2.07.2012

O difícil consenso em nutrição – os laticínios na berli


Há poucos meses a universidade de Harvard nos EUA lançou um comunicado se posicionando contra a decisão recente dos especialistas em nutrição do ministério da agricultura dos Estados Unidos que incluíram um laticínio em seu novo guia alimentar. Esse novo guia substituiu a Pirâmide Alimentar e passou a ter o formato de um prato, sendo chamado My Plate e incluiu um laticínio.
Para entendermos a discussão e suas nuances, precisamos entender o que são as Recomendações Nutricionais, as RDAs. Elas são reconhecidas como importantes índices que nos indicam os níveis ideais dos nutrientes essenciais para manter nossa saúde. O cálcio é um bom exemplo disso e tem tudo a ver com a inclusão dos laticínios nos programas que alimentação saudável. As RDAS desse mineral são de 800 a 1300mg/dia para adultos.
A partir daí, nós podemos entender a importância do leite e dos seus derivados em uma alimentação saudável. Compare as concentrações de cálcio nos principais alimentos fontes e imagine a dificuldade em montar um cardápio que alcance as recomendações do mineral diariamente sem os laticínios. Depois, siga o principal ensinamento da nutrição saudável que é compor cardápios variáveis. Nem precisa ser um profissional da Nutrição para entender isso.
300mg de cálcio em média
•           1 copo de 200ml leite
•           1 pote de 200ml iogurte
•           1 fatia de 50 gramas de queijo
Outros alimentos fonte de cálcio, além dos laticínios
•           100g de feijão branco cozido  – 90mg de cálcio
•           100g de couve manteiga crua – 145mg
•           100g de brócolis cru – 47mg
•           100g de peixes (sardinha, manjuba, traíra) – 500mg
Daí a nossa surpresa quando em setembro de 2011 a Universidade de Harvard se pronuncia contra a inclusão dos laticínios como um componente da alimentação saudável, alegando que esse detalhe seria visto como um lobby dos produtores desses alimentos. Então podemos pensar em lobby dos agricultores ou dos piscicultores caso resolvemos montar um cardápio com 200 gramas de sardinha ou quatro pés de couve diariamente para atendermos as recomendações de cálcio. Ou o que é ainda mais inconsistente, passar a usar leite de soja suplementado com cálcio, mesmo podendo usar um leite desnatado e que já vem com o cálcio da própria natureza. Seria então o lobby da soja? E olhe que ele é também poderoso!
O mais impressionante foram as argumentações. A primeira seria pelo alto teor de gorduras saturadas, o que é totalmente improcedente, pois não há na indústria de alimentos nenhuma que evoluiu tanto quanto os laticínios desnatados. A gordura deixou há muito tempo de ser um problema nos laticínios. A segunda, seria a maior incidência de câncer de próstata e de ovário entre os usuários dos laticínios, uma vez que esses dados vem de estudos populacionais, que não devem ser utilizados para tomar condutas médicas. Esses estudos servem apenas para conduzir estudos de intervenção.
Fazer uma dieta com couve, peixe e feijões não deixa de ser saudável, mas impraticável pela sua monotonia dos alimentos fontes de cálcio e mesmo assim não consegue alcançar as RDAs do mineral. Suplementar o cálcio? Mas isso sim, seria o absurdo frente as nossas amplas fontes naturais de cálcio nos laticínios  e às evidências recentes da maior incidência de doença coronariana em pessoas que fazem essa suplementação.
Os pesquisadores da Harvard também levantaram a dúvida de que os laticínios não previnem a osteoporose. Ora, o que sabemos é que o cálcio sim, é um dos mais importantes fatores de prevenção da osteoporose. É claro que vitamina D, alimentação saudável, atividade física, genética favorável e o hormônio feminino são todos protetores. Mas não temos dúvida quanto ao papel do cálcio, uma vez que temos matriz óssea mineralizada apenas com ele. Ou será que alguém pode produzir cálcio no corpo e prescindir da ingestão do mineral? Então, não fomos submetidos a uma lavagem cerebral para acreditar que laticínios fazem bem, nós estudamos e comprovamos isso.
É claro que há a alergia à proteína do leite e que ocorre ao nascimento, mas ela geralmente desaparece com a idade. È claro que há a intolerância à lactose e ela aumenta com a idade. Mas não estamos falando sobre isso, nem sobre esses pacientes. Estamos falando de pessoas normais e que podem se beneficiar muito da ingestão do leite e derivados. Não temos nada contra as dietas vegetarianas estritas, temos muitos pacientes vegetarianos e veganos que não consomem leite e os respeitamos quando eles alegam questões ecológicas, religiosas, pessoais ou de intolerância. Entretanto, precisamos rever todos os nossos conhecimentos para aceitar a hipótese de que leite faz mal para a maioria das pessoas, pois isso não procede, ou que somos os únicos animais que ingerem leite na vida adulta, pois isso é uma absoluta falta de argumentos. 
Por Citen

 autoras

Dra. Ellen Simone Paiva -

Endocrinologista e nutróloga, diretora do Citen (Centro Integrado de Terapia Nutricional). Mestre na área de Nutrição e Diabetes pela USP e especialista em Transtornos Alimentares pela Unifesp. Colunista dos sites Minha Vida, Guia do Bebê e do Blog de Especialistas da Dican.

Dra. Amanda Epifânio Pereira -

Nutricionista, especialista em Nutrição de Doenças Crônicas pelo Hospital Israelita Albert Eistein e em Transtornos Alimentares pela Unifesp.

Nenhum comentário: