Juíza decreta a prisão dos 10 policiais denunciados por tortura seguida de morte e ocultação de cadáver, e deixa claro que decisão visa a evitar coação de testemunhas
Rio - A antiga cúpula da Unidade de Polícia
Pacificadora (UPP) da Rocinha foi presa nesta sexta-feira, acusada de
torturar e matar o pedreiro Amarildo de Souza, de 47 anos, que
desapareceu no dia 14 de julho. Os dez policiais militares denunciados —
entre eles o major Edson Santos, ex-comandante, e o tenente Luiz Felipe
de Medeiros, subcomandante — se entregaram no Quartel General da PM no
fim da tarde desta sexta. Eles vão ficar na Unidade Prisional, antigo
BEP, em Benfica. “Vou escrever um livro”, afirmou Edson, ao se
apresentar para ser detido.
As prisões foram decretadas pela juíza Daniella Alvarez Prado, da 35ª Vara Criminal. “A medida drástica se mostra como único modo eficaz a se garantir a efetividade da atividade jurisdicional (...) e evitar turbações à marcha processual, como a coação de testemunhas”, ressaltou, na decisão. Até esta sexta, quatro dos envolvidos no caso ainda estavam trabalhando na UPP Rocinha. O grupo foi denunciado por tortura seguida de morte e ocultação de cadáver pelos promotores Homero das Neves Freitas, Alexandre Murilo Graça e Márcio Nobre. As penas podem chegar a mais de 20 anos.
Telefonema para incriminar traficante
Um dos denunciados no caso Amarildo forjou gravação telefônica, dia 18 de julho, para incriminar traficantes pelo crime. Na ocasião, sabendo qual o número de telefone apreendido na operação Paz Armada, o policial ligou de um celular de morador para o aparelho. Ele teria garantido ser o traficante ‘Catatau’, responsável pela morte de Amarildo.
Caveira do Batalhão de Operações Especiais (Bope), o major Edson Santos, ex-comandante da UPP Rocinha, é acusado de coagir testemunhas. Ele e outros policiais teriam prometido pagar aluguel de casa fora da favela para que uma mulher e seu filho responsabilizassem traficantes pela morte de Amarildo. Há três pessoas no Programa de Proteção a Testemunha.
Como O DIA publicou com exclusividade em setembro, o Ministério Público também apura outras casos de tortura na Rocinha. Há relatos estarrecedores de que, pressionada por policiais da UPP que a acusavam de envolvimento com o tráfico de drogas, uma adolescente teria sido obrigada a ficar nua diante dos policiais.
Outra vítima alega ter tido a casa invadida e um PM, para afrontá-la, abriu a geladeira, pegou um refrigerante e refestelou-se em sua cama.
"Chegou a tua hora"
No inquérito sobre o desaparecimento do pedreiro Amarildo de Souza, 22 pessoas contaram que foram torturadas pelos PMs sob o comando do major Edson Santos, então comandante da UPP Rocinha. Amarildo não teria resistido a choques elétricos, ingestão de cera derretida e outras torturas e morrido por volta da meia-noite do dia 14 de julho, quando foi visto pela última vez. A sessão de maus tratos teria ocorrido na mata ou no contêiner da UPP Rocinha.
“Todos os 10 PMs indiciados foram monitorados em suas ligações telefônicas autorizadas pela Justiça e pegamos, por exemplo, o soldado Marlon Campos, falando para a namorada ‘eles já sabem, mas quero ver provar’ ou ainda o major Edson tentando combinar um depoimento com o soldado Douglas Vidal”, detalhou o titular da Divisão de Homicídios Rivaldo Barbosa.
O delegado também contou que uma testemunha ouviu o soldado Douglas falar para Amarildo, na hora em que ele foi levado pelos PMs: “Boi (apelido do pedreiro), perdeu. Chegou a tua hora”.
