9.09.2013

Petrobras foi alvo de espionagem de agência dos EUA, aponta documento

Dados estão em registros obtidos com exclusividade pelo Fantástico.
No entanto, não foi possível saber o que a NSA buscava sobre a empresa.

Do G1, com informações do Fantástico
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Novos documentos classificados como secretos e que vazaram da Agência de Segurança Nacional (NSA, na sigla em inglês) dos Estados Unidos, obtidos com exclusividade pelo Fantástico, mostram que a Petrobras, quarta maior petroleira do mundo, também foi espionada.
(veja o vídeo ao lado)
A reportagem exibida neste domingo (8), aponta que a rede privada de computadores da estatal brasileira foi invadida pela NSA, informação que contradiz a posição oficial da agência, dada ao jornal "The Washington Post", onde afirmou não fazer espionagem econômica de nenhum tipo, incluindo o cibernético.
Os dados sobre a empresa estão em documentos vazados por Edward Snowden, analista de inteligência contratado pela NSA, que divulgou esses e outros milhares de registros em junho passado. O jornalista Glenn Greenwald foi quem recebeu os papéis das mãos de Snowden. A Petrobras não quis comentar o caso. A NSA nega espionagem para roubar segredos de empresas estrangeiras.
Na última semana, o Fantástico já havia divulgado que a presidente Dilma Rousseff e o que seriam seus principais assessores foram alvos diretos de espionagem da NSA.
O novo documento é uma apresentação que recebeu a classificação "ultrassecreta" e que foi elaborada em maio de 2012, para ensinar novos agentes a espionar redes privadas de computador – redes internas de empresas, governos e instituições financeiras e que existem, justamente, para proteger informações.
O nome da Petrobras, a maior empresa do Brasil, aparece logo no início do documento mostrado pelo Fantástico, com o título “Muitos alvos usam redes privadas”.

Não há informações sobre a extensão da espionagem, nem se a agência americana conseguiu acessar o conteúdo guardado nos computadores da empresa. O que se sabe, segundo a reportagem, é que a Petrobras foi alvo de espionagem, mas não há informações a respeito dos documentos que a NSA buscava.

Este tipo de informação é liberada apenas para quem os americanos chamam de “Five eyes” (cinco olhos, na tradução literal), termo utilizado para se referir aos cinco países aliados na espionagem: EUA, Inglaterra, Austrália, Canadá e Nova Zelândia.

Google e governo da França também foram vítimas
O nome da Petrobras aparece em vários slides. Além da estatal, estão listados também como alvos da NSA a infraestrutura do Google, o provedor de e-mails e serviços de internet da companhia. A empresa, que já foi apontada como colaboradora da agência norte-americana, desta vez aparece como vítima.

As redes privadas do Ministério das Relações Exteriores da França e da Swift (Sociedade para Telecomunicações Financeiras Interbancárias Globais, na tradução do inglês), cooperativa que reúne mais de 10 mil bancos de 220 países, também foram analisadas. Qualquer remessa de recursos que ultrapassa fronteiras nacionais necessita ser analisada pela Swift.
Nomes de outras empresas e instituições que também passaram por espionagem foram apagados para não comprometer operações que, segundo a reportagem, envolvam alvos ligados ao terrorismo.

Para cada alvo há uma pasta que reúne todas as comunicações interceptadas e os endereços de IP – a identificação de computadores ligados à rede privada – que deveriam estar imunes a esses ataques.

De acordo com Greenwald, esses documentos trazem informações de segurança nacional que não devem ser publicadas, por isso os vetos aos nomes. “Ninguém tem dúvida que os Estados Unidos, assim como todos os outros países, têm direito de fazer espionagem para garantir a segurança nacional. Mas tem muito mais informações (...) sobre espionagem contra inocentes ou contra pessoas que não têm nada a ver com terrorismo ou questões industriais”, explica.
Snowden Cronologia (6/9) (Foto: Editoria de Arte / G1)
Espionagem pode ter durado muito tempo
De acordo com Paulo Pagliusi, doutor em segurança da informação e autor de um livro sobre o tema, todas as redes privadas apresentadas nos documentos da NSA exibidos pelo Fantástico são de empresas reais, não são casos fictícios.

