Muito se prometeu no final dos anos 1990, mas o
desafio de como cultivar órgãos humanos inteiros foi difícil de
concretizar
por The Observer
—
SXC
Por Simon Roach
É 1998 e a ciência dá grandes passos. O primeiro mamífero
clonado, a ovelha Dolly, acaba de ter seu primeiro filhote; a primeira
cirurgia de coração assistida por robô foi realizada; Furbys chegou às
prateleiras. Em um comunicado ousado, o engenheiro biomédico professor
Michael Sefton declarou que dentro de dez anos os cientistas teriam
cultivado um coração inteiro, adequado para transplante. "Estamos
atirando firme", disse ele. "Nossa visão é de que seremos capazes de
retirar um coração danificado e substituí-lo tão facilmente quanto se
substituiria um carburador em um carro."
As células-tronco eram uma área de pesquisa pouco conhecida, mas que se acelerava. Eram células com um projeto em branco, com o potencial, dado o know-how, de se tornar qualquer outro tipo de célula do corpo. No ano anterior, 1997, havia sido aprovada a primeira terapia celular regenerativa, em que células-tronco foram usadas para reconstituir cartilagens do joelho. Mais tarde, em 1998, as primeiras células-tronco embrionárias humanas foram isoladas. A previsão de Sefton parecia se cumprir.
Quinze anos depois, porém, tivemos algumas células de fígado, do olho, até um hambúrguer cultivado em laboratório, mas não órgãos humanos inteiros. Assim, desculpem-nos por perguntar: onde está nosso coração? Parece estranho que um campo que provoca tanto entusiasmo possa estar tão fora do ponto. Falando na semana passada sobre a visão que ele e seus colegas esboçaram em 1998, Sefton disse que eles foram "terrivelmente ingênuos". Com o passar do tempo e a maior compreensão da complexidade biológica, a tarefa parecia cada vez maior. Mesmo hoje, uma cacofonia de manchetes depois, não estamos muito à frente.
Chris Mason é professor de medicina regenerativa no University College em Londres e acredita que concentrar-se na regeneração de órgãos é perda de tempo. "Esses órgãos são imensamente complexos", ele disse. "Eles têm nervos, vasos sanguíneos, no caso do fígado um sistema biliar -- são graus de complexidade enormes. Essas coisas levam muito tempo para crescer em humanos, quanto mais em laboratório, sem todas as pistas naturais que ocorrem no embrião em crescimento.
"A comunidade de pesquisa continua tentando produzir grandes avanços, mas se você fizer as contas tem de avançar em coisas que são realmente factíveis. Não adianta inventar uma terapia que seja inacessível."
O verdadeiro progresso, ele acredita, é visto através das portas abertas pela pesquisa de células-tronco. "As pessoas gostam das palavras 'célula-tronco', mas é um termo bastante sem sentido de muitas maneiras. Acho que o que estamos realmente vendo é uma tecnologia que usa células vivas como terapias", disse ele.
Estudos recentes mostraram como as células-tronco podem ser usadas para atenuar danos sofridos por pacientes de infarto. As células foram retiradas de outra parte do corpo, induzidas a um estado de células-tronco e então colocadas ao redor do músculo cardíaco danificado. Normalmente, o sistema imune reage ao infarto de modo tão agressivo que lesiona grande parte do próprio músculo, mas as células-tronco parecem abrandar essa reação.
É um papel que poderia ser explorado no tratamento de vítimas de derrame agudo e da doença de Crohn, em que o próprio sistema imune do corpo ataca seu tecido.
Outro estudo sugere que as células-tronco poderiam ser usadas para evitar a cegueira. Enquanto algumas terapias baseadas em células ainda estão no período de testes clínicos, outras já foram usadas para tratar mais de um milhão de pacientes. Por que esperar por um fracasso total do coração e substituí-lo por um inteiro, produzido por bioengenharia, quando se podem usar células-tronco para impedir a falha, em primeiro lugar?
Enquanto isso, continua a busca pela regeneração de órgãos inteiros. No mês passado, cientistas japoneses usaram células-tronco para cultivar células de fígado funcionais e as transplantaram com sucesso em ratos. "Foi animador", disse Mason. "Mas passarão dez ou 15 anos antes que se veja isso como algo que as pessoas podem ir para o hospital e fazer um procedimento de rotina. Há muito trabalho duro a fazer para levar essa ciência a algo que seja realmente eficaz para os pacientes e acessível para o Sistema Nacional de Saúde."
