De minha parte, como bom judeu ateu, poupei meus filhos desse cruento ritual primitivo, mas, diferentemente de certos grupos religiosos, não pretendo que minhas escolhas pessoais sejam universalizáveis.
Os militantes anticircuncisão mais aguerridos a equiparam à excisão do clitóris, mas a comparação é enganosa. A clitorectomia tem o objetivo de fazer com que a mulher não sinta prazer no ato sexual. As repercussões da circuncisão masculina são bem menos dramáticas. Assemelham-se mais a marcas de outros ritos iniciáticos como tatuagens e escarificação. Há até trabalhos sugestivos de que ela traz benefícios, como a redução do risco de câncer e DSTs.
Esses, entretanto, me parecem argumentos secundários. O que está realmente em jogo aqui é até que ponto pais podem tomar decisões em nome de seus filhos. E eu receio que, mesmo admitindo que por vezes os genitores não fazem as escolhas mais sábias, não temos outro caminho que não confiar a eles a tarefa de cuidar dos rebentos. Não dá para interferir a todo instante nessa relação com a mão pesada e impessoal do Estado.
É preferível reservar a intervenção, que pode ser legítima, para situações mais graves, nas quais a vida ou a saúde da criança estejam seriamente ameaçadas. Pais são, por razões evolutivas, os melhores guardiães para seus filhos. Ainda que pudéssemos redesenhar o mundo a partir do zero, dificilmente chegaríamos a solução melhor do que a encontrada pela natureza, que, após milhões de anos de tentativa e erro, logrou obter um equilíbrio sutil entre os interesses genéticos e individuais de cada parte.
Hélio Schwartsman
Nenhum comentário:
Postar um comentário