Articulações para o novo ministério estão a todo vapor
Desta vez, a montagem da equipe será mais importante do que no início do
primeiro mandato: Dilma terá de mostrar se entendeu recado das urnas
por André Barrocal
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Ichiro Guerra/ Dilma 13
Dilma Rousseff viajou
na quarta-feira, 29, para descansar por quatro dias da exaustiva
campanha da reeleição. Refugiou-se na base naval de Aratu, na Bahia,
estado que lhe deu 5 milhões de votos. Na Baía de Todos os Santos, perto
do governador Jaques Wagner, petista em ascensão e rumo a Brasília, a
presidenta refletiria sobre a vitória apertada e começaria a amadurecer
ideias para o novo ministério. A montagem da equipe será mais importante
do que no início do primeiro mandato. Mostrará se de fato ela entendeu o
recado das urnas e está disposta ao diálogo. Dilma levou na cabeça
alguns planos. E teria de preparar bem o espírito para aquela que
considera “a” escolha de seu próximo governo, o ministro da Fazenda.
O favorito é o economista Nelson Barbosa,
número 2 na pasta até junho de 2013. Há só um problema. No Instituto
Lula viceja a defesa de um representante empresarial, para facilitar a
reconstrução de pontes com o setor. Logo após o triunfo no domingo 26,
os lulistas fizeram circular uma sugestão ousada, Luiz Carlos Trabuco,
presidente do Bradesco. Quando soube, um ministro comentou em voz alta
que a carta tinha saído da manga de Lula. Uma ideia lançada para
influenciar os pensamentos de Dilma no retiro baiano, pois logo ela se
sentará com o antecessor para conversar a respeito da escalação do novo
time.
A presidenta recebeu a sugestão com
perplexidade, pelo que se ouve no Palácio do Planalto. Ela gosta de
Trabuco, a quem já recepcionou no gabinete, e o Bradesco nunca se
engajou na campanha contra o governo desencadeada no mundo do dinheiro.
Mas como nomear um banqueiro, pergunta-se no Planalto, após a campanha
dilmista ter amaldiçoado Neca Setubal, apoiadora de Marina Silva, e
Arminio Fraga, aliado de Aécio Neves? Sempre é possível minimizar as
contradições entre o discurso de campanha e a prática da
governabilidade. Trabuco formou-se em uma faculdade de filosofia e fez
pós-graduação em sociopsicologia. Comanda um banco mais afinado com a
clientela de baixa renda e não é dono da instituição. Insuficiente,
porém, para impedir Dilma de dar um sinal de rendição. Na visão do
Planalto, além do PSDB, as urnas derrotaram o mercado financeiro.
Dilma acredita ainda que sua afinação com
Barbosa seria mais fácil, pois os dois trabalharam juntos, o que
aceleraria a tomada de decisão em uma área vital. Por orientação dela, o
economista foi sondado há alguns meses para voltar a Brasília. Gleisi
Hoffmann, então chefe da Casa Civil, convidou-o para ser seu braço
direito. Barbosa não aceitou, por antever a mesma situação que o levara a
demitir-se da Fazenda, o choque com o secretário do Tesouro Nacional,
Arno Augustin. Preferiu dar aulas e colaborar com o Instituto Lula.
Com ou sem Barbosa, Augustin deixará o
cargo, por si só um calmante injetado na veia do mercado. Ele
personifica a criticada “contabilidade criativa” que maquiou as contas
públicas. Antes das férias, a presidenta autorizou a equipe a planejar
um corte considerável de gastos em 2015, a fim de melhorar as finanças
estatais. Em outro gesto capaz de agradar ao mercado, o Banco Central
voltou a subir o juro. A taxa estava em 11% desde abril e foi a 11,25%,
recorde mundial. É como resumiu um ministro sobre o segundo mandato: o
governo virará à direita na economia para tentar ir à esquerda no
social.
Se resiste a colocar um banqueiro na
Fazenda, Dilma estaria inclinada a convidar dois empresários para postos
estratégicos na relação com o setor privado. O industrial Josué Gomes
da Silva deve ir para o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e
Comércio e a ruralista Kátia Abreu para a Agricultura. Ambos são do PMDB
e concorreram ao Senado, mas só ela venceu. Durante a disputa, o
mineiro Gomes da Silva foi convidado por Dilma, mas optou por seguir na
eleição. Queria repetir o falecido pai, José Alencar, vice de Lula. Há,
porém, um conflito de interesses que ainda precisa ser resolvido pelos
juristas de plantão. Ele é dono da Coteminas, empresa da qual é sócio o
BNDES, banco de fomento subordinado à pasta que o empresário comandaria.
