São Paulo -  Todos os dias, quatro pessoas recorrem ao “coquetel do dia seguinte da aids” na tentativa de bloquear a infecção pelo vírus HIV após o sexo desprotegido. O levantamento, inédito, foi feito pelo Ministério da Saúde.
O coquetel consiste em misturar três medicamentos antirretrovirais, usados no tratamento de soropositivos já com o diagnóstico da doença, para pacientes ainda não infectados. Eles são oferecidos, de graça para homens e mulheres, em até 72 horas após a relação sexual sem camisinha.
Dados mostram que o uso deste arsenal terapêutico para conter a contaminação pelo HIV está em ascensão no país | Foto: Reprodução Internet
Dados mostram que o uso deste arsenal terapêutico para conter a contaminação pelo HIV está em ascensão no país | Foto: Reprodução Internet
A medicação deve ser tomada por 28 dias consecutivos, pode trazer efeitos colaterais graves, perder a eficácia se ingerida repetidas vezes e só deve servir de alternativa em situações de extrema urgência (mecanismo de ação semelhante ao da pílula de emergência para impedir a gravidez indesejada, daí a referência no nome).
Os dados mostram que o uso deste arsenal terapêutico para conter a contaminação pelo HIV está em ascensão no País. Entre janeiro e junho deste ano, os centros de referência em aids distribuíram 789 tratamentos do tipo. A média mensal de entrega de 131 coquetéis do dia seguinte (4,3 por dia) representa aumento de 43,9% em comparação ao ano passado (91 por mês), quando o tratamento foi padronizado pelo governo federal como parte da estratégia oficial para fechar o cerco a aids em território nacional.
Apesar da ampliação da oferta, os especialistas afirmam que o coquetel do dia seguinte ainda é desconhecido por grande parte da população. Uma das dificuldades, afirmam os médicos, é disseminar esta técnica de bloqueio, sem banalizar o uso. A cautela é porque tal recurso, devido o risco de efeitos colaterais, não pode provocar o que chamam de aposentadoria precoce da camisinha.
“O preservativo permanece como principal estratégia de prevenção da aids e não pode ser substituído”, diz - de forma categórica - Ronaldo Hallal, coordenador da área de Cuidado e Qualidade de Vida do Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais do Ministério da Saúde. “Mas é fato também que as pessoas precisam ter acesso às estratégias mais recentes no cenário de proteção às contaminações. É este equilíbrio que precisamos encontrar.”
Fique sabendo
O Centro de Referência de Treinamento em Aids e DST de São Paulo (CRT/Aids) é um dos pólos brasileiros (são 789 no total) com o maior número de distribuição do coquetel do dia seguinte da aids (uma média de um por dia).
A coordenadora do CRT/SP, Maria Clara Gianna, ressalta que todas as pessoas que procuram esta estratégia de prevenção são orientadas por profissionais de saúde e também examinadas, para a definição de quais antirretrovirais serão ministrados em cada caso.
“É a oportunidade também de fazermos o teste de aids nesta população que procura os serviços. Ainda é grande o número de pessoas que não sabem ser portadora do vírus HIV e nunca nem sequer avaliaram isso”, afirma Maria Clara.
“Conhecer a própria sorologia é super importante para conter os avanços da aids. Além de aumentar a sobrevivência do próprio paciente, já temos dados contundentes que mostram que, ao ser tratado, o risco desta pessoa de contaminar outro também diminui”, completa a coordenadora ao também reforçar que a camisinha permanece como estratégia mais efetiva de prevenção.
O último relatório, publicado há 15 dias pela ONU, mostrou que, só no Brasil, 250 mil pessoas convivem com o vírus HIV sem saber. No mundo todo, 34,5 milhões têm o vírus da aids e que fazem o tratamento.
Casais X relações esporádicas
O nome oficial do coquetel do dia seguinte da aids é PEP (sigla para profilaxia pós exposição). Esta combinação de medicamentos, há muito tempo, já é utilizada para tentar proteger profissionais de saúde que sofrem algum acidente de trabalho com risco de contaminação pelo HIV, como luva cirúrgica rasgada durante o manuseio do paciente. Também é oferecida, há ao menos 15 anos, para vítimas de violência sexual.
Mais recentemente, o coquetel do dia seguinte passou a fazer parte do leque de opções após falhas na proteção sexual dos chamados casais sorodiscordantes (quando apenas um dos companheiros tem o vírus HIV) Em outubro de 2010, após uma comissão de especialistas ser convocada e avaliar a proposta, o Departamento Nacional de DST e Aids padronizou a indicação da PEP para toda a população.
A utilização começa agora a ganhar fôlego e o levantamento mostra que os usuários, em maioria, negligenciaram o preservativo com parceiros esporádicos e não fixos. Neste ano, por exemplo, foram 284 pessoas envolvidas em relações sorodiscordantes que tomaram o coquetel do dia seguinte frente as 789 em relações ocasionais (quase três vezes mais).

As informações são de Fernanda Aranda do iG