“Tanto é que tem algumas coisas que chamam a atenção. Por exemplo, havia alguns números que estavam tapados. Por que eles estariam tapados se não fosse um caso real e não queriam que os alunos tivessem conhecimento”, questiona o especialista. Ainda segundo Pagliusi, tais informações podem ter sido obtidas no decorrer de um longo período, com a ajuda de um sistema de espionagem “muito eficaz”, que gera um resultado “muito poderoso”.

Segundo a reportagem do Fantástico, o faturamento anual da Petrobras é de mais de R$ 280 bilhões, maior do que a arrecadação de muitos países. A estatal brasileira tem ainda dois supercomputadores utilizados para as chamadas pesquisas sísmicas, que avaliam as reservas de petróleo a partir de testes feitos em alto mar. Com esta tecnologia a empresa conseguiu mapear o pré-sal, a maior descoberta recente de novas reservas de petróleo no mundo.
A rede privada de computadores da empresa também guarda informações estratégicas associadas a negócios que envolvem bilhões de reais. Por exemplo, detalhes de cada lote de leilão marcado para outubro, que é a exploração do Campo de Libra, na Bacia de Santos, parte do pré-sal.
Segundo Roberto Villa, ex-diretor da Petrobras, o leilão de Libra é o maior da história do petróleo. “É um leilão de uma área que já se sabe que tem petróleo, não tem risco. [Se essa informação vazou], alguém vai ter vantagem. Eventualmente, se essa informação vazou e alguém dispõe dela, ele vai numa posição muito melhor no leilão. Ele sabe onde carregar mais e onde nem carregar. É um segredinho bom”, explica Villa.
Para Antônio Menezes, também ex-diretor da estatal brasileira, o possível vazamento de informações sobre o campo do pré-sal é muito grave e impactaria o mercado internacional. “Comercialmente, o efeito internacional disso aí é de uma concorrência com carta marcada pra alguns lugares, alguns países, para alguns amigos”, disse.
Questionado pela reportagem sobre quais informações sigilosas da Petrobras poderiam ter sido procuradas, Adriano Pires, especialista em infraestrutura, disse que, se fosse espião, buscaria principalmente aquelas ligadas à tecnologia de exploração de petróleo no mar.

“A Petrobras é a [empresa] número um no mundo em explorar petróleo no mar. E o pré-sal existe em qualquer lugar do mundo: na África, no Golfo americano, no Mar do Norte. Então, se eu detenho essa tecnologia, posso tirar [petróleo do] do pré-sal onde eu quiser”, afirma o especialista.

Como funciona
Na apresentação da Agência de Segurança Nacional dos EUA, aparecem documentos preparados pela Agência de Espionagem da Inglaterra, aliada dos americanos em questões de espionagem.

Os registros feitos pelos ingleses mostram como funcionam dois programas: “Flying Pig” e “Hush Puppy”, que monitoram as redes privadas por onde trafegam as informações que deveriam ser seguras. Essas redes são conhecidas pela sigla TLS/SSL.

As redes TLS/SSL são também o sistema de segurança usado em transações financeiras, como, por exemplo, quando alguém acessa seu banco por um caixa eletrônico. A conexão entre o ponto remoto e a central do banco trafega por uma espécie de túnel protegido na internet: o que passa por ele ninguém poderia ver.
A apresentação da NSA explica ainda como a interceptação das informações é realizada. De acordo com o documento, a espionagem é feita por meio de um ataque à rede de computadores conhecido como “man in the middle” (ou homem no meio, na tradução do inglês). Nesse caso, os dados são desviados para a central da NSA e, depois, chegam ao destinatário, sem que ninguém fique sabendo.
Os documentos divulgados por Snowden também listam os resultados obtidos na espionagem. Segundo a reportagem, com o sistema de espionagem, a NSA encontrou dados de redes de governos estrangeiros, companhias aéreas, companhias de energia, como a Petrobras, e organizações financeiras.

A apresentação da NSA mostra ainda, com detalhes, como os dados de um "alvo" escolhido por eles vão sendo desviados, passando por filtros de espionagem desde a origem, até chegar aos supercomputadores da agência norte-americana.