Não há entraves do tipo a atrapalhar a designação de Kátia
Abreu. Só a ira de movimentos ligados às causas indígenas e à reforma
agrária. A senadora pelo Tocantins comanda a Confederação Nacional da
Agricultura e Pecuária e acaba de renovar o mandato por mais três anos.
Como todo bom líder do campo, não vê motivo para demarcar terras
indígenas ou quilombolas, nem para fazer novos assentamentos. Mas ela se
dá bem com Dilma e a presidenta precisa de um melhor trânsito no
agronegócio, principalmente depois do boicote do setor e de estados
produtores na eleição.
A indicação dos
empresários, se confirmada, repetiria uma fórmula do início do governo
Lula que tem sido citada como referência da nova gestão. Seria uma
prova do prometido diálogo. Também a exemplo do primeiro mandato de
Lula, o futuro primeiro escalão terá mais peso político. É uma questão
de sobrevivência. Para lidar com o mais fisiológico e conservador
Congresso em décadas e com o rancor da oposição, fortalecida pela
votação apertada, só com auxiliares experientes. Estão bem cotados o
ex-prefeito paulistano Gilberto Kassab, do PSD, e o governador do Ceará
em fim de mandato, Cid Gomes, do PROS.
Antes de negociar com os partidos, Dilma
vai resolver pendências da “cozinha” do Planalto. Ela pretende ter como
secretário-geral da Presidência o gaúcho Miguel Rossetto, um de seus
porta-vozes na campanha. Sindicalista e próximo dos sem-terra, Rossetto
assumiria as negociações com os movimentos sociais, função desempenhada
até agora por Gilberto Carvalho. Ligado a Lula, Carvalho gostaria de
permanecer no governo e aceitaria outro cargo.
Quanto à Casa Civil, Aloizio Mercadante
tende a permanecer. Depois de nove meses de convívio, avalia-se que o
ministro deu conta de gerenciar o governo e conquistou a confiança da
presidenta. Em conversas reservadas, o economista revela o desejo de
continuar no posto, embora tenha sonhado com a Fazenda (atualmente
defende a solução “Nelson Barbosa”). Os óbices? Mercadante não tem o
apreço de Lula e de grande parte do PT. É descrito como excessivamente
individualista e pouco conciliador, características não recomendadas
para o cargo. Paira, neste caso, o espectro de Jaques Wagner.
O governador da Bahia é candidato a
protagonista na segunda gestão Dilma. Elegeu um “poste” como sucessor no
primeiro turno e acaba de garantir 70% dos votos à presidenta no quarto
maior colégio eleitoral do País. Tem o apreço da mandatária, com quem
dividiu o primeiro escalão de 2003 a 2006, e do ex-presidente. Lula não
ficaria nada triste em vê-lo na Casa Civil, com seu estilo negociador a
compensar o pouco jogo de cintura de Dilma. Nem Wagner, que dá sinais de
cobiçar o cargo, mas o faz em segredo, para não chatear Mercadante. Um
outro desfecho depende do tête-à-tête entre Dilma e Lula. Mesmo se não
ocupar a Casa Civil, Wagner certamente terá um posto destacado.
A vitória apertada no domingo 26 abre
espaço para Lula influenciar os rumos do novo governo. Sem o
ex-presidente nas ruas na reta final da campanha, o resultado
provavelmente teria sido outro. Sua presença se tornará constante a
partir de 2015, revela um conselheiro, mesmo se a aproximação gerar
atritos com a sucessora. Lula está convencido da necessidade de
regulação econômica das emissoras de tevê e rádio e vai defendê-la.
Dilma afirma apoiar a proposta, mas no início de seu primeiro mandato
engavetou o projeto elaborado pelo ministro Franklin Martins no fim do
governo Lula. Se Ricardo Berzoini for deslocado das Relações
Institucionais para as Comunicações, haverá boas chances de prosperar o
novo marco regulatório, necessário por causa das mudanças tecnológicas e
do avanço da internet. O desenlace deve ser rápido, pois o tempo não
está ao lado da presidenta.
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