Combinação de medicamentos encolheu ou eliminou tumores em um quarto das pacientes em 11 dias. Uma combinação de dois remédios mostrou ser capaz de encolher significativamente ou mesmo eliminar os tumores de pouco mais de um quarto das pacientes de um tipo particularmente agressivo de câncer de mama em apenas 11 dias, um resultado que foi considerado “espantoso” pelos pesquisadores tanto pela rapidez da resposta quanto pelo tratamento não incluir nenhum medicamento quimioterápico, como é o padrão na abordagem clínica desses casos. Apresentado ontem durante a 10 ª Conferência Europeia de Câncer de Mama, o estudo, embora limitado, abre caminho para algumas mulheres vítimas da doença escaparem dos muitos incômodos da quimioterapia, além de terem a chance de preservar ao menos parte de seus seios na subsequente cirurgia para remoção dos tumores, num importante ganho estético e psicológico.
Chamados lapatinibe e trastuzumabe, os dois medicamentos atuam de forma diferente contra o câncer de mama do tipo conhecido como HER2 positivo. Essa variante atinge cerca de 20% das vítimas da doença e é caracterizada pelo crescimento acelerado e invasivo dos tumores. Por isso, o protocolo padrão pede que eles sejam atacados com força total e sejam removidos cirurgicamente, especialmente quando diagnosticados na sua fase inicial.
O estudo, financiado pelo Instituto de Pesquisas do Câncer do Reino Unido e pelo laboratório farmacêutico GlaxoSmithKline (GSK), fabricante do lapatinibe, envolveu 257 mulheres recém-diagnosticadas com câncer de mama HER2 positivo recrutadas entre 2010 e 2015. Na primeira fase do ensaio clínico, 130 delas foram distribuídas aleatoriamente em três grupos: um de controle, que não recebeu nenhum tratamento nos 11 dias prévios à cirurgia; outro em que foram medicadas apenas com o trastuzumabe durante esse tempo; e um terceiro ao qual foi administrado só o lapatinibe. Mas ainda durante este período inicial do estudo, outras pesquisas apontaram uma maior eficácia da combinação dos dois remédios. Assim, na segunda parte do ensaio, as 127 pacientes seguintes foram divididas novamente em três grupos: o de controle, que continuou sem receber qualquer medicação; um segundo tratado só com trastuzumabe; e um último que recebeu a combinação dos dois remédios durante os 11 dias.
Nesta fase, os resultados das análises feitas depois da cirurgia mostraram que, entre as mulheres que seguiram o tratamento combinado, 11% tiveram uma resposta patológica completa (PCR, na sigla em inglês), isto é, não foram encontradas células cancerosas nos tecidos removidos, enquanto em 17% foi registrada uma doença mínima residual ( MRD, também na sigla em inglês), ou seja, o tumor encolheu para um diâmetro de menos de cinco milímetros. Já entre as que receberam apenas o trastuzumabe, nenhuma viu o tumor desaparecer e só 3% estavam com a doença mínima residual, enquanto no grupo de controle nenhuma paciente experimentou qualquer melhora.
— Isto tem o potencial de mudar paradigmas porque nos permite identificar um grupo de pacientes que, em apenas 11 dias, vê seus tumores desaparecerem só com a terapia contra o HER2, e que potencialmente pode não precisar de uma quimioterapia subsequente — destacou Nigel Bundred, professor de cirurgia oncológica da Universidade de Manchester que fez a apresentação do estudo na conferência europeia. — Isso nos dá a oportunidade de personalizar o tratamento para cada mulher com base na resposta precoce, permitindo identificar pacientes que possam evitar a quimioterapia.
JANELA ENTRE DIAGNÓSTICO E CIRURGIA - Diretora do Instituto de Pesquisas do Câncer do Reino Unido e colíder do ensaio, Judith Bliss também viu vantagens na rapidez da resposta ao tratamento sem quimioterapia vista no estudo, alertou que ainda será preciso confirmar os resultados com experimentos mais amplos e por mais tempo.
— Nosso ensaio se propôs a usar a janela entre diagnóstico e cirurgia para procurar pistas sobre o tratamento combinado nos tumores HER2 positivos, mas foi inesperado ver uma resposta tão dramática em apenas 11 dias — disse. — Nossos resultados são uma forte fundação para construir outros experimentos de terapias combinadas anti- HER2 prévias à cirurgia que reduzam o número de mulheres que necessitem de quimioterapia subsequente, que também é muito efetiva, mas pode ter efeitos colaterais de longo prazo.
Assim como a pesquisadora britânica, Sergio Daniel Simon, diretor do Centro Paulista de Oncologia e coordenador do Grupo Brasileiro de Estudos em Câncer de Mama, lembra que existem outros protocolos mais eficientes que a combinação lapatinibe e trastuzumabe para o ataque inicial aos tumores HER2 positivos. Ele cita como exemplo o principal padrão atual, que une o trastuzumabe a outro remédio da mesma classe, chamado pertuzumabe, com o quimioterápico docepaxel, e que num prazo entre quatro e seis meses de tratamento pré- cirúrgico elimina os tumores em até 65% das mulheres. Assim, embora acredite que o estudo não vá provocar grandes mudanças na abordagem dos casos.
— O mais interessante do estudo é o tempo que a combinação de drogas leva para fazer efeito, que é relativamente curto — diz. — Mas já temos coisas melhores disponíveis, com resultados muito superiores à essa combinação, então não acho que ele vá alterar a conduta de tratamento atual.
Presidente da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica ( SBOC), Gustavo Fernandes tem opinião parecida. Ele ressalta, porém, que o que este estudo e outros do tipo procuram primordialmente é uma maneira de reduzir o número de mulheres que sofrem com a quimioterapia nesses casos.
— A taxa de resposta desta combinação em si não é brilhante, mas o que se busca é por uma alternativa de tratamento sem quimioterapia justamente por causa de seus muitos efeitos adversos — conta. — É uma janela que se abre, mas não vai ser fácil mudar o padrão atual, pois o que já temos é muito bom. Afinal, ninguém em sã consciência troca uma taxa de eficiência de 65% por uma de 17%
Por Cesar Baima / O Globo
Nenhum comentário:
Postar um comentário