Existe uma tensão na pesquisa médica entre a glória da grande descoberta e o compromisso assíduo com a aplicação real. "Esperamos que o âmbito e as possibilidades desse projeto atraiam a imaginação do público", concluiu Sefton em 1998. Sim, mas talvez a imaginação do público não seja sempre o que a ciência deva almejar.
As células-tronco eram uma área de pesquisa pouco conhecida, mas que se acelerava. Eram células com um projeto em branco, com o potencial, dado o know-how, de se tornar qualquer outro tipo de célula do corpo. No ano anterior, 1997, havia sido aprovada a primeira terapia celular regenerativa, em que células-tronco foram usadas para reconstituir cartilagens do joelho. Mais tarde, em 1998, as primeiras células-tronco embrionárias humanas foram isoladas. A previsão de Sefton parecia se cumprir.
Quinze anos depois, porém, tivemos algumas células de fígado, do olho, até um hambúrguer cultivado em laboratório, mas não órgãos humanos inteiros. Assim, desculpem-nos por perguntar: onde está nosso coração? Parece estranho que um campo que provoca tanto entusiasmo possa estar tão fora do ponto. Falando na semana passada sobre a visão que ele e seus colegas esboçaram em 1998, Sefton disse que eles foram "terrivelmente ingênuos". Com o passar do tempo e a maior compreensão da complexidade biológica, a tarefa parecia cada vez maior. Mesmo hoje, uma cacofonia de manchetes depois, não estamos muito à frente.
Chris Mason é professor de medicina regenerativa no University College em Londres e acredita que concentrar-se na regeneração de órgãos é perda de tempo. "Esses órgãos são imensamente complexos", ele disse. "Eles têm nervos, vasos sanguíneos, no caso do fígado um sistema biliar -- são graus de complexidade enormes. Essas coisas levam muito tempo para crescer em humanos, quanto mais em laboratório, sem todas as pistas naturais que ocorrem no embrião em crescimento.
"A comunidade de pesquisa continua tentando produzir grandes avanços, mas se você fizer as contas tem de avançar em coisas que são realmente factíveis. Não adianta inventar uma terapia que seja inacessível."
O verdadeiro progresso, ele acredita, é visto através das portas abertas pela pesquisa de células-tronco. "As pessoas gostam das palavras 'célula-tronco', mas é um termo bastante sem sentido de muitas maneiras. Acho que o que estamos realmente vendo é uma tecnologia que usa células vivas como terapias", disse ele.
Estudos recentes mostraram como as células-tronco podem ser usadas para atenuar danos sofridos por pacientes de infarto. As células foram retiradas de outra parte do corpo, induzidas a um estado de células-tronco e então colocadas ao redor do músculo cardíaco danificado. Normalmente, o sistema imune reage ao infarto de modo tão agressivo que lesiona grande parte do próprio músculo, mas as células-tronco parecem abrandar essa reação.
É um papel que poderia ser explorado no tratamento de vítimas de derrame agudo e da doença de Crohn, em que o próprio sistema imune do corpo ataca seu tecido.
Outro estudo sugere que as células-tronco poderiam ser usadas para evitar a cegueira. Enquanto algumas terapias baseadas em células ainda estão no período de testes clínicos, outras já foram usadas para tratar mais de um milhão de pacientes. Por que esperar por um fracasso total do coração e substituí-lo por um inteiro, produzido por bioengenharia, quando se podem usar células-tronco para impedir a falha, em primeiro lugar?
Enquanto isso, continua a busca pela regeneração de órgãos inteiros. No mês passado, cientistas japoneses usaram células-tronco para cultivar células de fígado funcionais e as transplantaram com sucesso em ratos. "Foi animador", disse Mason. "Mas passarão dez ou 15 anos antes que se veja isso como algo que as pessoas podem ir para o hospital e fazer um procedimento de rotina. Há muito trabalho duro a fazer para levar essa ciência a algo que seja realmente eficaz para os pacientes e acessível para o Sistema Nacional de Saúde."
Existe uma tensão na pesquisa médica entre a glória da grande descoberta e o compromisso assíduo com a aplicação real. "Esperamos que o âmbito e as possibilidades desse projeto atraiam a imaginação do público", concluiu Sefton em 1998. Sim, mas talvez a imaginação do público não seja sempre o que a ciência deva almejar.
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