
Falta de remédios contra Aids causa protestos
Pelo menos quatro medicamentos têm problema de abastecimento.
Dois deles são usados por 172 mil pessoas.
A falta de pelo menos quatro medicamentos do coquetel contra a Aids, inclusive de droga utilizada por crianças, leva hoje movimentos sociais que defendem portadores do HIV a realizar manifestações em diferentes Estados.
Além do abacavir e da lamivudina, cujo desabastecimento foi informado recentemente, estão em falta, segundo o Ministério da Saúde, a nevirapina e a associação entre lamivudina e zidovudina (AZT). Organizações não-governamentais (ONGs) que defendem os pacientes apontam ainda desabastecimento do efavirenz, o que o ministério diz desconhecer.
O programa nacional de combate à Aids é considerado um dos melhores do mundo por organismos internacionais.
Segundo o Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais do ministério, problemas na assinatura de contratos com laboratórios públicos dos Estados explicam o desabastecimento da lamivudina e da zidovudina, usados por 172 mil pessoas.
No caso da nevirapina e do abacavir, utilizados por 4,1 mil, entre elas 400 crianças, o nó foi em um contrato internacional em que o governo adquire as drogas de um laboratório indiano por meio do Unicef, órgão das Nações Unidas para a infância, diz o ministério.
"É o desmanche de um programa considerado referência. E o presidente Lula ainda quer fazer acordos de cooperação para a produção de drogas com outros países. A falta de remédios pode aumentar a resistência ao HIV", disse William Amaral, secretário do fórum de ONGs no Rio de Janeiro.
No Estado, a lamivudina distribuída para pessoas com hepatite foi remanejada para quem vive com o HIV. "Pela quarta ou quinta vez na década, somos obrigados a sair às ruas para exigir sobriedade das gestões federal e estaduais", disse Luiz Alberto Volpe, que vive com o HIV e preside a ONG Hipupiara.
Defesa
"Houve um atraso no fechamento dos contratos entre o ministério e as primeiras parcelas, que chegariam entre fevereiro e março, só estão chegando agora", disse Rogério Scapini, responsável pela logística de medicamentos e insumos do departamento, sobre o caso da lamivudina e associações.
Com a falta, as entregas passaram a ser fracionadas, sobrecarregando a logística dos programas estaduais. "Houve um mix de problemas, tanto de um como de outro", disse o técnico, quando questionado se os problemas eram do ministério ou dos laboratórios.
A situação deve ser normalizada nos próximos dias. A associação dos laboratórios não comentou. O "mix de problemas", afirmou Scapini, também explica os atrasos de nevirapina e abacavir, "parte do Ministério da Saúde, parte do Unicef, da Anvisa e do produtor". A situação deve ser normalizada em meados de maio.
Em resposta, o Unicef destacou que os problemas foram do laboratório e decorrentes do fechamento do espaço aéreo europeu. Já o gerente-geral do laboratório indiano, Balaji Subramaniam, disse que o atraso é da alçada do governo e do Unicef.
Saiba Mais
Malabarismo na distribuição de anti-retrovirais
Farmacêuticos se esforçam para assegurar anti-retrovirais para todos os portadores do HIV
O desabastecimento dos anti-retrovirais zidovudina, indinavir, atazanavir, tenofovir e da combinação zidovudina + lamivudina (Biovir), ocorrido no início deste ano, gerou uma crise na saúde. Diversos serviços de Aids do Brasil tiveram problemas para atender a demanda dos pacientes. Em Sapopemba, região leste de São Paulo, o SAEBetinho, responsável pela assistência de mais de 800 portadores de HIV/Aids, interrompeu o tratamento de 30 soropositivos devido à falta do atazanavir.
Muitas versões para o fato foram apresentadas pelo Ministério da Saúde. Desde a carência de matéria-prima para a fabricação de remédios até a falta de dinheiro para a compra dos medicamentos
protegidos por patentes.
De acordo com os farmacêuticos responsáveis pelo controle logístico dos antiretrovirais de São Paulo e Rio de Janeiro, que nos últimos meses tiveram que fracionar os medicamentos para conseguir atender seus pacientes, o quadro agora é melhor do que no começo do ano. Mas ainda é cedo para afirmar que tudo está 100% resolvido.
Combinação zidovudina + lamivudina ainda é problema
Segundo Élcio Gagizi, coordenador do núcleo de controle logístico de medicamentos do Programa Municipal DST/Aids de São Paulo, os estoques estão sendo normalizados. "A situação dos anti-retrovirais na cidade não está ruim, mas também não posso afirmar que esteja regularizada", comenta Gagizi. "O problema é que o meu estoque de seguranç é suficiente para um mês e meio, no máximo". Por isso, o Programa continua orientando as unidades dispensadoras a
fracionar algumas drogas e desaconselhando o atazanavir 150 mg para novos tratamentos.
No Rio, onde o problema não foi tão grave quanto em São Paulo, o único antiretroviral em falta é a combinação zidovudina + lamivudina, que está sendo distribuída em comprimidos separados.
Este fato é preocupante, segundo Sérgio Aquino, responsável pela logística de medicamentos do Programa Municipal de DST/ Aids do Rio de Janeiro:
"Dessa forma, o paciente que tomava dois comprimidos por dia dessa medicação passa a ingerir 8. Quando somamos esses comprimidos com os outros remédios que o portador do HIV usa, pode-se chegar a
um esquema de mais de 20 pílulas por dia. Isso tem sérias conseqüências na adesão".
Sistema de informação eficaz pode ser a solução
Os dois responsáveis pela distribuição de anti-retrovirais acreditam que a solução do problema pode estar em um sistema de informação que funcione. O Sistema de Controle Logístico de Medicamentos "Siclom" foi criado com essa finalidade, mas ainda tem muitos problemas.
A atualização da demanda real de consumo dos anti-retrovirais pelas farmácias também é importante. "O Ministério da Saúde precisa saber a quantidade exata de medicamentos usados em cada unidade de saéde", assinala Aquino. O Rio de Janeiro já começou um trabalho de revisão de recadastramento.
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