4.21.2013

Profissionais do sexo aprendem nova língua para recepcionar estrangeiros.

Prostitutas contam histórias de vida em aula de inglês para a Copa em BH

Além de inglês, professores também ensinam espanhol, francês e italiano.

Sara Antunes Do G1 MG
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Elmo Lincoln também dá aulas de inglês e reclama de ausências no curso. (Foto: Sara Antunes/G1)Professor Elmo Lincoln dá aula de inglês e reclama da ausência de algumas alunas (Foto: Sara Antunes/G1)
Laura Maria do Espírito Santo, de 54 anos, é prostituta em Belo Horizonte (MG) e uma das alunas do curso de inglês para profissionais do sexo, iniciado em 11 de março na capital, com objetivo de educar os profissionais do sexo para recepcionar os turistas estrangeiros na Copa das Confederações de 2013 e na Copa do Mundo de 2014.
Ela trabalha "há bastante tempo", como prefere dizer, e lembra com saudade de quando teve um cliente canadense, que mandava cartas e que por cinco anos visitou o Brasil para tentar convencê-la a deixar o país com ele. Ela ri ao falar dos presentes recebidos do amante e de como ele costumava falar em inglês e em francês ao seu ouvido; nada que pudesse entender à época. A relação durou certo tempo, mesmo com a dificuldade dos idiomas diferentes.
Laura do Espírito Santo é aluna do curso de inglês paras prostitutas e travestis. (Foto: Sara Antunes/ G1)Laura do Espírito Santo é aluna do curso de inglês
para prostitutas e travestis (Foto: Sara Antunes/ G1)
As prostitutas e travestis de Belo Horizonte também podem fazer gratuitamente aulas de espanhol, francês e italiano, ministradas por professores voluntários.
O G1 acompanhou uma aula de inglês da turma de Laura. Das 15 alunas inscritas, só sete compareceram. Muitas têm receio de ir ao curso, em um shopping popular da cidade, enquanto outras trabalham em horários diversificados, segundo explicou Cida Vieira, presidente da Associação das Prostitutas de Minas Gerais (Aprosmig) – da qual Laura é vice-presidente.
É o caso de Agatha (nome fictício), de 25 anos. A jovem frequenta as aulas desde o início, mas falta quando congestionamento não deixa que ela chegue a tempo. Nascida em Piracicaba (SP), a estudante tem na pronúncia sua principal dificuldade. Durante a aula, o professor Igor Fusch comentou sobre a insistência dela em colocar o dáblio "antes de tudo".
O método do professor é a repetição. Fusch, de 53 anos, morou por quase 20 anos na Austrália e retornou ao Brasil há quatro. "Agora que está no começo, eu quero enfatizar os greetings, que é o conhecer a pessoa", disse sobre um dos tópicos da aula. Para ele, um desafio é se acostumar ao modo norte-americano e inglês de iniciar uma conversa, pois tendem a manter certa formalidade.
A cada encontro, o professor ensina frases novas, e as estudantes devem repeti-las. Em seguida, elas devem direcionar a questão a Fusch, que responde para ensinar como se fala. Logo, elas também precisam responder às perguntas. Os erros resultam em inúmeras risadas. Muitas meninas são do interior e tem no sotaque uma grande dificuldade.
Igor Fusch morou por quase 20 anos na Austrália. (Foto: Sara Antunes/ G1)Igor Fusch morou por quase 20 anos na Austrália e
hoje dá aulas na capital (Foto: Sara Antunes/ G1)
Quero aprender para mim, não para os clientes"
Agatha (nome fictício), de 25 anos
Outro problema é que muitas alunas não têm escolaridade completa. Por isso, algumas lições precisam ser repetidas, respeitando o tempo de aprendizado de cada uma das mulheres. "Sempre faltam umas duas ou três. Então, quando elas vêm eu repito, aí as outras guardam", disse o professor.
Elmo Lincoln, professor de inglês há cinco anos, tem um método diferente de ensino. Ele prepara lições para entregar aos alunos e explica como usar os verbos e formar frases no idioma. Lincoln também se queixa da ausência de alguns alunos. Na aula desta terça-feira (16), apenas três participaram.
Mas se comparecem às aulas, a vontade de aprender impressiona. Para as prostitutas, as short answers (respostas curtas, em português) ensinadas por Fusch não são suficientes. Quando o professor questiona se as mães delas vivem em Belo Horizonte, o 'Yes, she does' e 'No, she doesn’t ' é pouco. As alunas que perderam as mães, por exemplo, querem saber como se fala ‘céu’ em inglês ou como mencionar São Pedro no idioma. Outras começam a falar da cidade de origem das famílias.
Uma simples pergunta pode desencadear a revelação de histórias pessoais, como quantos filhos elas têm, as músicas e comidas favoritas, e a hora na qual costumam acordar. O professor ressalta que as profissionais do sexo precisam aprender detalhes relacionados ao trabalho para entreter os clientes e prevenir qualquer mal-estar. Outro conhecimento importante é quanto aos preços dos programas.
Agatha espera ganhar mais com a chegada dos estrangeiros. Ela afirma amar os cursos de inglês e espanhol. Mas nega aprender os idiomas apenas para agradar os frequentadores da Rua Guaicurus – ponto onde está a maioria dos hotéis nos quais os serviços ocorrem – e sim para ter mais conhecimento. "Quero aprender para mim, não para os clientes", afirmou.
Para a profissional do sexo, a intenção é aprender várias expressões para que a conversa possa fluir melhor. Ela e outras prostitutas contam que os clientes são curiosos e exigem atenção. "Eles perguntam tanta coisa", contou Agatha.
Extrovertida, Laura do Espírito Santo conta que tem uma filha que estuda em Portugal; está fazendo doutorado. Perguntada se foi difícil se tornar uma prostituta, ela não hesita: "No princípio, eu me senti constrangida. Mas depois que solta a franga, é difícil pegar [a franga]", disse aos risos. Sobre a rotina de programas, repetida há anos, diz que o importante é não ter o nome sujo, não abusar do álcool e não usar drogas. Para ela, o que faz é um trabalho como qualquer outro. "Eu entro no hotel de cabeça erguida e saio de cabeça de erguida", disse.
Ainda há vagas
De acordo com a Associação das Prostitutas de Minas Gerais (Aprosmig), 800 garotas e garotos de programa trabalham no Centro de Belo Horizonte, principalmente em hotéis da Rua Guaicurus.
O projeto é apoiado pelo dono de um shopping popular na reguião, que empresta as salas. A ideia do curso surgiu para elevar a autoestima das garotas de programas e melhorar o contato delas com os estrangeiros.
Após uma entrevista em que dirigentes comentaram sobre o projeto, apareceram muitos professores voluntários. Atualmente, são 12, segundo a associação. As alunas não pagam nada.
De acordo com Cida, presidente da Aspromig, ainda há vagas e os interessados podem entrar em contato com a associação pelo telefone (31) 3201-1799.

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