Câncer
Com a criação de novas nomenclaturas para os diferentes tipos de tumor, o número de tratamentos excessivos e desnecessários poderá ser reduzido
Guilherme Rosa
Com as melhorias nas técnicas de exame, os médicos têm
descoberto cada vez mais casos de câncer em seus estágios iniciais. O
problema é que algumas das lesões descobertas poderiam nunca atacar
outros tecidos do corpo
(Thinkstock)
CONHEÇA A PESQUISA
Título original: Overdiagnosis and Overtreatment in Cancer: An Opportunity for Improvement
Onde foi divulgada: periódico Journal of the American Medical Association
Quem fez: Laura J. Esserman, Ian M. Thompson e Brian Reid
Instituição: Universidade da Califórnia, EUA; entre outras
Resultado: O Instituto Nacional de Câncer dos Estados Unidos, órgão que coordena o programa nacional de tratamento da doença, reuniu um grupo de três especialistas com o objetivo de elaborar um plano para melhorar os diagnósticos de câncer. O principal problema detectado pelos pesquisadores é o grande número de tratamentos desnecessários, voltados a lesões que ainda não tinham se tornado malignas
Por causa disso, um grupo de pesquisadores americanos publicou nesta segunda-feira um artigo na revista Journal of the American Medical Association em
que propõem uma atualização da própria definição do que é — e o que não
é — câncer. Segundo os cientistas, nos últimos anos houve um grande
avanço no conhecimento da biologia e do desenvolvimento dos vários tipos
de câncer. Isso possibilitaria uma mudança no modo como os diversos
casos são encarados pelos médicos. “Hoje, reconhecemos que o câncer não é
uma doença, mas um grande número de doenças diferentes. Temos que
individualizar o tratamento baseados na biologia do tumor, evitando o
tratamento desnecessário”, diz Laura J. Esserman, pesquisadora da
Universidade da Califórnia e uma das autoras do artigo.Título original: Overdiagnosis and Overtreatment in Cancer: An Opportunity for Improvement
Onde foi divulgada: periódico Journal of the American Medical Association
Quem fez: Laura J. Esserman, Ian M. Thompson e Brian Reid
Instituição: Universidade da Califórnia, EUA; entre outras
Resultado: O Instituto Nacional de Câncer dos Estados Unidos, órgão que coordena o programa nacional de tratamento da doença, reuniu um grupo de três especialistas com o objetivo de elaborar um plano para melhorar os diagnósticos de câncer. O principal problema detectado pelos pesquisadores é o grande número de tratamentos desnecessários, voltados a lesões que ainda não tinham se tornado malignas
Os autores argumentam que a palavra câncer invoca a ideia de um processo comum a todos os tipos da doença e que leva inevitavelmente à morte. “Apesar de o entendimento da biologia do câncer ter mudado dramaticamente, a percepção por parte do público e entre muitos médicos ainda não mudou: ele ainda é percebido como um diagnóstico com consequências fatais, caso não seja tratado”, diz Esserman. Na verdade, há muitos tipos de câncer, e alguns tumores podem ficar inertes durante toda a vida do paciente. Os pesquisadores sugerem que esse tipo de tumor tenha outro nome: lesão indolente de origem epitelial (IDLE, na sigla em inglês).
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Reunião de especialistas — As recomendações foram elaboradas por um grupo de três especialistas formado após reuniões do Instituto Nacional de Câncer dos Estados Unidos, com o objetivo de traçar uma estratégia para melhorar as abordagens atuais de diagnóstico. Segundo os pesquisadores, os tratamentos desnecessários costumam acontecer, principalmente, nos casos de cânceres de mama, pulmão, próstata, tireoide e melanoma.
Entre as sugestões elaboradas pelos cientistas está a de reconhecer que os exames realizados hoje em dia vão detectar tanto cânceres graves quanto os indolentes e elaborar, de modo interdisciplinar, um critério para reclassificar as condições da doença. A chave seria melhorar as técnicas de diagnóstico existentes, identificando apenas os tumores que mereçam atenção médica. “Devemos individualizar os exames, focando os casos que podem levar a doenças agressivas e à morte”, diz Esserman.
As soluções elaboradas pelos especialistas ainda estão longe de chegar aos consultórios. Atualmente, na maioria das vezes, os médicos não têm como saber se um câncer vai se desenvolver ou não, e, com a vida do paciente ameaçada, acabam adotando a estratégia mais segura: combater os tumores que surgirem. “Nenhum médico quer fazer diagnósticos e tratamentos excessivos, mas, no atual estágio do conhecimento, a decisão de não tratar um paciente tem que ser muito bem pesada”, diz Maria do Socorro Maciel, diretora do núcleo de Mastologia do Hospital A. C. Camargo. O documento serve, no entanto, como um indicador do que deve acontecer com as pesquisas e os tratamentos do câncer nos próximos anos, cada vez mais voltados ao combate de tipos específicos de tumores.
Opinião da especialista
Maria do Socorro Maciel Diretora do Núcleo de Mastologia do Hospital A. C. Camargo.
“A pesquisa aponta um problema comum: os médicos detectam os cânceres de forma cada vez mais precoce, mas acabam descobrindo também lesões que não terão impacto na sobrevida do paciente. Com as melhorias na mamografia, por exemplo, temos uma detecção cada vez mais precoce dos tumores, mas descobrimos lesões que ainda não sabemos completamente como vão se desenvolver. Ninguém quer tratar desnecessariamente um paciente, mas, a partir do momento em que não sabemos como o câncer vai evoluir, a decisão de não tratar alguém é muito delicada.
“Nesse sentido, uma mudança na nomenclatura poderia até ser bem vinda, pois o paciente pode estranhar o fato de um médico decidir não tratar, mas apenas acompanhar um caso de câncer. O problema é que essa mudança na nomenclatura não pode vir antes de entendermos melhor como funcionam essas lesões. Os pesquisadores precisam estudar mais as heterogeneidades do câncer e dos pacientes, para decidir o que deve ser tratado ou não. Quando pudermos entender a evolução dessas lesões, aí sim veremos uma reviravolta nos tratamentos.
“Em seu artigo, os pesquisadores citaram o carcinoma ductal da mama in cito como um exemplo de câncer que deveria passar a ser chamado de IDLE. Ele é uma lesão formada por células que cresceram dentro do canal do leite. Só uma parcela deles vai realmente se transformar em um tumor invasor, mas ainda estamos apenas começando a entender sua biologia e não temos condição de saber quais podem acarretar metástase. Ele pode nunca se desenvolver e causar danos ao paciente, mas, ao fazer o diagnóstico, qual deve ser a decisão do médico? Hoje em dia, o tratamento mais utilizado tem sido retirar a lesão por meio de cirurgia. Enquanto os conhecimentos sobre a biologia desse tipo de tumor não aumentarem — e houver marcadores celulares que ajudem a saber quais têm maiores de condições de evoluir — o tratamento é a decisão que submete o paciente a menos risco.”
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