Para a delegada Helen Souto, da DH, a sede da UPP Rocinha se tornou o lugar ideal para a tortura de Amarildo no dia 14 de julho. “Ele foi levado para lá numa noite chuvosa de domingo, próximo à mata e com câmeras em volta que pararam de funcionar às 8h22 daquele dia. Eles o pegaram para trabalhar (torturar) a vítima em busca da informação que queriam e que acreditavam que Amarildo tinha: onde estava o paiol de armas do tráfico”, disse Helen.
Oito corpos não identificados e ossadas encontrados em todo o Estado do Rio serão analisados e o material genético deles confrontados com o DNA de familiares de Amarildo. “A Divisão de Homicídios vai seguir buscando o corpo dele (Amarildo). Inclusive faremos uma operação na semana que vem”, adiantou Rivaldo Barbosa. As restos mortais encontrados em Resende, Sul-Fluminense, no último dia 15 não é do pedreiro desaparecido, segundo Helen Souto. (Flávio Araújo)
As prisões foram decretadas pela juíza Daniella Alvarez Prado, da 35ª Vara Criminal. “A medida drástica se mostra como único modo eficaz a se garantir a efetividade da atividade jurisdicional (...) e evitar turbações à marcha processual, como a coação de testemunhas”, ressaltou, na decisão. Até esta sexta, quatro dos envolvidos no caso ainda estavam trabalhando na UPP Rocinha. O grupo foi denunciado por tortura seguida de morte e ocultação de cadáver pelos promotores Homero das Neves Freitas, Alexandre Murilo Graça e Márcio Nobre. As penas podem chegar a mais de 20 anos.
“O herói nacional é o personagem
capitão Nascimento, que ensina a colocar saco na cabeça dos outros.
Precisamos acabar com este modelo distorcido de polícia”, disse Homero,
referindo-se ao filme ‘Tropa de Elite’. A tortura seria um dos métodos
da equipe do major Edson para arrancar das vítimas informações sobre
traficantes da Rocinha.
Para o secretário de Segurança, José Mariano
Beltrame, cabe a Justiça definir agora se os PMs são culpados ou
inocentes. “Houve empenho da Secretaria de Segurança, através da Divisão
de Homicídios, que deu prioridade ao caso. Administrativamente, a PM
tomará as providências. O importante agora é manter a integridade da UPP
Rocinha, que tem a aprovação da maioria dos moradores”.
Segundo investigações, Amarildo foi
preso porque um informante do soldado Douglas Roberto Vital Machado, o
Cara de Macaco, garantiu que ele tinha a ‘chave do paiol’ dos
traficantes da parte baixa da Rocinha. Os PMs estariam inconformados com
o fracasso da operação ‘Paz Armada’, feita em parceria com a 15ª DP
(Gávea), que identificou 58 supostos criminosos. Amarildo foi preso e
levado à sede da UPP, antes de seguir para o Parque Ecológico, onde foi
submetido a uma sessão de tortura e não resistiu. Ele era epilético
Major vai escrever livro
Dentro da Unidade Prisional da PM, em
Benfica, o ex-comandante da UPP da Rocinha, major Edson Santos, terá
tempo para refletir e rascunhar a sua defesa das acusações de tortura
contra o pedreiro Amarildo. Ao se apresentar ontem no Quartel-General da
PM, após a decretação de sua prisão, ele disse que vai escrever um
livro na cadeia. “Tudo o que tenho a dizer sobre isso (caso Amarildo)
estará no livro. Não quero falar nada por enquanto. No final, todos vão
saber a verdade”, disse Edson.
Os dez policiais chegaram ao QG pouco antes das
18h, após a decretação da prisão pela Justiça. O grupo se apresentou à
Diretoria Geral de Pessoal da PM. Os acusados ficaram a maior parte do
tempo na varanda, em frente à sala do Estado-Maior. Enquanto o advogado
de quatro deles, Marcos Espínola, se dirigia ao comandante-geral,
coronel Luís Castro, os policiais aproveitaram os últimos minutos de
liberdade para telefonar e tranquilizar parentes. Conversaram e beberam
água.Telefonema para incriminar traficante
Um dos denunciados no caso Amarildo forjou gravação telefônica, dia 18 de julho, para incriminar traficantes pelo crime. Na ocasião, sabendo qual o número de telefone apreendido na operação Paz Armada, o policial ligou de um celular de morador para o aparelho. Ele teria garantido ser o traficante ‘Catatau’, responsável pela morte de Amarildo.
