4.22.2013

Eu nunca entendi Godard


Deu no jornal que um centro cultural carioca prepara, ainda para este ano, a maior mostra já feita no país de filmes de Godard. Ressalvando o direito de qualquer centro cultural organizar mostras sobre qualquer cineasta, não consigo deixar de perguntar: por quê? Será que é para ver se desta vez, a gente entende?
Já disse aqui, mais de uma vez, que não fiz parte da Geração Paissandu. Embora todo mundo acredite, talvez pela minha aparência, que eu já assistia às sessões de cinematógrafo na Rua do Ouvidor, eu era menor de idade quando a nouvelle vague brilhava na sala da Rua Senador Vergueiro.
Godard já tinha feito alguns de seus melhores... hummm... mais bem sucedidos filmes quando um de seus títulos me chamou a atenção. Era “Duas ou três coisas que eu sei dela”, de 1967, que esteve em cartaz no Cine Excelsior, em Juiz de Fora. O mundo já tinha visto “Acossado”, “O desprezo” e “Alphaville”, quando “Duas ou três coisas...’ apareceu. O que me atraía no filme era mesmo o título. Parecia-me enigmático. Quando li no jornal que era “uma espécie de documentário’, fiquei mais curioso. Como um documentário poderia ser “uma espécie de”? Quando soube que a “ela” do título era Paris e não uma mulher, fiquei mais intrigado ainda. Ou Godard estava querendo me dizer que Paris era uma mulher? Não cheguei a ver o filme. Ele ficou só três dias no Excelsior. Juiz de Fora, definitivamente, não estava preparada para “uma espécie de documentário’. Nunca entendi por que “Duas ou três coisas que eu sei dela” foi programado pelo cinema. O Excelsior era onde a gente assistia à “A noviça rebelde”. Dá para imaginar a reação de sua plateia diante de um Godard.
Só fui conhecer Godard de verdade quando o Cinema I, a sala da Prado Júnior, se transformou numa espécie de enciclopédia de cinema para cinéfilos da minha geração. Era Godard todo sábado à meia noite. “Made in USA”, “A chinesa”, “Weekend à francesa”... Logo fiz minha lista de favoritos: “Alphaville”, “O demônio das onze horas”... aqui é preciso esclarecer um ponto para quem vai se iniciar em Godard na tal mostra em preparação. Nunca diga o nome de um filme de Godard em sua versão brasileira. “O demônio das onze horas”, então, é “Pierrot le fou”, como no original. “Masculino-Feminino” vira “Masculin-Feminin”. Godard em francês é mais inteligente.
Passei horas no Cervantes discutindo cada plano de cada filme de Godard com meus companheiros de madrugadas no Cinema I. Muitos desses planos eu sequer tinha visto. Agora confesso: Godard me convidava ao sono. Assisti a “Pierrot Le fou” recentemente num canal a cabo e, no fim, só fiquei com uma questão: por que cargas d’água eu dizia que gostava disso?
Tem um Godard de que gosto até hoje. É um curta-metragem _ ‘Montparnasse-Levallois” _, um dos segmentos do filme em episódios “Paris vu par...” (nunca na História deste país alguém chamou o filme de “Paris visto por...”). É uma historinha com começo, meio e fim. Uma brincadeira sobre um desencontro amoroso. Nem parece um filme do cineasta. Um Godard romântico e irresistível. É só. No mais, não tenho vergonha de admitir: eu nunca entendi Godard. Mas vou aproveitar a supermostra para, enfim, conhecer “Duas ou três coisas que eu sei dela”.
Blog do Arthur Xexeo

Nenhum comentário: