As dificuldades não podem ser pretexto para a demolição dos legítimos interesses brasileiros.
Agência Petrobras
A "Campanha do Petróleo" foi a maior mobilização popular e social da história do Brasil
Independentemente
da polêmica em torno da atuação da presidenta da República no Conselho
de Administração da Petrobras, não podemos correr o risco de
deslegitimar a mais importante empresa brasileira. O contexto histórico
da luta do Brasil por sua emancipação econômica tornou a Petrobras a
personificação do controle soberano sobre os nossos recursos naturais. A
“Campanha do Petróleo” foi a maior mobilização popular e social da
história do Brasil em defesa de um projeto de desenvolvimento. Não
haveria nada similar antes nem depois. A Petrobras é uma conquista do
povo brasileiro. A causa do petróleo foi identificada à afirmação da
soberania nacional. Não por acaso, afirmou o general Horta Barbosa,
durante a Campanha do Petróleo, em 1947: “O petróleo pertence à Nação,
que há de dividi-lo, igualmente, por todos os seus filhos”.
A Petrobras, como qualquer empresa
estatal, é um instrumento da política econômica nacional do Estado,
atuando de acordo com seus objetivos estratégicos e de bem-estar social,
indo muito além da mera busca de rentabilidade. No regime democrático
de 1988, a Petrobras e as demais empresas estatais estão subordinadas às
finalidades do Estado, como o desenvolvimento. O interesse público é o
fundamento, o limite e o critério da iniciativa econômica pública. Os
objetivos das empresas estatais estão fixados por lei, não podendo
furtar-se a eles. Devem cumpri-los, sob pena de desvio de finalidade.
Para isso foram criadas e são mantidas pelo Poder Público e com recursos
públicos.
Como sociedade de economia mista, a
Petrobras é um instrumento de atuação do Estado, devendo estar acima,
portanto, dos interesses privados. A sociedade de economia mista está
vinculada aos fins da lei que autoriza sua instituição, que determina o
seu objeto social e destina uma parcela do patrimônio público para
aquele fim. Não pode, portanto, a sociedade de economia mista, por sua
própria vontade, utilizar o patrimônio público para atender a finalidade
diversa da prevista em lei. O objetivo essencial das sociedades de
economia mista não é a obtenção de lucro ou a distribuição de dividendos
entre seus acionistas, mas a implementação de políticas públicas. A
esfera de atuação das sociedades de economia mista, como a Petrobras, é a
dos objetivos da política econômica, de estruturação de finalidades
maiores, cuja instituição e funcionamento ultrapassam a racionalidade de
um único ator individual (como a própria empresa ou seus acionistas).
Não se ignora, contudo, que
as sociedades de economia mista produzam uma tensão entre interesses
públicos e privados, que decorre da associação de recursos e de uma
lógica de Estado à poupança privada dos acionistas, que investiram em
companhias como a Petrobras, na esperança de engordar seus ganhos. A
necessária prevalência do interesse público sobre o privado não dispensa
o legislador de esforços para mitigar os conflitos.
O direito tem prestado algumas
contribuições para abrandar essa tensão. A constituição e o
funcionamento obrigatórios de um conselho de administração, impostos
pela norma do art. 240 da Lei das Sociedades Anônimas, não bastam,
contudo, sem que a lei expresse a sua competência e os procedimentos que
deve observar no tratamento de uma perene crise de interesses, que se
pode agudizar, por exemplo, todas as vezes que uma decisão fundamentada
no interesse público inviabiliza a lucratividade da companhia.
Nesse contexto, o conselho de
administração deve agregar os principais grupos de pressão, ao que
contribuiu a Lei nº 12.353/10 (que dispõe sobre a participação de
empregados nos conselhos de administração das empresas públicas e
sociedades de economia mista), mas também sujeitá-los a regras claras de
representação e de deliberação, sob o amparo de um comitê de
assessoramento capaz de prover soluções para impasses, bem como de
instruir e de fundamentar as decisões que determinem uma prevalência do
interesse público sobre o privado. Esse esforço de entendimento vai
produzir uma cultura de relações público-privadas, sob um histórico de
conflitos e de soluções recorrentes.
As dificuldades, inerentes à interação
dos mais diversos atores em quaisquer sistemas sociais, não podem servir
de pretexto à demolição maliciosa dos legítimos interesses brasileiros,
com o que prevalecerá, no desmonte dos nossos sonhos de soberania, de
liberdade e de justiça social, apenas um desenvolvimento dependente e
controlado, como planejaram para nós as potências hegemônicas que
gravitam no entorno de nossas riquezas. A resistência é sempre difícil,
mas para animá-la vale a lembrança de que o petróleo ainda é nosso!
Gilberto Bercovici e
Walfrido Jorge Warde Júnior
Walfrido Jorge Warde Júnior
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