Caveira do Batalhão de Operações Especiais (Bope), o major Edson Santos, ex-comandante da UPP Rocinha, é acusado de coagir testemunhas. Ele e outros policiais teriam prometido pagar aluguel de casa fora da favela para que uma mulher e seu filho responsabilizassem traficantes pela morte de Amarildo. Há três pessoas no Programa de Proteção a Testemunha.
O advogado disse que não deve entrar
com recurso para a soltura de seus clientes, por enquanto. Espínola
afirmou que o argumento para a decretação da prisão foi fraco. “Eles não
atrapalham a instrução criminal. Nossa defesa será baseada no fato de
que eles não cometeram crime porque liberaram o Amarildo”, disse o
advogado, apesar de não apresentar outras testemunhas que teriam
presenciado a liberação, além dos próprios acusados.
Abusos e torturas
‘Bonde do Vital’ ou ‘Bonde do Cara de Macaco’.
Assim é chamada na denúncia do Ministério Público a guarnição da UPP
Rocinha formada pelos soldados Douglas Roberto Vital Machado, Marlon
Campos Reis, Jorge Luís Gonçalves Coelho e Victor Vinicius Pereira da
Silva.
Como O DIA publicou com exclusividade em setembro, o Ministério Público também apura outras casos de tortura na Rocinha. Há relatos estarrecedores de que, pressionada por policiais da UPP que a acusavam de envolvimento com o tráfico de drogas, uma adolescente teria sido obrigada a ficar nua diante dos policiais.
Outra vítima alega ter tido a casa invadida e um PM, para afrontá-la, abriu a geladeira, pegou um refrigerante e refestelou-se em sua cama.
"Chegou a tua hora"
No inquérito sobre o desaparecimento do pedreiro Amarildo de Souza, 22 pessoas contaram que foram torturadas pelos PMs sob o comando do major Edson Santos, então comandante da UPP Rocinha. Amarildo não teria resistido a choques elétricos, ingestão de cera derretida e outras torturas e morrido por volta da meia-noite do dia 14 de julho, quando foi visto pela última vez. A sessão de maus tratos teria ocorrido na mata ou no contêiner da UPP Rocinha.
“Todos os 10 PMs indiciados foram monitorados em suas ligações telefônicas autorizadas pela Justiça e pegamos, por exemplo, o soldado Marlon Campos, falando para a namorada ‘eles já sabem, mas quero ver provar’ ou ainda o major Edson tentando combinar um depoimento com o soldado Douglas Vidal”, detalhou o titular da Divisão de Homicídios Rivaldo Barbosa.
O delegado também contou que uma testemunha ouviu o soldado Douglas falar para Amarildo, na hora em que ele foi levado pelos PMs: “Boi (apelido do pedreiro), perdeu. Chegou a tua hora”.
Para a delegada Helen Souto, da DH, a sede da UPP Rocinha se tornou o lugar ideal para a tortura de Amarildo no dia 14 de julho. “Ele foi levado para lá numa noite chuvosa de domingo, próximo à mata e com câmeras em volta que pararam de funcionar às 8h22 daquele dia. Eles o pegaram para trabalhar (torturar) a vítima em busca da informação que queriam e que acreditavam que Amarildo tinha: onde estava o paiol de armas do tráfico”, disse Helen.
Oito corpos não identificados e ossadas encontrados em todo o Estado do Rio serão analisados e o material genético deles confrontados com o DNA de familiares de Amarildo. “A Divisão de Homicídios vai seguir buscando o corpo dele (Amarildo). Inclusive faremos uma operação na semana que vem”, adiantou Rivaldo Barbosa. As restos mortais encontrados em Resende, Sul-Fluminense, no último dia 15 não é do pedreiro desaparecido, segundo Helen Souto. (Flávio Araújo)
Nenhum comentário:
Postar um comentário