cirurgia bariátrica quando indicada acertadamente. “Isso é inegável”, diz o cirurgião-bariátrico Carlos Aurélio Schiavon, do Hospital do Coração, em São Paulo. “Sua indicação é para os obesos mórbidos que não tiveram sucesso com os tratamentos clínicos e estejam dispostos a mudar o estilo de vida”, completa o cirurgião Luiz Vicente Berti, diretor do Centro de Cirurgia Obesidade e Metabólica e vice-presidente do conselho consultivo fiscal da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica.
As conclusões da pesquisa repercutiram no mundo todo, com grande parte dos especialistas comemorando a iniciativa. “Há mais desinformação nesse campo do que em qualquer outro”,afirmou Jeffrey Friedman, da Universidade Rockefeller (Eua), estudioso dos mecanismos que regulam a ingestão de comida e o peso. “Esse trabalho faz todo o sentido e corrobora o que observamos na prática clínica”, diz o médico nutrólogo Durval Ribas Filho, presidente da Associação Brasileira de Nutrologia. As informações, acreditam os profissionais, são as que devem passar a nortear os tratamentos. “As verdades constatadas pelos estudos, medidos em medicina baseada em evidência e apresentados no artigo, são as que devemos seguir e transmitir aos pacientes”, afirma o médico Eduardo Grecco, especialista em endoscopia digestiva pela Universidade de São Paulo e cirurgião do Hospital Beneficência Portuguesa, em São Paulo.
Fotos: kelsen fernandes/ag. istoé
Fotos: pedro dias/ag. istoé
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