Em um dos registros divulgados por Snowden e obtido pelo Fantástico, a NSA diz que a América Latina é alvo chave do programa “Silverzephyr”. O programa registra metadados, o total de informações que trafega na rede, e o conteúdo de gravações de voz e fax.
Dilma cobrou explicações de Obama
No último domingo (1º), o Fantástico mostrou como a presidente do Brasil foi alvo direto de espionagem (veja vídeo ao lado). Na última quinta-feira (5), Dilma se reuniu com o líder político norte-americano, Barack Obama, durante o encontro dos 20 países mais desenvolvidos do mundo (o G-20), na Rússia, e cobrou explicações.

“O que eu pedi é o seguinte: eu acho muito complicado ficar sabendo dessas coisas pelo jornal. Eu quero saber o que há. Se tem ou não tem, eu quero saber. Tem ou não tem? Além do que foi publicado pela imprensa, eu quero saber tudo que há em relação ao Brasil. Tudo. Tudinho. Em inglês, everything", disse Dilma a jornalistas.

Na última sexta-feira (6), Dilma afirmou que Obama se comprometeu a dar explicações sobre as denúncias de espionagem dos EUA até a próxima quarta-feira (11).

"O presidente Obama declarou para mim que assumia a responsabilidade direta e pessoal pelo integral esclarecimento dos fatos e que proporia para exame do Brasil medidas para sanar o problema. Diante do meu ceticismo devido à falta de resultados do encontro entre o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, e o vice-presidente [Joe] Biden, ocorrido semana passada, o presidente Obama me reiterou que ele assumia a responsabilidade direta e pessoal tanto para a apuração das denúncias como para oferecer as medidas que o governo brasileiro considerasse adequadas", declarou a presidente na Rússia.

Dilma afirmou ter dito a Obama que a questão não era de "desculpas", mas de uma solução rápida. Segundo ela, estabeleceu-se a próxima quarta-feira como prazo para uma resposta. "Como eu disse que esse processo era um processo lento, que não queria esclarecimentos técnicos, nao era só uma questão de desculpas,era uma questão de não admissão desse nível de intrusão, e que era importante que fosse solucionado com rapidez, chegou-se a uma data, quarta-feira", afirmou Dilma.

Quebra de criptografia
A reportagem do Fantástico mostra ainda que no dia em que a presidente e Obama se encontraram, reportagem publicada simultaneamente por dois grandes jornais – o inglês “The Guardian” e o americano “The New York Times” -- , revelou que a NSA e a GCHQ inglesa quebram os códigos de comunicações protegidas de diversos provedores de internet, podendo assim espionar as comunicações e transações bancárias de milhões de pessoas.

O texto mostrou que a criptografia, o sistema de códigos que é fornecido por algumas operadoras de internet, já vem com uma vulnerabilidade, inserida propositalmente pela NSA, e que permite que os espiões entrem no sistema e até façam alterações, sem deixar rastros.
Há também sinais de que alguns equipamentos de computação montados nos EUA já saem de fábrica com dispositivos de espionagem instalados. O “New York Times” diz que isso foi feito com pelo menos um governo estrangeiro que comprou computadores norte-americanos. Mas não revela qual governo pagou por equipamentos para ser espionado.

Outro lado
A NSA enviou nota afirmando que não usa sua capacidade de espionagem para roubar segredos de empresas estrangeiras. Questionada pelo Fantástico sobre o motivo de ter espionado a Petrobras, a agência norte-americana informou que isso é tudo o que tem a dizer no momento.

Após a exibição da reportagem no Fantástico, uma segunda nota de imprensa, desta vez assinada pelo diretor nacional de inteligência dos Estados Unidos, James Clapper, foi enviada pela Agência de Segurança Nacional.

O órgão do governo americano alega coletar informações econômicas e financeiras para prevenir crises que possam afetar os mercados internacionais.

No entanto, reafirmou que não rouba segredos de empresas de fora dos EUA que possam beneficiar companhias americanas. A Embaixada Britânica em Brasília e o Ministério das Relações Exteriores do Reino Unido informaram que não comentam assuntos de inteligência.

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